Centauro é fora-de-série raríssimo com V8 do Maverick e automático
O fora de série pernambucano mudou até de casa na esperança de atender uma seleta clientela disposta a pagar pela exclusividade
Produzido entre 1973 e 1979, o Maverick foi o modelo escolhido pela Ford para enfrentar o onipresente Chevrolet Opala. O desempenho proporcionado pelo motor V8 de 5 litros e 197 cv cativou entusiastas como o engenheiro Carlos Alberto Correia, que decidiu desenvolver uma versão própria do Maverick: o Decorauto Centauro.
Especializada na personalização de automóveis, a Decorauto foi fundada em Recife (PE) em 1963 e em pouco tempo dedicou-se à restauração de modelos fora de série como o Puma. “Com a experiência adquirida, decidimos criar um modelo próprio com motor V8, acima dos concorrentes com motores de quatro e seis cilindros”, conta Carlos Alberto.
Assim surgiu o Decorauto Centauro, cujo desenvolvimento teve início em 1975, pouco antes da proibição da importação de automóveis e bens considerados de luxo. Controversa ou não, o fato é que essa medida fomentou a indústria brasileira de automóveis fora de série, disposta a satisfazer os anseios de um público sofisticado e carente de opções.
Todo Centauro era construído a partir de um Maverick usado, encontrado no mercado, com carroceria cupê e motor V8. Uma unidade em bom estado era selecionada e em seguida desmontada. A estrutura monobloco e as portas de aço estampado recebiam painéis moldados em plástico reforçado com fibra de vidro. A parte dianteira também era inteiramente produzida com o material sintético.
Apesar de manter as proporções do Maverick, o estilo era similar ao de modelos norte-americanos de meados da década de 1970 como Buick Skyhawk e Oldsmobile Starfire. Outras soluções de estilo lembram as adotadas por designers como os irmãos Ralph e Bob Eckler e Peter Arcadipane (criador do Pursuit Special do filme Mad Max).
Seguindo a tendência da época, os faróis retangulares vinham do Fiat 147. Exclusivas, as lanternas traseiras eram produzidas pela própria Decorauto e entre elas o painel que escondia o bocal do combustível. Este painel e a tampa do porta-malas contavam com abertura elétrica por botões pouco abaixo do painel.
Não demorou para que o Centauro despertasse a atenção de entusiastas pelo Brasil afora. Um deles foi o empresário Sigesfredo Camargo Neto, que rapidamente estabeleceu uma parceria comercial com a Decorauto. “Os Mavericks sofriam muito com a corrosão em Recife: era mais fácil encontrá-los em São Paulo”, conta Carlos Alberto.
Assim surgiu a Multifibra Indústria e Comércio de Fibras e Metais, empresa responsável pela produção do Centauro paulista. Uma das primeiras unidades chamou a atenção do jornalista Paulo Celso Facin, que o submeteu a uma breve avaliação para a revista Motor 3 ao lado do saudoso colega José Luiz Vieira.
Em vias públicas o ponto mais crítico foi a visibilidade traseira, em razão da área envidraçada ser ainda menor que a original do Maverick. Andando forte em Interlagos, Paulo Celso descreveu o Centauro como mais arisco que o Maverick em curvas de baixa. E anotou dois problemas: oscilações laterais acima dos 140 km/h causadas pelas rodas muito largas e superaquecimento provocado pela dianteira com aberturas de refrigeração subdimensionadas, abaixo do para-choque.
“O desenho original proporcionava refrigeração adequada, mesmo no quente verão de Recife”, relata Carlos Alberto. “Mas, em 1982, adicionei uma grade dianteira e pouco tempo depois rebaixei a linha de cintura para que as janelas laterais traseiras ficassem maiores.”
Produzido em 1982, o exemplar das fotos foi feito sobre um Ford Maverick 1976 e integra o acervo da Garage Brazil, coleção especializada em modelos fora de série nacionais. “Trata-se do único Centauro conhecido em perfeito estado”, relata Paul William Gregson, colecionador de Maverick e autor de três livros sobre o lendário Ford.
Não se sabe quantos Centauro foram feitos: estima-se que menos de 50 unidades tenham sido produzidas até 1986. “Mesmo com a parceria de Sigesfredo, estava cada vez mais difícil encontrar um Maverick V8 em bom estado e por esse motivo decidi desenvolver um novo modelo, o Lince, baseado na plataforma do Chevrolet Opala”, conta Carlos.
Com a abertura das importações, a Decorauto migrou para a produção de lanchas, uma vez que o mercado náutico foi pouco afetado por elas. Mas Carlos Alberto ainda tem esperança de retornar ao mercado de automóveis fora de série: aos 78 anos, o engenheiro continua desenhando novos modelos, desta vez baseados em automóveis estrangeiros.
FICHA TÉCNICA – Decorauto Centauro 1982
Motor: longitudinal, 8 cilindros em V, 4.950 cm3, alimentado por carburador de corpo duplo
Potência: 197 cv (SAE) a 4.600 rpm
Torque: 39,5 kgfm (SAE) a 2.400 rpm
Câmbio: automático de 3 marchas, tração traseira
Carroceria: fechada, 2 portas, 6 lugares
Dimensões: comprimento, 460 cm; largura, 179 cm; altura, 134 cm; entre-eixos, 261 cm
Peso: 1.450 kg
Pneus: 205 HR 14
Custo da transformação: Cr$ 560.000 (agosto de 1981)