Óleo de motor usado é reciclado e pode virar asfalto e até diesel
A missão do óleo não acaba depois que ele sai do cárter, usado. Por meio de um novo processo de refino – o “rerrefino” –, ele volta à prateleira
Sabe o que é Oluc? Trata-se de um termo técnico resultante das iniciais de “óleo lubrificante usado ou contaminado”. Após um longo e extenuante trabalho, aquele fluido escurecido que sai do motor na hora da troca passa a ser designado assim. Mas o fio que escorre do cárter não representa o fim da linha para o lubrificante. É apenas o recomeço. Devidamente tratado, o óleo regressa à vida.
O lubrificante usado, retirado dos veículos, é armazenado pelos postos de serviços e oficinas em reservatórios. Periodicamente, empresas autorizadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) fazem a coleta desse material. Além de pagar pelo produto, a coletora fornece ao estabelecimento um “certificado de coleta” para comprovar à ANP que o óleo teve a destinação correta.
Depois de um pré-tratamento, o Oluc é transportado para as rerrefinarias. Isso mesmo, empresas que voltam a refinar o produto. É aí que a mágica (química) acontece. A partir de processos de destilação e remoção de impurezas, o Oluc se torna apto a abandonar essa identificação e voltar a ser óleo básico, denominação que a indústria dá ao lubrificante que ainda não recebeu aditivos.
De acordo com Lucas Freitas, pesquisador em economia circular de óleo lubrificante da Vibra Energia, 100% do Oluc que chega às rerrefinarias é reaproveitado. Nesse processo, 70% se transforma em óleo básico, e pode voltar à prateleira como lubrificante, após a mistura com aditivos para atender os requisitos específicos de cada aplicação. Dos 30% restantes, a maior parte é utilizada como manta asfáltica. Porém, Rodrigo Pfaffenzeller, analista de desenvolvimento de produtos sênior da Vibra, acrescenta que uma pequena parcela se transforma em óleo diesel: “O que quebra da molécula e fica menor é utilizado para fazer combustível (diesel); o que polimeriza e forma molécula maior vira asfalto”, diz. Dessa forma, nada é descartado no meio ambiente.
Freitas garante que, após o tratamento, a matéria-prima apresenta qualidade “igual ou superior” à do óleo “virgem”, o que é chancelado pelas montadoras: “O reprocessamento deixa o óleo básico novo”, reconhece o especialista Henry Joseph Junior, diretor técnico da Anfavea.
A diretora executiva de downstream do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), Valéria Amoroso Lima, afirma que, em termos de logística reversa do óleo, o Brasil é referência mundial. Desde 2005, quando entrou em vigor a Resolução Conama 362 (atualizada pela Resolução 450, em 2012), o país tem normas para tratamento e destinação do óleo usado. Mesmo assim, há desafios. Atualmente, o Brasil tem apenas 14 rerrefinarias, 12 das quais concentradas nas regiões Sul e Sudeste. Fora elas, há duas na região Norte. O Nordeste e o Centro-Oeste não têm esse tipo de instalação.
Tudo se aproveita
Dessas 14 unidades, 13 produzem óleo básico do grupo G1, enquanto uma gera o produto do grupo G2. Segundo Danilo Guimarães Sad, gerente de marketing e estratégias da Vibra, G1 são os óleos minerais tradicionais, enquanto a classificação G2 engloba os óleos com mais tratamentos e maior nível de limpeza.
A meta de reciclagem determinada para este ano pelo Ministério do Meio Ambiente é de 47,5%. Valéria Lima, do IBP, ressalta que o setor tem conseguido superar as metas, que são progressivas e revistas a cada quatro anos. De acordo com ela, contra um objetivo de 45,5% em 2022, o país atingiu 53%. No final de 2023 deverá ser publicada nova portaria, com as metas para os próximos quatro anos.
De acordo com dados da ANP, há pontos de coleta em 4.254 dos 5.570 municípios brasileiros. A agência informa que em 2022 foram coletados 556 milhões de litros de Oluc, dos quais 304 milhões de litros retornaram à vida como óleo básico.
Do óleo, aproveita-se até a embalagem. O Instituto Jogue Limpo – braço das fabricantes e importadoras de óleo – é o responsável pela coleta do material nos pontos de troca e pelo envio às recicladoras. Após lavagem, para remoção do excesso de óleo, elas são esmagadas (para transformá-las em fardos) e trituradas. Dessa forma, elas se transformam em uma resina denominada PCR (resina pós-consumo, na sigla em inglês) e podem se tornar vários produtos, entre eles novas embalagens, fechando o ciclo da reciclagem. De acordo com o instituto, em 2021 foram coletadas 5.200 toneladas de embalagens, em 4.335 cidades do país. Desse total, 4.800 toneladas foram recicladas.
Exemplo de economia circular
Mesmo com uma estrutura longe do ideal, o Brasil é referência mundial na reciclagem do lubrificante e das embalagens usadas pelas empresas