Teste: primeiro Logan era sedã gigante e revolucionário, apesar do design
Renault Logan foi o primeiro Dacia à chegar ao Brasil e pavimentou o caminho para modelos como o Sandero e Kwid; relembre seu primeiro teste, feito em 2007
Após 17 anos, o Renault Logan teve sua produção encerrada na fábrica de São José dos Pinhais (PR). Fazia algum tempo que o sedã compacto só interessava mesmo aos clientes frotistas, em especial aqueles que alugam para motoristas de aplicativo. Essa foi a última vocação de um carro que revolucionou seu segmento.
Em termos de design, o Logan conseguiu evoluir. Mas seu maior trunfo perdurou pelos últimos 20 anos – considerando que ele surgiu na Romênia em 2004 -, que é o enorme espaço interno. Era mais espaçoso que os sedãs médios quando chegou ao Brasil e essa qualidade só foi alcançada em 2018, com o lançamento do VW Virtus.
O Renault Logan honrou as demandas dos brasileiros que buscavam um carro familiar barato. Além do espaço amplo até no porta-malas, sua manutenção era tão ou mais barata que a dos concorrentes e ainda tinha 3 anos de garantia, um diferencial importante àquela época, como lembra o nosso primeiro teste do sedã.
Renault Logan 1.6 16V – Embalagem econômica
Ele não ganha prêmio de design, mas oferece espaço de gente grande por preço compacto. E ainda tem garantia de três anos
Texto publicado originalmente na edição de junho de 2007.
Em se tratando de automóvel, algumas boas ideias saem de onde menos se espera. O melhor projeto de carro de baixo custo “fetiche da maioria dos presidentes de montadoras” dos últimos tempos não é japonês ou alemão e muito menos chinês ou indiano. O sedã compacto Logan vem da Romênia, país que não conta com tecnologia de ponta nem com mão-de-obra farta e barata.
Foi desenvolvido pela Dacia, fábrica que passou para o controle da francesa Renault desde 1999, e nasceu como alternativa de transporte para países emergentes, como os do Leste Europeu e da América Latina. Mas fez tanto sucesso na Romênia que passou a ser vendido também nos mercados vizinhos mais abastados.
De seu lançamento, em 2004, até hoje, a Dacia/Renault já comercializou mais de 500.000 unidades do Logan, sendo que cerca de 10% desse volume foi para países como França e Alemanha. Atualmente, fabricado na Romênia, Colômbia, Índia, Irã, Rússia e Marrocos, o Logan é comercializado em 51 países.
Desde maio, o Brasil passa a fazer parte desse grupo: o Renault Logan produzido em São José dos Pinhais (PR) vai ser vendido, inicialmente, aqui e na Argentina, onde foi lançado há um mês. Por aqui ele estreia em julho. Segundo a Renault, o faturamento para as revendas começa este mês.
No fim de maio, a Renault fez uma apresentação estática do Logan para alguns jornalistas, mas não deu muitos detalhes do lançamento. O preço, que deve ser o principal atributo do modelo, não foi revelado [custaria a partir de R$ 28.590 na versão Authentique 1.0].
O Logan foi apresentado em duas unidades, 1.0 e 1.6, ambas 16V e flex, mas sem identificação em relação aos pacotes de equipamentos. A 1.6 era a mais completa. Vinha com ar-condicionado, duplo airbag, bancos de veludo, emblema cromado no centro do volante, faróis de milha, maçanetas e frisos laterais da cor da carroceria, grade dianteira com aletas cromadas, faixas escuras na coluna entre as portas e rodas de liga leve. Os pneus eram 185/65 R15.
A 1.0 tinha bancos de tecido, frisos e maçanetas pretos, grade dianteira da cor da carroceria e calotas, com pneus 185/70 R14. Os pára-choques eram da cor da carroceria nas duas.
Na Argentina, o Logan foi apresentado nas versões Confort e Luxe, com preços entre 44.000 e 53.000 pesos, o que equivale a cerca de R$ 30.000 e R$ 35.000 reais. Mas os argentinos aguardam o lançamento de uma versão Pack, mais simples “que também será vendida no Brasil”, ao preço de 35.000 pesos ou 23.000 reais.
Na Romênia, o Logan básico custa 6.400 euros, cerca de R$ 17.000. Mas, segundo a Renault, lá as taxas de impostos sobre os veículos não chegam a 20%, ao passo que no Brasil batem nos 27%, para os carros 1.0, e 30,4%, para os de 1 a 2 litros movidos a gasolina.
Uma novidade que a Renault não escondeu foi o prazo de garantia, que será de três anos ou 100.000 quilômetros. “Garantia total e não apenas para motor e câmbio”, diz o gerente de marketing, Cassio Pagliarini. Segundo ele, a Renault optou por esse prazo por entender que o comprador de um modelo do segmento do Logan precisa se sentir seguro de sua escolha e confiar na qualidade do veículo. “Assim o comprador sabe que não terá surpresas na hora da manutenção”, afirma.
Benefícios indiretos
A preocupação se justifica, uma vez que os carros da marca têm fama de possuir custos de manutenção elevados. Segundo o Cesvi, centro de pesquisas que estuda a reparação de veículos, no entanto, o Logan tem o melhor custo de reparabilidade de sua categoria. Seu índice é 13, enquanto o do segundo colocado, o Chevrolet Prisma, é 15 (quanto maior o índice, mais alto é o custo).
De acordo com o vice-presidente da Renault, Christian Pouillaude, a garantia de três anos ” aliás, uma exclusividade do Logan, dentro da linha Renault ” traz benefícios “indiretos”, como assegurar maior valor de revenda para o Logan. “Quem compra o carro usado pode usufruir da cobertura e das vantagens da revisão nas autorizadas da marca”, afirma. Por “carro usado”, leia-se: com menos de três anos ou 100.000 quilômetros.
Na Renault, e também na concorrência, ninguém duvida que o Logan tem boas chances de fazer sucesso no Brasil. Além do preço “que os executivos da fábrica juram de pé junto que será convidativo” e da garantia, o Logan tem outros atributos.
Seu projeto tem virtudes como a possibilidade de sair de fábrica com airbags e freios ABS, por exemplo, embora este último item não esteja nos planos da Renault para o Brasil. Segundo a empresa, a baixa procura justifica a decisão de não oferecer o equipamento.
Em uma plataforma de conceito antigo, porém, recursos como esses nem poderiam ser cogitados. Ainda na área das qualidades, sua estrutura é robusta e o aproveitamento interno é um dos melhores no segmento.
O Renault Logan é maior que um Toyota Corolla, na largura e na altura. No entre-eixos, enquanto o Corolla mede 260 cm, o Logan tem 263 cm. A cabine do Logan oferece espaço para cinco adultos (de fato) e o porta-malas leva 510 l de bagagem, capacidade maior que a o do Siena, um de seus rivais, com 500 l.
Não faltam argumentos racionais para convencer o consumidor a ter um Logan. Mas, no caso do motorista brasileiro, ainda é cedo para dizer se eles são suficientes. Brasileiro, apaixonado por carro, compra junto a imagem que ele lhe confere. Uma decisão em que o emocional pesa muito, fardo que é aliviado nos segmentos de entrada. Mas basta lembrar como o mercado subverteu o conceito de carro popular, em nossa história recente.
Para citar um exemplo, o Fiat Uno Mille chegou em 1990 como um autêntico pé-de-boi. Em pouco tempo, mais precisamente em 1994, ganhou a versão ELX, que tinha quatro portas, ar-condicionado e preço do segmento superior.
O design do Logan está longe de ser de vanguarda como os Renault desenhados pela equipe do designer Patrick le Quément, como o Mégane e a Scénic IV. Ao contrário, o Logan parece ter herdado as linhas do antigo Renault 19 reinterpretadas pela Dacia, que há até pouco tempo ainda fazia modelos com estilo dos anos 70.
Para melhorar a imagem do carro, a Renault deve caprichar na apresentação para o mercado. Entre outras coisas, a empresa encomendou uma versão esportiva transformada para tomar parte dos eventos de lançamento.
Para conhecer melhor o Logan que em breve estará entre nós, fomos até a Argentina, para nosso segundo contato com ele. O primeiro foi em julho de 2005, quando fizemos na Romênia nossas Impressões ao Dirigir.
Dá para ver que o Logan mudou pouco ao cruzar o Atlântico. Visualmente, ganhou novo para-choque dianteiro (com abertura maior na parte inferior), novos faróis (agora com lentes de policarbonato e detalhes cromados na base) e rodas de liga leve de desenho diferente. As lanternas traseiras incorporaram mais uma área branca nas lentes (com lâmpada laranja, para os indicadores de direção).
Na cabine, a cobertura metálica no console ficou ligeiramente maior. A unidade testada era um exemplar da versão Luxe mais completa, equipada com motor 1.6 16V a gasolina, bancos de veludo, airbags e freios ABS.
Não é preciso ser perito para descobrir onde a Renault fez economia. O painel e o console, por exemplo, formam uma peça única, que simplifica a confecção, facilita a montagem e diminui o número de componentes. Os espelhos retrovisores externos são idênticos e podem ser usados em qualquer um dos lados, com o objetivo de diminuir custo de manufatura e estoque de peças de reposição.
O plástico duro usado nas travas das portas e nos puxadores transparece simplicidade, assim como o carpete que reveste o piso do porta-malas. Este, por sua vez, no compartimento em que fica o estepe, não chega a ser pintado. Recebe apenas a primeira camada de tinta protetora bege (chamada primer). Na tampa do porta-malas não há revestimento e as dobradiças são duas hastes com molas.
O Logan é bastante simples, mas não é mal acabado. As colunas do teto são revestidas com plástico, há encosto de cabeça para cinco pessoas, o console entre os bancos vem com porta-copos e as saídas de ar são giratórias.
Na unidade avaliada os para-choques estavam desalinhados em relação à carroceria, e o espaço entre a grade dianteira e o capô dava a impressão de que o capô estava mal fechado, mas isso são problemas de ajuste durante a montagem, que não havia nas unidades apresentadas dias depois, na fábrica de São José dos Pinhais. Em nosso teste, passamos por buracos e ondulações sem reclamar de chiados e estalos que são eventos comuns quando a torção da carroceria encontra peças de acabamento mal fixadas.
Sinais de satélite
Motor e transmissão também estão bem isolados acusticamente. O único ruído percebido como um pouco mais elevado foi aerodinâmico. Na estrada, acima de 100 km/h, o vento frontal se fazia sentir no para-brisa e também lateralmente, nas frestas das portas.
A posição de dirigir é elevada e a área envidraçada proporciona boa visibilidade. O comportamento dinâmico é muito parecido com o do Clio Sedan, de quem o Logan herda motor, câmbio, direção, freios e suspensões. O Clio, aliás, entrou também com diversos componentes como as maçanetas e os comandos de luzes e limpadores de para-brisa. A Renault diz que, mesmo com o conteúdo semelhante, o Clio Sedan não sai de linha nem perde versões com a chegada do Logan.
Apesar de o motor não ser flex como será o nosso “e o combustível argentino não ter álcool na formulação”, fizemos algumas medições de desempenho com nosso carro de teste, auxiliados por um sistema Racelogic que trabalha com sinais de satélite.
Nas provas de aceleração, o Logan fez de 0 a 100 km/h em 11,1 segundos, ficando tecnicamente empatado com o Clio 1.6 16V hatch que testamos em nossa pista, na edição de abril deste ano. Nas retomadas de velocidade, eles também andaram juntos, sempre comparando os números do argentino com os do brasileiro rodando com gasolina. O Logan surpreendeu na frenagem. Vindo a 80 km/h, precisou de 26,6 metros para parar, enquanto o Clio gastou 30,2 metros.
O Logan sedã é o primeiro modelo de uma grande família que será desenvolvida sobre a mesma plataforma, que dará origem a um hatch a ser lançado no Brasil provavelmente ainda este ano [o Renault Sandero]. Até 2010, a família Logan terá versões em forma de van, utilitário esportivo e, talvez, uma picape leve, nos diferentes mercados onde é vendida ” não se sabe se todos eles terão nacionalidade brasileira.
Por aqui, a expectativa da Renault é que o Logan seja o carro da virada. Em 2006, a fábrica ficou no oitavo lugar entre as montadoras, com 2,8% de participação no setor.
A proposta, em princípio arrojada, dá frutos lá fora e já fez escola. Resta saber como o público brasileiro vai receber esse novo conceito, em que a forma cedeu lugar à função sem fazer cerimônia alguma. Uma coisa é certa: se o conceito foi surpreendente, não espere surpresas do Logan. Para o bem e para o nem tanto, ele é exatamente o que parece.
Clamor popular
O segmento onde o Logan está presente é o que mais cresce no mundo. Segundo um estudo da consultoria Roland Berger, até 2012, o chamado segmento A/B (que inclui os veículos de até 10 000 dólares) vai avançar em média 4% ao ano, passando das atuais 14 milhões de unidades para 18 milhões, chegando a responder por um quarto do mercado mundial.
Veredicto
O Logan entrega o que promete. Mas o preço será determinante para seu sucesso no mercado
Teste – Renault Logan 1.6 16V
Aceleração 0 a 100 km/h – 11,1 segundos
Retomadas 40 a 80 km/h* – 6,6 segundos
60 a 100 km/h – 9,8 segundos
80 a 120 km/h – 15,1 segundos
Frenagem:
60 a 0 km/h – 15 metros
80 a 0 km/h – 26,6 metros
120 a 0 km/h – 60 metros
* Em terceira marcha
** Em quarta marcha
* Em quinta marcha
Ficha técnica – Renault Logan 1.6 16V
Motor: dianteiro, transversal, 4 cilindros, 16V, gasolina; Cilindrada: 1 598 cm3; Diâmetro x curso: 79,5 x 80,5 mm; Taxa de compressão: 10:1; Potência: 110 cv a 5750 rpm; Torque: 15,4 mkgf a 3750 rpm; Câmbio: manual de 5 marchas, tração dianteira
Dimensões: comprimento, 425 cm; largura, 174 cm; altura, 152 cm; entreeixos, 263 cm
Peso: 1 132 kg
Volumes: porta-malas, 510 litros; combustível, 50 litros
Suspensão: Dianteira: Mc Pherson. Traseira: eixo de torção
Freios: disco na dianteira, tambor na traseira
Direção: hidráulica, pinhão e cremalheira
Pneus: 185/65 R 15