Quase oito anos atrás, em dezembro de 2010, o i30 2.0 – primeiro Hyundai avaliado no Longa Duração – era desmontado. E a estreia foi boa, com o hatch médio se despedindo tecnicamente aprovado, apesar de a rede ter dado alguns deslizes e de cobrar preços muito altos por peças e serviços.
Depois, em dezembro de 2013, foi a vez do HB20 1.6, o primeiro modelo da marca coreana fabricado no Brasil, em Piracicaba (SP). Apesar de uma evidente evolução da rede autorizada – e de uma nova aprovação pós-desmonte –, deslizes das concessionárias e pequenas falhas técnicas foram anotadas.
Agora, chegou a vez do Creta. Será que o SUV compacto conseguiu manter o ritmo de evolução da marca dentro do Longa Duração?
Os barulhos na suspensão ficaram no i30. O vidro traseiro direito só travou no HB20. No Creta, as duas únicas queixas relevantes surgiram logo no início da jornada, ambas meros incômodos.
Um barulho na traseira (um chicote elétrico solto dentro da tampa traseira, devidamente reposicionado na rede autorizada) e a dificuldade de fechamento das portas (que a rede nunca conseguiu resolver, mas o tempo de uso tratou de atenuar).
As visitas programadas à rede Hyundai correram sem maiores problemas até os 30.000 km. Mas a parada para a quarta revisão abalou nossa confiança justamente quando a expectativa era maior, afinal havíamos escolhido justamente a concessionária-modelo da marca em São Paulo, a Caoa Premium Services.
Atendentes cordiais e um café da manhã típico de hotel de luxo à disposição dos clientes aumentaram a boa impressão. No entanto, ao submetermos o Creta à vistoria do nosso consultor, Fabio Fukuda – todos os carros de Longa são verificados imediatamente após cada passagem pela rede autorizada –, descobrimos que o filtro de ar do motor não havia sido trocado.
Contatamos a técnica da Caoa, que nos respondeu: “Não tinha o filtro em estoque. Mas dei um desconto para compensar a falta da peça”, como se isso justificasse o fato de terem negligenciado a substituição do item sem sequer se dar ao trabalho de nos deixar cientes.
Mais tarde, na revisão dos 50.000 km, a concessionária Sevec, de Curitiba (PR), descobriu outra mancada da mesma Caoa Premium, dessa vez, no filtro do ar-condicionado. “O que está no seu carro não é de Creta. A concessionária que fez a revisão antes de nós, por engano, colocou um filtro de HB20”, disse o técnico da Sevec.
Com o Creta, reafirmamos um ponto sempre notado no Longa Duração: nada como um extenso convívio para conhecer um carro em todos os seus detalhes.
Foi somente a partir dos 30.000 km que nos chamou a atenção, por exemplo, a retroiluminação restrita ao botão do vidro dianteiro esquerdo, no conjunto de teclas agrupadas na porta do motorista – os demais, ficam na escuridão.
Nada grave, mas uma economia que destoa de uma versão top de linha, como é o nosso Creta Prestige 2.0.
As constantes viagens também nos levaram a perceber um detalhe um tanto desagradável na dinâmica. A cerca de 110 km/h, o câmbio alterna entre quinta e sexta marchas o tempo todo, comprometendo o nível de ruído interno e o consumo.
Na lista de eventos excepcionais, apenas o atropelamento de uma banda de rodagem de pneu de caminhão, solta na estrada, que acabou danificando o para-choque dianteiro.
Para driblar o orçamento de R$ 1.700 da rede Hyundai, buscamos a oficina independente Shida, especializada em reparação de capas plásticas de para-choque, que orçou o conserto em R$ 700. Finalizado o serviço, não gostamos da qualidade – e a economia acabou não compensando.
E foi assim o nosso convívio com o Creta: tranquilo de dar gosto ao longo de 60.000 km. Mas será que o SUV repetiu essa boa performance no desmonte? Vamos às respostas.
De peito aberto
Após uma breve rodagem para obtenção das impressões derradeiras e para colocar os sistemas do Creta em temperatura de trabalho, nosso consultor, Fabio Fukuda, iniciou as medições estáticas.
Para as pressões de óleo e combustível, a Hyundai indica como nominais, respectivamente, 14,22 psi e entre 42,6 psi e 52,6 psi. Aos 60.000 km, nosso carro apresentou 14,5 psi e 43,51 psi. Estava tudo certo também com a pressão de compressão dos cilindros, um dos principais indicativos da saúde de um motor.
O material técnico da Hyundai estipula as pressões de 185 psi como nominal e 164 psi como mínima, com tolerância de 15 psi de diferença entre os cilindros. Por padrão, são feitas três medições em cada cilindro.
Os cilindros 1 e 4 mostraram média de 205 psi, com 195 psi no 2 e 201,66 psi no 3. Ou seja, até aqui, tudo na mais perfeita ordem.
Nos freios, todas as medições (espessura de discos e pastilhas, diâmetro interno de tambores e desvio lateral) estavam dentro dos limites tolerados pela marca coreana.
Os pneus também chegaram bem aos 60.000 km, mas, neste caso, nenhuma surpresa, afinal um par foi trocado logo após os 30.000 km, em virtude de uma unidade, rasgada por uma pedra de canto vivo.
À época, optamos pela substituição numa loja independente, por R$ 1.260 o par – em nossa cotação na rede Hyundai, a média foi de R$ 2.560.
Fukuda elogiou muito a suspensão. “É um dos sistemas mais íntegros que já desmontei. Não encontrei nem uma borracha sequer com o mínimo sinal de desgaste. Bieletas, barras axiais, terminais de direção, pivôs, coxins dos amortecedores e buchas de bandeja estavam sem folgas excessivas, o que explica o trabalho silencioso da suspensão.”
Estava escrito
Como antecipou a medição de pressão de compressão dos cilindros, a desmontagem completa confirmou que o motor estava em plena forma.
Virabrequim, cilindros, anéis de compressão: todas as medições realizadas revelaram números seguramente distantes dos limites tolerados pela marca coreana. Todos os componentes foram submetidos também a uma criteriosa inspeção visual.
“Mais do que os números obtidos, o estado das superfícies impressiona. As paredes dos cilindros, por exemplo, exibem marcas bem definidas do brunimento, que são uma espécie de microrriscos usinados para melhorar a lubrificação. Se ainda levarmos em conta o baixíssimo índice de material carbonizado presente nas válvulas e na cabeça dos pistões, a avaliação final do motor é excelente. Este do Creta está, sem dúvida, entre os melhores e mais limpos já desmontados no Longa Duração”, diz Fabio Fukuda.
Sobre o câmbio automático, nosso técnico disse: “Como de praxe, fizemos a análise do lubrificante da transmissão. Sem registro de falhas de funcionamento nem sinal de material metálico particulado e com odor e textura normais, não havia por que fazer a desmontagem”.
Quanto à cabine, Fukuda fez novos elogios: “Travas e presilhas de alta pressão e em quantidade e posicionamento corretos explicam o baixo nível de ruído interno. A vedação foi excelente. Não encontramos nenhum sinal de poeira ou água abaixo do carpete ou no porta-malas”.
Finalizados os 60.000 km e feito o desmonte, o Creta se despede do Longa Duração aprovado com louvor e deixando claro que, sim, a Hyundai segue evoluindo em qualidade.
PEÇAS APROVADAS
Paredes dos cilindros
Sem sinais de vazamento de óleo, o motor foi desmontado. “As paredes dos cilindros parecem novas. Duro acreditar que se trata de um bloco com 60.000 km já rodados”, disse nosso técnico, Fabio Fukuda.
Válvulas
Mesmo em motores mais avançados, com turbo e injeção direta, é raro encontrar um nível tão baixo de carvão nas válvulas.
Retentores de válvulas
Problema comum no desmonte, a falência dos retentores de válvulas passou longe do cabeçote do motor do Creta. Felizmente.
Pistões
A cabeça dos pistões repete o que se viu nas válvulas: baixíssimo índice de acúmulo de material carbonizado.
Amortecedores
AmortecedoresIsentos de sinais de vazamento oufolga axial na haste, os amortecedores chegaram em plena forma ao fim do teste.
Molas
Molas cansadas são fáceis de se detectar: se tiverem sinais de batida entre os elos, é hora da troca. As do Creta estavam como novas.
Bandeja de suspensão
Bucha, pivô e terminal das duas bandejas trabalhavam justos, sem folga. As borrachas estavam em estado de novas.
VEREDICTO QUATRO RODAS
O Creta se despede com a melhor avaliação de todos os tempos. Nenhum componente, parte ou sistema deu sinais de subdimensionamento. Pelo contrário: o desmonte revelou um carro com 60.000 km com saúde de novo. Já a rede ainda carece de mais cuidado por parte da fábrica.
Linha do tempo (clique nos links para ler as matérias)
- Junho/2017: o Creta entra para a frota e inaugura uma nova fase do Longa Duração: a partir dele, em vez de etanol, os carros beberão só gasolina;
- Setembro/2017: abastecido com gasolina, Creta cobre os 1.000 km entre São Paulo e Brasília com apenas uma parada no meio da viagem;
- Outubro/2017: do agendamento à retirada com excelência de atendimento e serviço. E o melhor tudo com preço justo;
- Outubro/2017: depois de uma viagem entre a capital paulista e a turística cidade de Campos do Jordão (SP), Creta sofre com furo em dois pneus;
- Novembro/2017: SUV da Hyundai segue em calmaria: diário de bordo quase sem reclamações e uma rede de assistência cordial, eficiente e com poucas críticas;
- Novembro/2017: com metade da jornada rumo aos 60.000 km superada, tanto o SUV quanto a rede Hyundai seguem discretos em nosso diário
- Janeiro/ 2017: com uma calmaria de causar inveja até nos melhores carros que já passaram pelo Longa Duração, Creta é periciado quase que em uma análise microscópica;
- Fevereiro/2018: nosso Hyundai é submetido ao primeiro teste e sai do campo de provas com uma ficha gêmea à do Creta avaliado em fevereiro;
- Março/2018: os pedaços de pneu foram arremessados por um caminhão na estrada. Moldura do farol de neblina também foi danificado;
- Maio/2018: o novo SUV passa, de uma só vez, por simulação no mercado de usados, revisão de 50.000 km e orçamento de reparo de para-choque;
- Junho/2018: Fiat Argo, Toyota Prius, Jeep Compass, Hyundai Creta e Renault Kwid. Toda a frota na mesma condição para responder: como a velocidade influencia o consumo;
- Julho/2018: na comparação dos resultados dos testes inicial e final, o Creta está de parabéns. Agora, só resta saber se essa boa impressão se repetirá no desmonte;
- Agosto/2018: Já com 60.000 km e às vésperas da desmontagem, donos de SUV falam sobre quais pontos devem ser destaque no carro.
Folha Corrida
Tabela de preço
- Em junho de 2017 – R$ 100.590
- Atual (modelo usado) – R$ 91.203
- Atual (modelo novo) – R$ 103.680
Quilometragem
- Urb. 15.340 km (25,5%)
- Rod. 44.880 km (74,5%)
- Total 60.220 km
Combustível
- Em litros 6.323,2
- Em reais 25.137,93
- Consumo médio 9,5 km/l
Manutenção (revisão/alinhamento)
- 10.000 km – Max – R$ 215/R$ 165
- 20.000 km – Sinal – R$ 506/R$ 165
- 30.000 km – Andreta – R$ 606/R$ 165
- 40.000 km – Caoa – R$ 608/R$ 165
- 50.000 km – Sevec – R$ 435/R$ 161
Extras (essenciais)
- Filtro de cabine – R$ 78
- Filtro de ar – R$ 135
Extras (acidentais)
- Funilaria – R$ 700
- Borracharia – R$ 100
- Par de pneus – R$ 1.260
Custo por 1.000 km
- Combustível – R$ 417,43
- Revisões – R$ 39,36
- Alinhamento – R$ 13,63
- Extras (essenciais) – R$ 3,54
- Total – R$ 473,96
Ocorrências
520 km Dificuldade para fechar as portas
549 km Barulho na tampa do porta-malas
24.391 km Conserto de dois pneus furados
31.463 km Pneu cortado por uma pedra de canto vivo
31.947 km Substituição de um par de pneus
Testes de pista (com gasolina)
1.021 km | 60.005 km | Diferença | |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 10,8 s | 10,4 s | 3,7% |
Aceleração de 0 a 1.000 m | 32,1 s / 161,2 km/h | 31,8 s / 161,8 km/h | 0,93% / 0,37% |
Retomada de 40 a 80 km/h | 4,5 s | 4,5 s | – |
Retomada de 60 a 100 km/h | 5,8 s | 5,9 s | – 1,72% |
Retomada de 80 a 120 km/h | 7,4 s | 7,2 s | 2,7% |
Frenagens de 60 / 80 / 120 km/h a 0 | 16,6 / 29 / 65,9 m | 15,9 / 27,9 / 65,1 m | 4,22% / 3,79% / 1,21% |
Consumo urbano | 8,7 km/l | 9,7 km/l | 11,49% |
Consumo rodoviário | 12,7 km/l | 12,7 km/l | – |
Ficha técnica – Hyundai Creta
- Motor: flex, dianteiro, transversal, 4 cilindros em linha, 1.999 cm³, 16V, 81x 97 mm, 12,1:1, 166/156 cv a 6.200 rpm, 20,5/19,1 mkgf a 4.700 rpm
- Câmbio: automático, sequencial de 6 marchas, tração dianteira
- Direção: elétrica, 2,7 voltas entre batentes, 10,6 m (diâmetro de giro)
- Suspensão: independente McPherson (diant.), eixo de torção (tras.)
- Freios: discos ventilados (diant.), tambor (tras.)
- Pneus: 215/60 R17
- Peso: 1.399 kg
- Peso/potência: 8,43/8,97 kg/cv
- Peso/torque: 68,24/73,25 kg/mkgf
- Dimensões: comprimento, 427 cm; largura, 178 cm; altura, 163,5 cm; entre-eixos, 259 cm; alt. livre do solo: 19 cm, porta-malas, 431 litros; tanque de combustível, 55 litros
Rivais do Creta que já passaram pelo Longa Duração
Nissan Kicks: desmontado em dezembro de 2017
Custo por 1.000 km
- Combustível – R$ 335,42
- Revisões – R$ 47,32
- Alinhamento – R$ 15,56
- Extras – R$ 1,09
- Total – R$ 399,39 (valores atualizados pelo índice de inflação IPC-A)
Jeep Renegade: desmontado em dezembro de 2016
Custo por 1.000 km
- Combustível – R$ 375,39
- Revisões – R$ 44,86
- Alinhamento – R$ 19,53
- Extras – R$ 0,00
- Total – R$ 439,78 (valores atualizados pelo índice de inflação IPC-A)
Honda HR-V: desmontado em dezembro de 2016
Custo por 1.000 km
- Combustível – R$ 309,97
- Revisões – R$ 48,48
- Alinhamento – R$ 16,99
- Extras – R$ 39,54
- Total – R$ 414,98 (valores atualizados pelo índice de inflação IPC-A)
Ford EcoSport: desmontado em janeiro de 2014
Custo por 1.000 km
- Combustível – R$ 329,01
- Revisões – R$ 46,34
- Alinhamento – R$ 12,45
- Extras – R$ 16,95
- Total – R$ 404,75 (valores atualizados pelo índice de inflação IPC-A)