Carros híbridos flex são o caminho, mas não a única solução para o Brasil
Brasil investe nos carros híbridos flex e também nos puramente elétricos
Em fevereiro deste ano, o CEO da Stellantis, Carlos Tavares, deu a seguinte declaração: “O Brasil precisa de etanol e não de carro elétrico”. A opinião de um dos mais poderosos executivos da indústria automotiva causou polêmica e provocou uma discussão sobre o melhor caminho para a descarbonização nacional. Antonio Filosa, diretor operacional da Stellantis na América do Sul, afirmou também que “o Brasil tem hoje, por equivalência, a maior frota elétrica do mundo”, citando a captura de carbono promovida pelo plantio de cana-de-açúcar no país.
Com base nessas declarações, é possível dizer que o carro movido exclusivamente a eletricidade não é a melhor solução para o Brasil? A resposta para essa questão não é simplesmente sim ou não, afinal a eletrificação é uma realidade e veio para ficar independentemente da matriz energética ou particularidades encontradas em cada país.
O Brasil traz uma vantagem significativa por ter a maioria de sua energia gerada por fontes renováveis e limpas, em especial por meio de hidrelétricas. E esse é um grande argumento para a viabilização da mobilidade elétrica nacional, porém não podemos ignorar a presença do etanol, que é uma solução brasileira que elimina a emissão de CO2 na atmosfera ao considerarmos toda a cadeia de produção (do plantio até o abastecimento).
Segundo cálculos da Unica, União da Indústria de Cana-de-Açúcar, considerando o ciclo completo do campo à roda – inclui o plantio e a colheita da cana, seu processamento, transporte e distribuição, além do uso nos carros –, um veículo alimentado exclusivamente com E100 (etanol) emite apenas 37 gramas de CO2 por quilômetro (gCO2/km), valor menor do que os 54 gCO2/km de um modelo elétrico recarregado com energia da matriz energética europeia (termoelétrica), e quase igual aos 35 gCO2/km de um elétrico alimentado no Brasil.
O etanol pode ser muito útil na solução de descarbonização encontrada especialmente para o Brasil: o motor híbrido flex. Essa não é uma novidade para nós, afinal a Toyota já usa essa tecnologia no Corolla e Corolla Cross desde 2019, mas só agora ela ganha força com o anúncio que Stellantis e Renault irão fabricar motores híbridos flex no Brasil.
A Stellantis anunciou três propulsores distintos híbridos flex, batizados de Bio-Hybrid. A empresa deve lançar o primeiro modelo híbrido flex já em 2024, um híbrido leve com um motor elétrico que não traciona as rodas.
Já a Renault desenvolve um conjunto 1.0 turboflex híbrido leve para substituir o atual propulsor 1.6 SCe aspirado e que deve equipar inclusive o novo SUV compacto Kardian, mas só em 2025.
A Volkswagen também anunciou que vai investir em motores híbridos flex, inclusive substituindo os atuais motores turbo: 1.4 TSI e 1.0 TSI, que equipam o T-Cross, por exemplo. E eles podem chegar ao mercado também em 2025.
E, para garantir que essa solução é realmente uma realidade, até as chinesas, GWM e BYD, ambas com fábricas no Brasil, anunciaram a intenção de fabricar motorizações híbridas movidas com etanol.
A Toyota fez um estudo que ilustra a eficiência do biocombustível aliado à eletrificação: uma bateria utilizada em um carro elétrico equivale a 53 baterias de um Corolla híbrido flex, ou a seis de um híbrido plug-in. Portanto, 53 Corolla eletrificados abastecidos com E100 evitam a emissão de 1.590 gramas de CO2 por quilômetro rodado.
E como fica o carro elétrico? Já há quem defenda que o veículo híbrido flex não é um caminho intermediário para a eletrificação total, mas, sim, o fim dessa rota, o topo da montanha, a solução.
Mas por que precisamos pensar que existe apenas um caminho para a descarbonização? Em um país de dimensões continentais e com tantas necessidades distintas, o caminho mais acertado não é apenas um.
O carro elétrico também pode ser uma ótima solução para os grandes centros urbanos, por exemplo, e a evolução da tecnologia pode enfim tornar o seu custo de produção mais acessível e finalmente torná-lo mais barato para o consumidor.
E não dá para esquecer que a pegada de carbono de um carro elétrico que roda com energia limpa como a do Brasil é bem menor do que a do elétrico que roda na Europa.
Ao mesmo tempo, a combinação de eletrificação com etanol tem enorme potencial de contribuição para conter o aquecimento global e pode e deve ser uma solução para o nosso país. Ao adotarmos os dois tipos de solução no curto e médio prazo, estaremos na vanguarda da descarbonização e como um país ainda emergente é uma grande vitória para nós.
Isadora Carvalho
Repórter que integra o time de QUATRO RODAS há 11 anos traz nesta coluna os assuntos de maior relevância que merecem atenção.