Como o coronavírus vai afetar a segurança do seu carro daqui a 10 anos
Pandemia provoca rombo bilionário no caixa dos fabricantes, que terão de (ou pelo menos tentarão) segurar investimentos em novas tecnologias
Já é de conhecimento público que o novo coronavírus afetará vertiginosamente o andamento da economia mundial (o que não significa que devemos ignorar as recomendações de isolamento social da Organização Mundial de Saúde. Pelo contrário).
Os fabricantes automotivos também estão sendo afetados. Só no Brasil, a expectativa é que a pandemia gere um impacto negativo de R$ 40 bilhões, conforme previsão do presidente da VW para América Latina e Caribe, Pablo di Si.
E se no passado recente as multinacionais da área apelaram às matrizes para socorrer prejuízos, desta vez o buraco será mais embaixo. Isto porque as próprias matrizes vêm enfrentando dificuldades para retomar vendas e receitas em mercados como China, Europa e EUA.
Para garantir a sobrevivência das operações em médio e longo prazo, sacrifícios terão de ser feitos. Um deles será o atraso ou o cancelamento de novos modelos cujos investimentos ainda não foram provisionados. Outro será a tentativa de adiar o investimento em novas tecnologias de segurança e eficiência energética.
No caso específico de nosso país, uma das alternativas aventadas pelo setor será pedir a revisão de metas do programa Rota 2030, que estabelece prazos para o endurecimento dos parâmetros de consumo/eficiência energética e a obrigatoriedade de novos itens de segurança.
Neste ano, por exemplo, tornaram-se mandatórios em qualquer veículo zero-quilômetro vendido no país os ganchos de fixação Isofix, além de barras de proteção laterais, controles de estabilidade e tração a aviso de não afivelamento do cinto do motorista – estes últimos só em novos modelos, reestilizações ou trocas de geração.
Outros componentes estão previstos para os próximos anos em veículos de passeio. Confira a tabela completa:
Item | Novos projetos | Todos os carros novos |
Aviso de não afivelamento do cinto do motorista | 2020 | 2021 |
Controles eletrônicos de estabilidade e tração (ESC) | 2020 | 2022 |
Proteção contra impactos laterais | 2020 | 2023 |
Luzes de seta laterais | 2021 | 2023 |
Luzes de rodagem diurna | 2021 | 2023 |
Alerta de frenagem emergencial pelos piscas (ESS) | 2021 | 2023 |
Sensores traseiros de estacionamento ou câmera de ré | 2025 | 2027 |
Há, ainda, outros itens em estudo para serem regulamentados durante a vigência do Rota, como piloto automático adaptativo, frenagem autônoma emergencial (incluindo pedestres, ciclistas e obstáculos fixos ou móveis), detector de fadiga e aviso e assistente de permanência em faixa.
Na parte de eficiência energética, o primeiro ciclo do programa prevê uma redução média de 11% no consumo de combustível e emissão de poluentes. Por exemplo, num veículo com 1.121 kg, a meta é baixar a média atual de 1,82 MJ/km, estabelecida pelo InovarAuto, para 1,62 MJ/km.
Mas, se depender dos fabricantes, pelo menos uma parte desse cronograma todo terá de ser adiada. Foi o que afirmou Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea (Associação Nacional das Fabricantes de Veículos Automotores) em videoconferência com jornalistas.
“Vamos consultar o governo para estudar a possibilidade de revisão do Rota”, afirmou. “Em uma situação como esta, em que tomaremos um prejuízo bilionário e precisamos de liquidez, alguns investimentos têm de ser revistos”, seguiu.
Moraes não especificou quais itens do Rota o setor pedirá que sejam revistos ou adiados, mas descartou a chance de os fabricantes pedirem para reverter a obrigatoriedade de qualquer item já tornado obrigatório. “Não tem por que mudar o que já foi estabelecido. O investimento desses itens já foi feito”, disse.
Além disso, projetos de médio prazo, cujo ciclo para desenvolvimento e início de produção ainda não foram totalmente financiados, caso do mini-SUV substituto do VW Gol, estão ameaçados.
“Obviamente, toda a indústria vai gastar muito dinheiro. Em três ou quatro meses, gastaremos um valor similar a um plano de investimento de três a quatro anos. Este é o efeito que a crise vai ter”, enfatizou Pablo di Si, presidente regional da VW, em recente entrevista ao site Automotive Business.
“Precisamos de senso de urgência e sobrevivência. Em julho, agosto, setembro vamos reavaliar o mercado, a nossa posição de caixa e liquidez, e pensaremos [se os projetos futuros seguem em frente ou não]”, completou.
Por enquanto, fabricantes darão continuidade apenas a novos produtos cujos investimentos já foram provisionados, caso de VW Nivus e Tarek, dos novos SUVs de Fiat e Jeep, do Toyota Corolla Cross, dos novos Peugeot 208 e 2008, e da família smart car da Citroën.
Ou seja: se você esperava andar num carro eletrificado, obrigatoriamente semiautônomo e munido de diversos outros componentes de segurança em 2030, saiba que o coronavírus pode ter arruinado todos os planos.