Motor turbo a álcool da Fiat deve usar hidrogênio e ignição por plasma
Baseado no motor 1.3 Firefly, motor E4 promete ser revolucionário para explorar o etanol ao máximo
O motor mais moderno do Brasil poderá ser movido 100% a etanol.
Citado durante o anúncio da produção nacional das versões turbo dos motores 1.0 e 1.3 Firefly, o novo motor E4 da Fiat só chegará ao mercado após 2022. Mas, certamente, será uma revolução em termos de tecnologia para os motores nacionais.
Sua missão é nobre: reduzir a diferença entre o consumo do etanol em relação à gasolina, que hoje está ao redor dos 30%, para aproveitar melhor o combustível vegetal. Além de mais barato, o etanol gera é 80% menos emissões que a gasolina.
O ponto de partida será o motor T4, um 1.3 Firefly em versão com cabeçote 16V, comando de válvulas Multiair, turbo e injeção direta flex.
Mas turbo e injeção direta não bastam: o motor E4 terá algumas tecnologias ainda inéditas no Brasil. Uma delas nós já contamos qual é: o conceito de downspeeding, aliado ao já conhecido downsizing.
O quarto estado da matéria
Os últimos motores 100% a etanol da Fiat saíram em carros modelo 2004. Foram os raros Uno 1.0 (Fire), Palio 1.3 (Fire) e Siena, Palio Weekend e Fiorino com motor 1.5 (o velho Fiasa).
O etanol tem maior resistência à detonação, o que permite que o motor trabalhe com taxa de compressão elevada, de até 15:1. No 1.5 Fiasa, porém, não passava de 12:1.
Agora a Fiat mira, justamente, em tecnologias que possam otimizar a queima do etanol dentro dentro da câmara de combustão sob alta pressão, permitindo o desejado aumento da taxa de compressão.
Uma delas é a ignição por plasma – o quarto e mais comum estado da matéria, se você se lembrar de suas aulas de física do ensino médio.
O plasma é obtido do superaquecimento dos gases, cujas moléculas se rompem e liberam seus íons e elétrons neutros, e tem algumas propriedades físicas impressionantes.
A mais útil para os motores é a capacidade de conduzir cargas elétricas com extrema facilidade, o que significa que pode ser perfeito uma ignição de alta tensão e precisão.
Ao contrário de uma vela de ignição comum, que dispersa a energia elétrica em faíscas numa área muito pequena dentro da câmara de combustão, uma vela de plasma pode espalhar a energia por toda a câmara, resultando em uma explosão mais rápida, completa e poderosa.
O plasma também permite um controle maior da ignição, seja pelo controle da intensidade da energia emitida, seja pelo controle da duração da emissão – que também pode se repetir mais vezes dentro de um mesmo tempo de expansão do motor.
Essa maior eficiência da ignição por plasma permite que o início da ignição pode ser atrasado até que o pistão chegue bem próximo do ponto morto superior (PMS), que seria o ideal por aproveitar melhor a energia liberada.
Outra vantagem está em poder funcionar com menos combustível (mistura pobre). Mas estas não são as únicas.
Sistemas de recirculação dos gases de escape (EGR) não são novos. São comuns em motores diesel e estão cada vez mais presentes nos motores a gasolina – principalmente na Europa, onde as regras de emissões serão mais duras em 2020.
Neste sistema, parte dos gases de escape passa por um resfriador e retorna ao motor, se misturando ao ar que é admitido do ambiente. Esses gases inertes reduzem a temperatura de combustão e, consequentemente, a formação dos poluentes óxidos de nitrogênio (NOx). Esses gases em temperatura mais baixa também reduzem a tendência de detonação do combustível.
A proporção de recirculação dos gases acaba sendo limitada para evitar que dificulte a combustão da mistura ar-combustível. Este é um problema que a ignição por plasma evita com sua rapidez e área de atuação maior.
Se as vantagens são tão evidentes, por que nenhuma outra fabricante aposta no plasma? Porque estão seguindo um outro caminho, o da ignição por compressão, ou HCCI.
Será, portanto, um tiro que a Fiat dará sozinha, pelo menos num primeiro momento, à espera de que a aposta dê certo e toda a indústria acompanhe a tendência.
O segredo do hidrogênio
Mais abundante dos elementos químicos, o hidrogênio tem baixa energia de ignição e alta taxa de queima.
É tudo que um motor quer: adicionado à mistura ar/combustível, facilita a ignição, melhora a queima, diminui as emissões de poluentes, aumenta o desempenho e melhora o consumo.
O problema é que gerar hidrogênio por eletrólise – como acontece industrialmente – é caro e seu armazenamento é complexo, principalmente quando lembramos que a aplicação será em carros da Fiat, sensíveis ao preço.
A solução seria fazer o carro produzir o próprio hidrogênio. E isso é possível.
Ao que tudo indica, o motor Fiat E4 apelará para o REGR, sistema de reforma dos gases de escape que retornam à admissão.
A queima do etanol gera O2, CO2 e H2O. No REGR, parte dos gases de escape recebem uma injeção de etanol antes de passar por um reformador catalítico, que por sua vez libera H2, CO, CO2 e CH4, que são enviados para a admissão do motor.
A outra parcela dos gases segue normalmente para o catalizador e escape, mas não sem antes mover o turbo.
São os gases carregados de H2 e CO que fazem a diferença, levando as vantagens do hidrogênio ao motor. Isso, em troca de um pouco de etanol. Há projetos em universidades brasileiras que exploram essa possibilidade.
Resta saber se a Fiat será capaz de tornar isso e a ignição por plasma viável nos próximos três anos – principalmente pelo processamento necessário para que todas as tecnologias do motor trabalhem juntas.
Mas não há dúvidas: as duas tecnologias nasceram uma para a outra.