Antes eram essenciais e agora são praticamente dispensáveis. As chaves dos carros passaram por diversas transformações nas últimas décadas e, assim como o próprio automóvel, ficaram mais inteligentes e tecnológicas. Mas estão voltando à origem dos veículos automotores, quando nem sequer era necessário ter uma chave para dar partida no motor.
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Quando começaram a transformar carroças em automóveis, o processo de dar partida era complicado. Em modelos como os primeiros Ford Model T era necessário realizar cerca de dez etapas, entre elas virar um comutador rotativo para ativar a ignição e dar uma girada na famosa manivela, que além de cansativa podia ser perigosa. Mas a chave propriamente dita não existia ainda.
Na verdade, ligar os carros (e conduzir, também) era tão complicado que os roubos quase não existiam. A chave, assim como as próprias portas, não estavam presentes em uma grande maioria de veículos entre o fim do século XIX e início do século XX.
Na década de 1910 a bateria automotiva foi inventada por Charles Kettering, um dos fundadores da General Motors. O sistema elétrico usava baterias de quatro volts e dispensou o uso da manivela. O Cadillac 1912 foi o primeiro carro a usar uma chave para ligar a ignição, mas ainda era necessário realizar diversos passos para ligar o motor.
Com o tempo, os carros passaram a ter uma chave para ligar os sistemas elétricos e a partida era feita por meio de um botão. Uma segunda chave era usada para trancar e destrancar as portas, porta-malas e porta-luvas.
Só em 1949 a Chrysler uniu ignição e interruptor de partida aos veículos das suas marcas (como Dodge e Plymouth), sendo ambos acionados por uma chave. Assim surgiu o sistema utilizado até hoje, no qual basta introduzir a chave no painel, dar o primeiro quarto de volta para acionar a ignição e ir um pouco além para ligar o motor. Porém, ainda era necessária uma segunda chave para as portas.
A edição de abril de 1949 da revista americana “Popular Mechanics” até destacou o novo sistema como sendo mais seguro para as crianças. “Além da comodidade para o motorista, esta partida torna impossível que as crianças movam um carro que foi deixado engatado pressionando o botão de partida”, dizia o artigo escrito por Wayne Whittaker.
Em 1965, a Ford inovou e criou a chave com dentes dos dois lados. Imagine a situação: você sai do mercado com várias sacolas na mão. Primeiro, vem a dificuldade em pegar o molho de chaves do carro no bolso. Depois, ainda precisa achar a certa para as portas e introduzi-las na fechadura com os dentes para baixo. Era tão chato quanto acertar o lado do pendrive em uma porta USB.
A chave bidirecional permitia que o motorista pudesse introduzi-la de qualquer lado, tanto nas portas quanto na ignição. Mas, embora ter duas chaves ou mais tivesse alguma serventia, como por exemplo evitar que algum manobrista abrisse seu porta-luvas sem sua permissão, elas continuavam sendo um tanto inconvenientes. A solução chegou só nos anos 70.
Aqui as fontes se divergem. A Honda defende — no vídeo abaixo — que foi a primeira fabricante a ter chave única para dar a partida e abrir tudo no carro, inclusive o tanque de combustível. Porém, uma matéria do New York Times, de 1992, diz que a pioneira foi a Toyota.
De qualquer forma, a chave única veio do Japão. Mas as montadoras americanas torceram o nariz para o novo sistema. Como diz o texto do jornal americano, já nos anos 90, a Ford ainda oferecia uma chave extra para o porta-malas por “razões de segurança”. Foi nessa época que a fabricante começou a permitir que o carro fosse destravado por uma sequência numérica, o que ainda é oferecido na Ford Maverick, por exemplo.
A GM é citada como uma das mais relutantes e oferecia – como opcional pago – um controle remoto para destravar as portas do veículo, tecnologia introduzida nos anos 80, mas que só se popularizou na década seguinte.
Na década de 1990 as chaves como conhecemos começaram a ser dispensadas. Ou quase isso. As primeiras tecnologias com chaves presenciais, que permitem acionar o motor por um botão no painel quando próximas ao veículo, começaram a surgir, como o KeylessGo que estreou no Mercedes Classe S W220, de 1998.
Com isso, chegamos aos dias atuais. As chaves de ignição ainda existem e implementaram uma série de chips e codificações para ficarem mais seguras, enquanto o formato canivete impede que o bolso da sua calça seja perfurado pela lâmina. Mas há exceções como o Toyota Yaris XL, de R$ 91.570, que ainda sai de fábrica com uma chave bem convencional.
As lâminas metálicas não foram completamente abolidas nem nas chaves presenciais, que permitem fazer tudo que a chave antiga fazia sem sair do bolso. Nelas, as lâminas ficam compartimentadas dentro da chave presencial para emergências, enquanto os carros também escondem a fechadura mecânica por acabamentos nas próprias maçanetas externas.
Mas a tendência é que mesmo as chaves presenciais desapareçam. A grande maioria das marcas já têm seus aplicativos para smartphone que permitem destrancar portas, acionar o ar-condicionado e monitorar o veículo remotamente por meio do smartphone do proprietário.
Apps de montadoras como a Volvo, Chevrolet, Mini, Jeep e Tesla permitem ligar o motor, destravar as portas e localizar o veículo pelo celular e até por martwatch. Mas dá para ir mais além: o BMW iX já usa a tecnologia UWB (de Ultra Wide Band) – em vez do NFC, que obriga a aproximar o celular da fechadura – para destrancar o carro por proximidade, mesmo que o smartphone esteja sem bateria. E ainda permite compartilhar o acesso ao carro com quem você quiser.
Assim como no passado, a chave não é exatamente necessária hoje. Mas será que os sistemas mais novos são práticos, pelo menos?