Grandes Brasileiros: Gurgel BR-800
O carro 100% nacional que nasceu de um sonho de infância
O engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel não tinha um grande sonho. De fato, o dele era bem pequeno: produzir um automóvel 100% nacional com 3,2 metros de comprimento, empreitada que depois de 62 anos de vida materializou-se na forma do BR-800.
A ideia nasceu ainda na infância, mas começou a tomar forma em 1956, quando Gurgel ingressou na Ford, recém-saído da GM. Andando pelo bairro paulistano do Ipiranga, conheceu um empresário alemão que montava Fuscas que vinham em peças da matriz, Friedrich Schultz-Wenk, que mais tarde selaria a parceria para fornecer à Gurgel a mecânica VW usada em seus primeiros utilitários.
Estabelecido e capitalizado, Gurgel viu o Fusca sair do mercado em 1986: era a oportunidade para ressuscitar um projeto rejeitado como trabalho de formatura na Escola Politécnica da USP, em 1949. Era o embrião do Cena (Carro Econômico Nacional): pequeno (2,9 metros), leve (450 kg) e com um motor bicilíndrico de 650 cm3, ele foi projetado para ser o automóvel mais barato do país.
Seu chassi tubular era revestido por uma carroceria de fibra de vidro. A transmissão similar à do Chevette custava pouco, mas não oferecia o mesmo rendimento de uma tração dianteira. Rebatizado Gurgel 280 e depois testado pela QUATRO RODAS, ele até que bebia pouco, mas andava ainda menos: fez a15,9 km/l na estrada, com máxima de 108,8 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em longos 47,99 segundos.
O modelo definitivo apresentaria marcas melhores, em dezembro de 1988: 18,62 km/l na estrada e 0 a 100 km/h em 43,48 segundos. A máxima caía para 107,2 km/h, evidenciando sua vocação estritamente mente urbana.
A opinião é ratifcada pelo aposentado Waldir Bortholuzzi, entusiasta da marca e proprietário deste BR-800 1991 da última safra.”Ele é um carrinho urbano, divertido e despretensioso: fica reservado aos momentos de lazer pelo bairro, no máximo uma esticada até um encontro de antigos. Já viajei com ele, mas seu desempenho é modesto: na estrada, ele é um peixe fora d’água”, diz Waldir, que possui mais 12 modelos da marca em sua garagem.
A produção do BR-800 iniciou-se enfm em 1988, viabilizada pelo lançamento de um lote de 10.000 ações da empresa: cada investidor pagava 3.000 dólares pelo carro e mais metade desse valor pelas ações (na época, só sócios podiam comprar o BR). Um bom negócio, considerando que havia gente que pagava ágio de 100% pelo privilégio de rodar com o único automóvel 100% nacional.
Tudo mudaria em 1990: o IPI para automóveis até 1 litro de cilindrada foi defnido em 10%, prejudicando a Gurgel (que antes recolhia só 5%) e benefciando a Fiat (que antes pagava 20%). O BR-800 agora custava pouco menos que o Uno Mille, substancialmente melhor e mais espaçoso. E seus 12,2 km/l na cidade eram um argumento de venda muito pequeno diante dos 11,61 km/l do Gol CL, com o dobro da cilindrada.
Lento, barulhento e desconfortável, ele saiu de cena em 1991, custando mais de 7.000 dólares. A Gurgel até tentou encarar a concorrência com o Supermini, uma evolução do BR-800, mas também não correspondeu à expectativa: fraco e com consumo incompatível, selou a derrocada da mais famosa montadora brasileira, que pediu concordata em 1993 e encerrou as atividades no ano seguinte. O sonho do carro nacional havia chegado ao fim.
Aceleração de 0 a 100 km/h | 34,39 s |
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Velocidade máxima | 110,5 km/h |
Frenagem de 80 km/h a 0 | 34,8 m |
Consumo médio | 13,27 km/l |
Preço (março de 1991) | CR$ 1.540.938 |
Preço (atualizado IGP-M/FGV) | R$ 44.035 |
Motor | longitudinal, 2 cilindros opostos, 2 válvulas por cilindro, comando de válvulas simples no bloco, alimentação por carburador de corpo simples |
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Cilindrada | 792 cm3 |
Potência | 32 cv a 4500 rpm |
Torque | 5,8 mkgf a 2800 rpm |
Câmbio | manual de 4 marchas, tração traseira |
Dimensões | comprimento, 319 cm; largura, 147 cm; altura, 146 cm; entre-eixos, 190 cm |
Peso | 634 kg |
Pneus | 145 SR13 radiais |