À espera do Cronos, relembre a história dos sedãs da Fiat
Em mais de 40 anos de Brasil, empresa celebrou o sucesso do Tempra e amargou fracassos, como o do Linea
A Fiat construiu sua imagem no Brasil apostando em carros populares. Só que a empresa não investiu apenas em compactos. Em mais de quatro décadas, a marca também se aventurou no segmento de sedãs.
Alguns foram bem sucedidos, como o Tempra. Outros, nem tanto – o Linea é um bom exemplo. Tanto é que o três-volumes sumiu misteriosamente do configurador virtual da marca.
Derivado do Argo, o Cronos será lançado no primeiro trimestre de 2018 com motorizações 1.3 8V Firefly (109 cv, com câmbios manual e automatizado GSR) e 1.8 16V E.TorQ EVO (de 139 cv, com transmissões manual ou automática).
Enquanto ele não chega, vamos relembrar a história dos sedãs vendidos pela Fiat.
Sedãs compactos
Oggi (1983-1985)
O quinto membro da família 147 surgiu em 1983. A vida do Oggi, porém, já começou difícil – tinha o Chevrolet Chevette e Volkswagen Voyage como as grandes forças da categoria.
Design não era seu ponto forte, mas espaço interno, sim – principalmente no porta-malas, um latifúndio de 440 litros.
Tecnologia também era uma virtude do Oggi, equipado com o sistema de cut-off, que fechava a borboleta de aceleração por meio de uma válvula eletromagnética, aumentando a economia de combustível nos grandes declives.
Lançado no ano em que a Fiat sagrara-se campeã de Marcas e Pilotos, ele não haveria de fugir da luta nas pistas. Mas a condição era que existisse uma série de carros de rua que permitisse a homologação para as pistas.
Como forma de promover o Oggi e ao mesmo tempo transformá-lo em carro competitivo, em fins de 1984 surgia o Oggi CSS, versão com tiragem de apenas 300 exemplares.
De cara, chamava atenção por ter apenas uma cor: preta, com faixas adesivas vermelhas bem finas, mais o nome em letras bem maiores que as usadas nos Oggi “normais”.
Várias mudanças foram feitas no modelo, como câmbio com escalonamento mais curto, homocinéticas de maior capacidade e barra estabilizadora de 21 milímetros, 2 milímetros a mais que os 19 da linha.
Atrás, bandejas de suspensão novas, que possuíam uma borda mais pronunciada que as normais da família. Todas essas mudanças acabariam também sendo incorporadas ao Uno, que também estreava naquele mesmo ano.
Não escondendo sua vocação esportiva, chama atenção a cambagem das rodas traseiras, bastante negativa para a média dos carros de rua. Essa característica ajudava, nas curvas mais fortes em velocidades idem, a transmitir sensação de controle ao motorista.
Os carros de pista tinham cambagem ainda mais negativa e contavam com amortecedores reguláveis. Para completar o kit, uma caixa de direção mais direta.
Apesar do bom desempenho nas pistas, o Oggi não teve carreira brilhante, tendo se retirado de cena em 1985, após 20.083 unidades comercializadas.
Prêmio (1985-1995)
Se o 147 havia sido substituído pelo Uno em 1984, nada mais natural do que o Oggi ser aposentado por um novo sedã. Assim nascia o Prêmio, apresentado no Brasil em 1985.
Inicialmente lançado apenas na versão CS duas portas, o carro tinha um inédito motor 1.5 de 71,4 cv.
Honrando a maior qualidade do antecessor, o Prêmio tinha um generoso porta-malas de 444 litros, graças à engenhosa solução de alojar o estepe no cofre do motor. Câmbio, rodas, pneus e a direção também vieram do Uno.
Além do motor mais forte, espaço, conforto e acabamento eram outras apostas da Fiat para diferenciá-lo do hatch. Por ser fixo, o encosto do banco traseiro ficou 8 cm mais largo.
Novas versões chegaram após seu lançamento: a S estreou ainda em 1985 e a topo de linha CSL veio em 1987 com a carroceria de quatro portas.
As maçanetas eram salientes e, opcionalmente, havia ar-condicionado. Além de trava central elétrica, uma segunda impedia a abertura por dentro, garantindo a segurança de quem levava crianças atrás. Computador de bordo era opcional, mas tomava o lugar do conta-giros.
Ainda em 1987, a Fiat começou a exportar o Prêmio de quatro portas para a Europa, onde se chamava Duna. Logo se tornou o décimo carro mais vendido da Itália.
O painel diferenciado do Duna passou a ser adotado no nosso CSL em 1989, assim como bordas laterais negras, friso unindo as lanternas com elemento fumê, apoios de cabeça vazados, entre outros.
Um ano depois, o motor virava 1.6, entregando 84 cv (2 cv a mais do que o antigo 1.5). Os 13,2 mkgf de torque ajudaram o sedã a atingir os 100 km/h em 12,2 segundos.
Após receber faróis mais baixos em 1991, o Prêmio se manteve sem maiores alterações até 1995. Os últimos lotes do modelo até foram importados da Argentina com o nome Duna. Seu sucessor, o Siena, chegaria em 1997.
Siena (1997-2016) / Grand Siena (desde 2012)
A cidade de Siena foi a inspiração para batizar o sedã derivado do Palio. O modelo estreou em agosto de 1997 nas versões EL e HL com dois motores 1.6: um de oito válvulas com 92 cv e outro 16V com 106 cv.
Produzido na Argentina, o Siena surpreendeu o mercado oferecendo um porta-malas de 500 litros. Apenas em 1999 é que o sedã começaria a ser feito em Betim (MG), mesmo ano da estreia da versão 6 Marchas.
Associada ao motor 1.0 de 61 cv, o câmbio manual foi o primeiro do Brasil com seis velocidades, mas a novidade não foi bem recebida pelo mercado e saiu de cena pouco tempo depois.
A nova linha de motores Fire (que ainda equipa alguns modelos da Fiat) estreou no Siena em 2000 com o 1.3 16V de 80 cv.
A primeira reestilização veio no ano seguinte com a grife de Giorgetto Giugiaro, acompanhada de novas motorizações – incluindo a 1.0 16V de 70 cv. Em 2003, a aliança firmada com a Chevrolet trocou o velho 1.6 16V pelo 1.8 adotado em modelos como Corsa e Meriva.
A segunda reestilização do Siena aconteceu em 2004, trazendo traços mais arredondados e novos motores 1.0 (65 cv) e 1.3 Flex (com até 71 cv). Apenas o Siena Fire preservou o antigo design.
Poucas mudanças ocorreram até 2007, quando o sedã sofreu a terceira (e mais profunda) atualização. Os faróis se diferenciavam do Palio pela primeira vez e a traseira ganhou lanternas horizontais recortadas pela tampa do porta-malas.
Juntamente com o aumento de potência nos motores 1.0 e 1.4 veio a versão Tetrafuel, equipada de fábrica com gás natural.
Em 2009, o Siena EL combinava a dianteira do Palio (com faróis de parábola simples) ao motor 1.0 e acabamento mais espartano. Enquanto isso, a versão HLX podia vir com a caixa automatizada Dualogic.
No ano seguinte, a nova linha de motores E.TorQ chegava ao Siena na motorização 1.6 16V, rendendo até 117 cv e 16,8 mkgf. Antes disso, a Fiat mudou os nomes das versões do Siena: saíram ELX e HLX, entraram Attractive e Essence.
O lançamento do Grand Siena, um modelo maior derivado da segunda geração do Palio, fez o Siena permanecer em linha apenas na versão EL com motores 1.0 e 1.4 até 2016. Atualmente, apenas o Grand Siena está à venda – pelo menos até a estreia do Cronos.
Sedãs médios
Tempra (1990-1999)
O Tempra fez a Fiat entrar nas garagens onde compactos não entravam. Lançado na Itália em 1990, ele era um sedã médio baseado no Tipo e veio enfrentar os já cansados Chevrolet Monza, Volkswagen Santana e Ford Versailles.
O design era seu principal chamariz. Elegante, o Fiat se destacava pela inclinação suave do pára-brisa e das colunas traseiras e, principalmente, pelo elevado porta-malas.
A modernidade do projeto aparecia nos vidros rentes à carroceria e no ângulo de abertura das portas. Apesar dos apenas 4,35 metros de comprimento, o espaço interno era destaque e o porta-malas de 413 litros só perdia para o do Prêmio.
Vidros e travas elétricas, ar-condicionado, direção hidráulica progressiva, toca-fitas, rodas de liga leve e até acabamento de madeira faziam parte do cardápio de equipamentos da linha Tempra, dividida nas versões básica e Ouro.
Ao contrário da maioria dos sedãs da época, o Tempra estreou apenas na carroceria de quatro portas, e só em 1992 ganhou a opção de duas portas. Apesar de estiloso, o cupê com colunas traseiras um pouco mais largas não repetiu o sucesso do sedã.
Apenas em abril de 1993 é que chegava a versão 16V, testada por QUATRO RODAS na edição daquele mês. Primeiro motor nacional com quatro válvulas por cilindro, já tinha injeção eletrônica multiponto e, com seus 127 cv, chegou a 191,5 km/h.
O Tempra se tornaria um sonho de consumo dos fãs de desempenho em maio de 1994. Disponível inicialmente apenas na versão duas-portas, o Tempra Turbo trazia faróis extras de longo alcance, rodas do Uno Turbo e aerofólio.
O motor oito válvulas com injeção eletrônica e turbina Garrett T3 (que também foi empregado no Tempra Stile) rendia 165 cv, suficientes para atingir 212,8 km/h e ir de 0 a 100 km/h em 8,23 segundos – dois recordes para a época.
A suspensão foi reforçada e os freios, redimensionados. Nem tudo eram flores, porém: a distribuição de peso de 61% para o eixo dianteiro facilitava saídas de frente e fazia a traseira “flutuar” em altas velocidades.
Mudanças pontuais foram feitas em 1994. Suspensão, freios dianteiros e painel eram os mesmos do Turbo e a grade ganhava um desenho mais simples.
Para 1995, o motor do Turbo passou a equipar o Tempra de quatro portas na versão Stile. Quando surgiram os primeiros boatos de aposentadoria, o sedã ganhou faróis mais estreitos em 1996.
Uma polêmica reestilização surgiu em 1998: grade, pára-choques e maçanetas foram alteradas, destoando do harmônico projeto original. Apesar da chegada do Marea, o Tempra resistiu até 1999, deixando uma legião de fãs.
Marea (1998-2007)
Superar o carisma do Tempra era a dura missão do Marea. Assim como na Europa, o modelo desembarcou no Brasil em 1998 com boas credenciais para não deixar ninguém com saudades de seus antecessor. As linhas modernas e esportivas foram desenhadas pelo próprio centro de design da Fiat.
Debaixo do capô estava um motor 2.0 de cinco cilindros com 20 válvulas. Com 142 cv e 18,1 mkgf de torque máximo, ele é lembrado até hoje pelo funcionamento suave e ronco singular.
Lançada poucos meses depois, a versão SX era mais simples no acabamento e no motor, que perdeu 15 cv ao dispensar o comando variável.
A grande estrela da linha, porém, era o Marea Turbo. Com 182 cv a 6.000 rpm e torque máximo de 27 mkgf a 2.750 rpm, o esportivo honrava o legado do Tempra Turbo.
Pacato em baixas rotações, o assobio da turbina Garrett T28 mostrava-se presente já a 2.000 rpm, soprando vigorosamente a partir de 3.000 rpm.
Suas credenciais levaram o Marea ao topo do ranking de desempenho entre os veículos nacionais, precisando de 8,12 segundos para acelerar de 0 a 100 km/h e atingindo os 219 km/h de velocidade máxima.
Além do turbo, o motor recebia coletor de admissão próprio, bielas e pistões redimensionados e válvulas de escape refrigeradas a sódio. Havia também radiador de óleo e intercooler.
A suspensão mais firme apresentava equilíbrio acima da média, resultado de uma revisão na carga de molas e amortecedores. De eletrônica, só ABS com distribuição de frenagem entre os eixos, atuando em freios a disco nas quatro rodas, também redimensionados.
Em 2002, a Fiat reestilizou a traseira com inspiração no Lancia Lybra. Apesar do desempenho de ponta, o Marea Turbo ganhou a controversa fama de carro difícil de manter, transformando-o em mico no mercado de veículos usados. O Marea saiu de linha em 2007.
Linea (2007-2016)
O Linea nasceu exclusivamente para venda em mercados emergentes. Lançado em 2007 na Turquia, o sedã estreou no Brasil no ano seguinte.
Mesmo sendo derivado de um hatchback compacto (o Punto), o Linea foi posicionado entre os sedãs médios para encarar Honda Civic e Toyota Corolla, até hoje as duas referências da categoria. E esse foi um dos maiores erros estratégicos da Fiat.
Disposta a atrair clientes que não pensariam em ter um modelo vindo de Betim, a marca criou até um programa de benefícios voltado para donos do novo modelo, o Clube L’Único.
O Linea era oferecido nas versões LX, HLX, Absolute e T-Jet. As duas primeiras tinham o motor 1.9 16V Flex com até 132 cv, podendo ser associada à caixa automatizada Dualogic.
Já o Linea T-Jet tinha um motor 1.4 16V movido apenas a gasolina. Com 152 cv, ele era o mesmo conjunto empregado no Grande Punto Abarth europeu. Apesar da pegada esportiva (realçada pela oferta apenas com câmbio manual), o modelo seguia o conceito de downsizing.
O design era diferente do Punto, mas o interior não. O porta-malas levava bons 500 litros. Opcionalmente, o sedã podia vir com o Blue&Me Nav, sistema de conectividade Bluetooth que respondia comandos de voz em funções como navegar pela agenda telefônica e realizar ligações. Sem a tela das centrais multimídia atuais, a navegação por satélite (GPS) exibia as coordenadas do percurso em uma tela monocromática convencional.
Em 2011, o Linea trocou o antigo motor de 1,9 litro pelo 1.8 E.torQ, então recém-apresentado nos modelos Palio, Siena e Strada. Havia duas variações, com 127 cv e 132 cv.
Pequenas atualizações foram feitas nos anos seguintes: a linha 2012 trouxe uma nova versão intermediária chamada Essence e a linha 2013 veio com o câmbio Dualogic Plus e descontinuou a versão T-Jet.
A maior mudança aconteceu em 2014, quando a Fiat reestilizou o Linea na linha 2015. Mudaram grade frontal, para-choques e tampa do porta-malas – que incorporou o espaço para a placa.
O envelhecido interior foi substituído pela cabine atualizada do Punto, mais bonita e bem acabada.
O problema é que as alterações pararam por aí. O Linea teria melhores chances se fosse posicionado entre os sedãs médios. Era um excelente carro nesse segmento. Porém, não tinha condições de enfrentar o alvo selecionado pela marca – Corolla e Civic já estavam em um patamar superior.
Foi a deixa para a Fiat encerrar a produção do Linea, que saiu de linha no primeiro semestre de 2016.