Grandes Comparativos: Ford x Volkswagen nos tempos da Autolatina
Um comparativo reuniu 14 carros da Ford e da Volks na época em que elas formavam a Autolatina
Ford e Volkswagen anunciaram que estão estudando uma aliança estratégica global. As duas empresas querem colaborar entre si em projetos, como no desenvolvimento de uma nova linha de veículos comerciais.
Juntar forças para se tornar mais competitivo no mercado já era uma realidade na indústria automotiva em 1987.
Naquele ano, Volkswagen e Ford se uniram para criar a Autolatina, a fim de otimizar custos, dividir tecnologia e produzir automóveis gêmeos.
Porém a incompatibilidade de gênios das duas empresas provocou o fim da joint venture em 1996.
Na edição de junho de 1992, no auge desse acordo operacional, QUATRO RODAS fez um supercomparativo com 14 modelos da Volks e da Ford separados em sete duplas de carros concorrentes.
Além dos testes, foram considerados preços de peças de reposição, a situação deles no mercado brasileiro, uso no dia a dia, conforto e estilo.
Questão de preços
O primeiro duelo aconteceu entre os automóveis mais caros: Versailles 2.0i Ghia e Santana GLS 2000i. Muito equilibrados em aparência, conforto e nos números de teste, foi preciso ir às concessionárias para definir o vencedor.
Nas lojas, a reportagem fez um orçamento com 12 itens de reposição mais frequentes, entre eles amortecedores, filtro de ar, pastilhas de freio e velas. Os preços deram o ponto para o modelo da Ford, que apresentou a manutenção mais em conta.
A diferença no valor da chave de ignição, por exemplo, chegou a 77%.
Na pista, houve empate técnico, fruto do desempenho do ótimo motor VW AP-2000i que equipava os dois. O Santana chegou a 176,6 km/h de velocidade máxima e o Versailles alcançou 176,1 km/h.
Na aceleração de 0 a 100 km/h, outro resultado quase idêntico: o Santana gastou 12,04 segundos e o Versailles, 12,17.
Só na frenagem a desvantagem do Ford foi perceptível. Vindo a 80 km/h, precisou de 29,3 metros, enquanto o Volks parou em 28. Mas isso não foi o suficiente para frear a ofensiva da Ford, que fez 1 x 0 no placar.
Santana GLS 2000i | Versailles 2.0i Ghia | |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 12,04 s | 12,17 s |
Velocidade máxima | 176,6 km/h | 176,1 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 28 m | 29,3 m |
Consumo médio | 10,89 km/l | 10,81 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 95.730.645 | CR$ 95.330.098 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 187.563 | R$ 186.778 |
Motor | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 984 cm³, 82,5 x 92,8 mm, 112 cv a 5 600 rpm, 17,5 mkgf a 3 400 rpm, injeção eletrônica | diant., longit., 4 cil.em linha, 1 984 cm³, 82,5 x 92,8 mm, 112 cv a 5 600 rpm, 17,5 mkgf a 3 400 rpm, injeção eletrônica |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 457 cm; largura, 168 cm; altura, 141 cm; entre-eixos, 254 cm; peso, 1 190 kg | compr., 457 cm; largura, 168 cm; altura, 141 cm; entre-eixos, 254 cm; peso, 1 160 kg |
De todos os irmãos Ford e Volkswagen, pode-se dizer que Verona e Apollo eram os mais parecidos. “Ambos não passam de um Escort três volumes. Por se tratar de uma variação do Verona, o Apollo, como quase todas as cópias, saiu pior que o original”, afirmava o texto.
De fato, o Apollo teve vida curta no mercado, mas não era um carro ruim. O câmbio vinha da matriz alemã e o motor 1.8 era made in Brazil.
Exigidos na pista, os dois conseguiram bons resultados, embora a diferença em frenagem tenha chamado atenção. De 80 km/h a 0, o Verona conseguiu parar depois de 34 metros, 3 a menos que o Apollo.
Como os dois possuíam o mesmo sistema de freios, a explicação estava nos pneus: o Ford utilizava pneus de perfil baixo da série 60, enquanto o Apollo trazia a comportada série 70. Um contrassenso para um automóvel que seguia uma linha mais esportiva.
Verona GLX 1.8 |
Apollo GLS 1.8 |
|
Aceleração de 0 a 100 km/h | 13,04 s | 13,41 s |
Velocidade máxima | 163,4 km/h | 162,7 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 34 m | 37 m |
Consumo médio | 12,73 km/l | 12,35 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 45.725.697 | CR$ 47.943.703 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 89.589 | R$ 93.935 |
Motor | diant., transv., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 86 cv a 5 400 rpm, 14,5 mkgf a 3 000 rpm, carburador | diant., transv., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 86 cv a 5 400 rpm, 14,5 mkgf a 3 000 rpm, carburador |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 421,5 cm; largura, 164 cm; altura, 133,1 cm; entre-eixos, 240,2 cm; peso, 988 kg | compr., 421,5 cm; largura, 164 cm; altura, 133,1 cm; entre-eixos, 240,2 cm; peso: 985 kg |
O duelo seguinte foi Escort 1.6 L contra Gol CL 1.6. O texto salientava que “quem compra um automóvel dessa categoria deve se preocupar mais com mercado e economia de combustível e menos com altas velocidades e ótimas acelerações”.
Na época, falava-se que o Gol CL era sinônimo de cheque visado, tamanha a facilidade de negociar na hora da revenda.
Se o Gol significava um ótimo negócio, o mesmo não se aplicava ao Escort. Ele seria renovado no fim do ano, portanto, comprá-lo naquele momento era rasgar dinheiro.
Além de sua conhecida valorização entre os usados, o Gol tinha mecânica confiável e baixo custo de manutenção. Seu jogo de amortecedores era 45,4% mais barato que o da Ford.
Na pista, o Escort (com melhor eficiência aerodinâmica) se deu melhor com o motor AE-1600, que tanto sucesso fez equipando… o Gol. O velocímetro do Ford chegou a 157,7 km/h, superando os 148,7 km/h do Gol. No 0 a 100 km/h, novo triunfo do Escort: 13,19 segundos, contra 14,34.
Mas, como nesse caso o investimento falava mais alto que o desempenho, a vitória foi para o Volks.
Escort L 1.6 |
Gol CL 1,6 |
|
Aceleração de 0 a 100 km/h | 13,19 s | 14,34 s |
Velocidade máxima | 157,7 km/h | 148,7 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 35,9 m | 32,5 m |
Consumo médio | 13,43 km/l | 13,53 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 32.338.955 | CR$ 26.776.422 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 63.361 | R$ 52.462 |
Motor | diant., transv., 4 cil. em linha, 1 555 cm³, 77 x 83,5 mm, 74 cv a 5 000 rpm, 12,6 mkgf a 3 400 rpm, carburador | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 555 cm³, 77 x 83,5 mm, 72 cv a 5 400 rpm, 12,6 mkgf a 3 400 rpm, carburador |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 402 cm; largura, 164 cm; altura, 132 cm; entre-eixos, 240 cm; peso, 882 kg | compr., 381 cm; largura, 160 cm; altura, 135 cm; entre-eixos, 235 cm; peso, 874 kg |
O Escort de novo entrou em cena, agora na versão 1.8 Guarujá, que enfrentou o sedã Voyage GL 1.8. O projeto mais moderno do Escort contou pontos para que ele vencesse.
Havia, ainda, um detalhe curioso a seu favor: “Ironicamente, a vitória do carro da Ford contou com o apoio importante do conjunto motor/câmbio da Volkswagen. Em contrapartida, a VW não ganhou absolutamente nada da Ford para o enriquecimento do Voyage”.
Evoluções e involuções
Em outras palavras: com a Autolatina, o Escort evoluiu. Já o Voyage permaneceu estagnado. “É o mesmo carro lançado na versão duas portas há dez anos”, dizia o texto.
Ao entrar nos carros, a superioridade do Escort ficou evidente. Os bancos do Guarujá eram macios e ofereciam mais espaço para as pernas dos passageiros que iam atrás. Os comandos dos vidros eram elétricos nas portas dianteiras, ao passo que todos os vidros do Voyage tinham de ser abertos com manivelas.
Em movimento, o modelo da Ford tinha um sistema de suspensão com calibragem mais suave. Prejudicava um pouco a estabilidade, mas aumentava o conforto.
Na pista, o Escort foi melhor em velocidade máxima e consumo médio e pior em aceleração de 0 a 100 km/h e frenagem de 80 km/h a 0. Levou a melhor no duelo.
Voyage GL 1.8 | Escort Guarujá 1.8 |
|
Aceleração de 0 a 100 km/h | 11,84 s | 13,41 s |
Velocidade máxima | 161,9 km/h | 164,1 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 30,7 m | 31,9 m |
Consumo médio | 11,28 km/l | 12,02 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 37.271.950 | CR$ 41.596.227 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 73.026 | R$ 81.498 |
Motor | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 88 cv a 5 200 rpm, 14,7 mkgf a 3 400 rpm, carburador | diant., transv., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 86 cv a 5 400 rpm, 14,5 mkgf a 3 000 rpm, carburador |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 407 cm; largura, 160 cm; altura, 135 cm; entre-eixos, 235 cm; peso, 955 kg | compr., 402 cm; largura, 164 cm; altura, 138 cm; entre-eixos, 240 cm; peso, 975 kg |
A partir disso, a Volks impôs uma virada com o comparativo de Pampa 1.8 S contra Saveiro GL 1.8. “Frente a frente, as picapes da Autolatina mostraram que os comerciais leves valem muito mais do que transportam”, elogiava a reportagem.
A começar pelo interior da Pampa, que oferecia painel completo, com velocímetro, conta-giros, nível de tanque e termômetro de água. A Saveiro, ao contrário, tinha um painel pobre.
Ao dar a partida, porém, o duelo se tornou uma covardia. A Saveiro deu uma lavada em todos os quesitos: velocidade máxima, aceleração, retomada, consumo, nível de ruído e frenagem. No 0 a 100 km/h, por exemplo, ela gastou 11,42 segundos, contra longos 14,72 segundos da Pampa.
Apesar do motor idêntico (AP-1800), a Saveiro desenvolvia 8 cv a mais. A justificativa estava no projeto: “Para adaptar o motor sob o capô da Pampa, a engenharia precisou estrangular o coletor de escape, criando uma série de restrições na tubulação”, descrevia a reportagem.
Para sacramentar a vitória da Saveiro, sua caçamba era capaz de alojar 870 litros, 30 litros a mais que a rival.
Pampa S 1.8 | Saveiro GL 1.8 |
|
Aceleração de 0 a 100 km/h | 14,72 s | 11,42 s |
Velocidade máxima | 150,8 km/h | 163,2 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 34,6 m | 33,9 m |
Consumo médio | 10,81 km/l | 10,95 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 33.877.278 | CR$ 30.390.778 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 66.375 | R$ 59.544 |
Motor | diant., transv., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 80 cv a 5 400 rpm, 14,0 mkgf a 3 400 rpm, carburador | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 88 cv a 5 200 rpm, 14,7 mkgf a 3 400 rpm, carburador |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 438 cm; largura, 167 cm; altura, 135 cm; entre-eixos, 258 cm; peso, 1 050 kg | compr., 438 cm; largura, 164 cm; altura, 141 cm; entre-eixos, 260 cm; peso: 920 kg |
XR3 ou GTi?
A Volks igualou o confronto quando Escort 1.8 XR3 e Gol GTi foram para a pista. A reportagem afirmou que a Autolatina havia abandonado o GTi. Mas, mesmo sem receber mais tecnologia, ele seguia como o melhor esportivo nacional.
Os dois estavam na mesma faixa de preço, embora o XR3 tivesse motor 1.8 e o GTi, um 2.0. E justamente a força do AP-2000 foi decisiva para alcançar bons números de desempenho.
O Gol bateu o Escort em velocidade máxima, retomada e aceleração. Só em frenagem o XR3 deu o ar da graça. De 80 km/h a 0, precisou de 27,5 metros, enquanto o adversário se arrastou por mais 1,6 metro.
O Ford ainda esboçou uma reação quando foram levados em conta design, espaço interno, porta-malas e suspensão. O XR3 era o único carro do Brasil que utilizava amortecedores eletrônicos, que endurecia ou amolecia a suspensão por meio de um botão.
Se àquela altura o Escort compartilhasse o AP-2000, o resultado poderia ser diferente.
Escort XR3 1.8 |
Gol GTi 2.0 |
|
Aceleração de 0 a 100 km/h | 13,40 s | 10,67 s |
Velocidade máxima | 167,7 km/h | 175,5 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 27,5 m | 29,1 m |
Consumo médio | 11,49 km/l | 11,38 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 52.827.398 | CR$ 54.121.825 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 103.503 | R$ 106.040 |
Motor | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 781 cm³, 81 x 86,4 mm, 90 cv a 5 600 rpm, 14,6 mkgf a 3 200 rpm, carburador | diant., longit., 4 cil. em linha, 1 984 cm³, 82,5 x 92,8 mm, 120 cv a 5 600 rpm, 17,5 mkgf a 3 400 rpm, injeção eletrônica |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 406 cm; largura, 164 cm; altura, 132 cm; entre-eixos, 240 cm; peso, 1 020 kg | compr., 384,9 cm; largura, 160,1 cm; altura, 135,5 cm; entre-eixos, 235,8 cm; peso, 980 kg |
Casos de família
O fim do comparativo reuniu Versailles Royale 2.0 GL e Quantum GL 2000, modelos destinados à família. Em ambos, três ocupantes viajavam com conforto atrás e o porta-malas tinha os mesmos 698 litros.
Um detalhe fez toda a diferença para a vitória da Quantum: a comodidade das quatro portas, inexistente numa station wagon do porte da Versailles.
Tirando essa facilidade, elas se assemelhavam no restante. Eram peruas bonitas e seguras. “Os resultados ficaram tão próximos que davam a impressão de estarmos avaliando versões diferentes do mesmo carro”.
No 0 a 100, a diferença foi inferior a 3 décimos de segundo a favor da Royale. Os demais testes mantiveram o equilíbrio, comprovando o que ocorria na prática: “A Royale nada mais é do que uma versão duas portas da Quantum”.
Duas portas que deram a vitória à Volks por 4 x 3. Sem problemas: estava tudo em casa.
Quantum GL 2000 |
Royale GL 2.0 | |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 12,86 s | 12,58 s |
Velocidade máxima | 168,8 km/h | 168,9 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 33,4 m | 30,3 m |
Consumo médio | 10,50 km/l | 10,72 km/l |
Preço (junho de 1992) | CR$ 70.264.224 | CR$ 65.360.756 |
Preço (atualizado IPC-Brasil) | R$ 187.563 | R$ 186.778 |
Motor | diant., longit., 4 cil. em linha, 1984 cm³, 82,5 x 92,8 mm, 105 cv a 5 200 rpm, 17,0 mkgf a 3 400 rpm, carburador | diant., longit., 4 cil. em linha, 1984 cm³, 82,5 x 92,8 mm, 105 cv a 5 200 rpm, 17,0 mkgf a 3 400 rpm, carburador |
Câmbio | manual de 5 marchas, tração diant. | manual de 5 marchas, tração diant. |
Dimensões | compr., 453 cm; largura, 169 cm; altura, 140 cm; entre-eixos, 255 cm; peso, 1 182 kg | compr., 461 cm; largura, 170 cm; altura, 144 cm; entre-eixos, 255 cm; peso 1 160 kg |
Nós dissemos… junho de 1992
“Na era Autolatina, a Ford herdou ótimos motores e câmbio e ganhou o Versailles e o Royale de presente. Eles nasceram a partir do projeto do Santana, cuja remodelação aconteceu na fábrica da Volkswagen, na Alemanha, onde ninguém da Ford apita. A Volks ganhou o Apollo derivado do Verona, é verdade, mas isso não fez muita diferença para a linha VW. Quanto à qualidade Ford no acabamento dos carros da Volks, ela não aconteceu. Pelo contrário: os Ford é que perderam o requinte.”