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10 motivos para você não comprar um Volkswagen Fusca

Quando o Volkswagen Fusca saiu de linha pela primeira vez, em 1986, ele já era antiquado. Mas voltou a ser fabricado sete anos depois

Por Bob Sharp | Introdução: Henrique Rodriguez
Atualizado em 22 jan 2023, 10h58 - Publicado em 22 jan 2023, 10h58
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  • Era março de 1993. A Volkswagen do Brasil preparava o relançamento do Fusca sete anos depois de ter saído de linha. Carros já podiam ser importados e os nacionais começavam a ganhar injeção eletrônica e freios ABS, mas a Volkswagen (então parte da Autolatina) estava atrás de todo o ferramental que havia repassado a fabricantes de peças para poder dar vida ao Fusca novamente.

    Foi uma empreitada sem precedentes. Ainda precisaram reconstruir ferramentais para peças específicas, convocar funcionários que haviam trabalhado na linha do modelo e ajustar seu motor para as regras de emissões em vigor naquele momento.

    Além disso, havia uma outra motivação além da sugestão do então presidente Itamar Franco, um apaixonado pelo Fusca e que acabou dando nome a essa geração: os incentivos de redução do IPI que criava a categoria dos carros populares valia tanto para carros com motores de até 1000 cm³, quanto para os refrigerados a ar – que no Fusca tinha 1600 cm³. Por tabela, isso beneficiou a Kombi. Logo a GM emplacou o Chevette L, 1.6 a água na mesma isenção. Talvez por ter tração traseira…

    Quatro Rodas Março de 1993
    Quatro Rodas – Março de 1993 (Divulgação/Quatro Rodas)

    Mas vale adiantar: apenas cerca de 46.000 unidades do Fusca Itamar foram fabricadas entre agosto de 1993 e junho de 1996, cerca de 1.300 carros por mês.

    A seguir, uma crítica do jornalista Bob Sharp, então editor especial, àquela empreitada da Volkswagen publicada na Quatro Rodas de março de 1993 com este mesmo título:

    10 motivos para você não comprar um Volkswagen Fusca

    Pobre do país que precisa de heróis… e da indústria automobilística que vive de palpi­tes. Por sugestão do presidente Itamar Fran­co. a Autolatina relançará o Fusca! Estará de volta em agosto o mesmo carro que saiu de pro­dução em 1986, já decadente em vendas, sob a justificativa de que “às vezes o avanço tecnoló­gico de uma empresa não está no que ela faz. mas no que deixa de fazer”. Palavras da Volkswagen. Se o contrário também vale, então viva o retro­cesso!

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    volkswagen_fusca
    (Divulgação/Volkswagen)

    Argumentos económicos discutíveis à par­te, manifestações de amor ao Fusca idem, vamos analisar o retorno desse automóvel nascido em 1936 apenas sob o ponto de vista do motorista. QUATRO RODAS vê o Fusca como uma rica peça de museu, não mais como um carro que deva ser recolocado nas ruas. Por isso, reunimos aqui dez motivos para você não comprar um Fusca.

    1 – Olha a curva! Olha a curva!

    Se meu Fusca falasse, ele ia dizer que não gosta de fazer curvas. Começa pelo enorme diâmetro de giro para o seu porte: 11 metros! Sua estabilidade é precária em todas as situações, em função principalmente da suspensão traseira que acompanha o veículo há 57 anos (!), com semi-eixos oscilantes. Até a Kombi abandonou esse sistema, em 1976. O Fusca é decididamente trai­çoeiro. principalmente em piso molha­do. Curioso é que essa suspensão foi abandonada na produção alemã em 1972, mas ficou no Brasil até o fim — e será ressuscitada agora.

    volkswagen_fusca
    (Reprodução/Internet)

    Outro proble­ma do Fusca é a sensibilidade aos ven­tos laterais, fazendo o carro balançar de maneira assustadora ao cruzar na estra­da com um veículo pesado. A solução seria reformular a suspensão traseira e adotar pneus mais largos. O “novo” Fusca, contudo, usará pneus radiais 155 SR 15, sem câmara, em lugar dos obso­letos pneus diagonais. No futuro, quem sabe, ganhará pneus 175/70 SR 15.

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    2 – Cara a cara com o para-brisa

    Se existe um carro que deveria ter airbag, esse carro é o Fusca. Afinal, a cabeça do motorista fica a apenas 40 cm do para-brisa (no Monza, por exem­plo, a distância sobe para 80 cm). Evi­dentemente, o carrinho da Volkswagen não virá equipado com esse dispositi­vo tão caro. O cinto de segurança não é totalmente eficiente nesse caso, embo­ra seu funcionamento previna choques da cabeça na maioria das situações.

    volkswagen_fusca
    (Reprodução/Internet)

    Não adianta tentar recuar o banco, pois isso deixaria o passageiro de trás sem espa­ço para as pernas. Outro problema é a localização do tanque de combustível na dianteira, próximo à zona de impacto. Em nome da segurança, os tanques de­vem ficar no meio do veículo, para re­duzir as chances de ruptura numa bati­da de frente ou de traseira.

    3 – Afinal, o que se passa lá fora?

    volkswagen_fusca
    (Reprodução/Internet)
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    Tudo bem. o Fusca é um sucesso no México, o único país onde ainda é produzido, mas vale lembrar que lá esse carro tem até injeção eletrônica single point. E a carroceria do modelo mexicano é diferente da versão bra­sileira num aspecto fundamental: a área envidraçada.

    O Fusca que roda naquele país corresponde à evolução ocorrida na Alemanha nos modelos de 1965, enquanto o nosso é o Fusca ale­mão de 1961 — reformulado há mais de três décadas, portanto. O para-bri­sa ligeiramente curvo e os outros vi­dros de maior proporção melhoram sensivelmente a visibilidade e favore­cem o escoamento de água de chuva, que tende a se acumular no vidro pla­no do pára-brisa do nosso conhecido Fusquinha. Por exigência da lei, ele virá com vidro laminado.

    4 – Mecânica simples também falha

    A simplicidade mecânica decorrente do motor refrigerado a ar também pode pregar suas peças, como o rompi­mento da correia. Não existem radia­dor. mangueiras, vaso de expansão, aditivo, ventilador elétrico ou mecâni­co, interruptor térmico, termostato, junta de cabeçote… enfim, itens que causem uma parada na estrada. Mas o preço dessa simplicidade é um desem­penho ruim com alto consumo de com­bustível.

    volkswagen_fusca
    (Divulgação/Volkswagen)

    Pior ainda: o volume de ar que chega aos cabeçotes e cilindros do motor é muito pequeno em baixas ro­tações, elevando sua temperatura a ní­veis indesejáveis (mesmo não haven­do água para ferver). Além disso, os dois carburadores estão muito longe um do outro e isso dificulta o funcio­namento simultâneo pelas diferenças de dilatação entre motor e conjunto acionador. O Fusca, então, pedirá um mecânico. E, a não ser para mãos e ou­vidos excepcionais, será necessário o auxílio de um equipamento caro, fo­ra de alcance dos proprietários e das oficinas com poucos recursos.

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    5 – Força no pé na hora de frear

    “O carro não tem breque, não tem luz, não tem buzina…” Bem, ter até tem. Mas o sistema de freios do Fusca deixa a desejar pela falta do servo-freio. Mesmo com freios a disco nas rodas dianteiras, o esforço no pe­dal é muito maior do que aquele ao qual nos acostumamos de 1986 para cá. A sensação de que “não vai dar para parar” persegue seus motoristas.

    volkswagen_fusca
    (Divulgação/Volkswagen)

    A Autolatina promete ‘‘considerar” o problema da falta de servo-freio em nome do conforto do motorista. O Fusca apresenta ainda um fenômeno aerodinâmico que só piora essa situa­ção. Quanto maior for a velocidade, menor será o peso na dianteira — e isso causa tendência ao travamento das rodas nas frenagens. Para compli­car. os pedais do Fusca têm articula­ção próxima ao assoalho, e não supe­rior. como em todos os carros atuais. Sua posição nunca foi boa — e hoje parece ser até pior, se comparada aos pedais suspensos.

    6 – Um carrinho beberrão…

    0 Fusca voltará apenas na versão a ál­cool, com motor de 1600 cm³ com 57 cv de potência líquida e dois carburado­res. O motor a gasolina chegará só em dezembro deste ano ou janeiro de 1994, pois precisa se adaptar à lei de emis­sões de poluentes. Com cânister e ca­talisador, ele vai ser um beberrão. Se­gundo a Autolatina, os primeiros testes indicam que o Fusca 93 fará média de 8,8 km/l de álcool na cidade e 11,5 km/l na estrada. Será mesmo?

    volkswagen_fusca
    (Divulgação/Volkswagen)
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    No último teste de Quatro Rodas com o Fusca, em 1986, o modelo 1600 a álcool fez 5,8 km/l na cidade e 10,5 km/l na es­trada. Levando-se em conta que o Gol 1000 a gasolina é o mais econômico dos carros com motor de 1 litro (13,69 km/1 na estrada), vamos a algumas contas, considerando o preço do litro do álcool (Cr$ 7.660) e da gasolina (Cr$ 9.820) no final de fevereiro. Numa viagem de São Paulo ao Rio de Janeiro, um percurso de 429 km. o Gol 1000 gastaria Cr$ 307.726 de ga­solina, enquanto o Fusca consumiria Cr$ 312.965 em álcool. Para um car­ro que se pretende classificar como “popular”, teria de haver uma vanta­gem financeira que não existe.

    7 – Acelera, acelera… e nada!

    Mesmo pesando apenas 800 kg. o Fusca exige muita força de seu mo­tor. Com design dos anos 30, seu coeficiente de resistência aerodinâmi­ca é altíssimo e o desempenho acaba sendo muito ruim. Veja os números do Fusca 1600 a álcool, sem catalisador, testado em 1986.

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    (Divulgação/Volkswagen)

    Velocidade máxima de 135 km/h, aceleração de 0 a 100 km/h em 18 segundos e retomada de 40 a 100 km/h em 31 segundos. São mar­cas equivalentes às dos carros 1000 a gasolina. Compare agora os resultados do Gol CL 1.6 a gasolina: velocidade máxima de 148,7 km/h. aceleração de 0 a 100 km/h cm 14s3 c retomada de 40 a 100 km/h em 33s3.

    8 – Aos trancos e solavancos

    O sistema de direção do Fusca apre­senta duas antiguidades: barras de direção de comprimentos bem diferen­tes e facilidade para surgir trepidação rítmica, também conhecida como shimmy, devido à suspensão dianteira (independente, mas composta de bra­ços arrastados duplos e superpostos). Por isso, o Fusca não pode dispensar amortecedor de direção.

    volkswagen_fusca
    (Divulgação/Volkswagen)

    Quanto ao câmbio, o conforto proporcionado pela facilidade dos engates é prejudi­cado pela alavanca curta, obrigando o motorista a movimentar as costas a cada mudança de marcha para alcan­çar a alavanca. Ah. sim: quando o motor protesta pela baixa rotação (ao contornar uma curva de esquina, por exemplo), existe ressonância no inte­rior do veículo.

    9 – Apertado e barulhento

    Ao contrário dos carros modernos, que são pequenos por fora e espaço­sos por dentro, o Fusca passa a sensa­ção de que é pequeno por fora e menor ainda em seu interior. Isso ocorre por causa das janelas minúsculas. Mas ele realmente é um carro apertado, mal re­solvido.

    Tem dois porta-malas, porém eles não valem por um. Sob o capô dianteiro e atrás do banco traseiro cabem apenas 141 litros. Os braços e palhetas do limpador de pára-brisa chamam a atenção por serem minúsculos. Grande, mesmo, só o ruído interno, principal­mente aquele provocado pela turbina do sistema de refrigeração do motor.

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    (Divulgação/Volkswagen)

    Quando o Fusca deixou de ser fabri­cado, em 1986, o então presidente da Volkswagen do Brasil, Wolfgang Sauer, disse que estava chegando ao fim a produção do “jipe brasileiro” — e como tal esse veículo deveria ser encarado. Não deixa de ter certa razão, devido às características do carro em pisos ruins. Mas não é como jipe que está sendo tratada a volta do Fusca.

    10 – Quanto é mesmo que ele custa?

    Se o brasileiro não tem bons motivos para comprar um Fusca, quando o assunto é preço ele tem menos ainda. A Autolatina e o presidente Itamar se orgulham do fato de o Fusca retornar ao Brasil ao preço de 6.850 dólares (2.055 dólares mais barato que o mode­lo mexicano). A previsão é de que o car­ro “canibalize” apenas 20% do merca­do do Gol 1000.

    Sete anos depois de seu desaparecimento, o Fusca voltará 3 797 dólares mais caro. pois naquela épo­ca, com os preços congelados, custava 3.053 dólares, na versão 1600 a ál­cool. A Fiat.com um carro mais moder­no (Mille Electronic), promete cobrar “apenas” 6.500 dólares. Agora, pense: vale a pena pagar quase 7.000 dólares por um carro que tem estribos?

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