Grandes Brasileiros: Santa Matilde SM 4.1 tinha estilo e mecânica de Opala
Com o motor Chevrolet de seis cilindros e um acabamento primoroso, ele era a opção para a falta de importados
Em meados dos anos 70, o engenheiro Humberto Pimentel Duarte, um amante de carros esportivos, tinha um Porsche Targa 911S e uma preocupação. Desagradava-lhe a idéia de colocar o carro em risco com o uso diário.
Após amargar um bom tempo na fila de espera de um Puma GTB, o presidente da Companhia Industrial Santa Matilde, fabricante de vagões e equipamentos agrícolas, cedeu aos apelos da filha. Nessa época, Ana Lidia tinha 19 anos e um sonho: produzir um carro.
Pego no momento propício, o pai topou e ambos se debruçaram sobre revistas à procura de boas referências. Daí para a prancheta foi um passo. Com o projeto nas mãos, procuraram o então piloto e preparador de carros Renato Peixoto.
Assim surgiu em 1978 o SM 4.1, um esportivo com bom desempenho e acabamento requintado para ocupar a vaga deixada pelas restrições à importação de automóveis.
O SM 4.1 é um 2+2 (conforto para os passageiros da frente e os de trás que se virem!) com carroceria de fibra de vidro.
Emprestava a mecânica Opala seis cilindros e trazia o conforto do ar-condicionado e do acionamento elétrico dos vidros, sem contar a sofisticação do revestimento de couro no interior. Os freios a disco nas quatro rodas garantiam a segurança do esportivo.
Quem via o SM 4.1, fabricado em Três Rios (RJ), sabia que ao volante estava alguém bem posto na vida – com desprendimento para assinar um cheque de 330.000 cruzeiros, o preço do carro em maio de 1978. Com esse dinheiro quase dava para comprar dois Opala Comodoro seis cilindros, o topo da linha.
Seu desenho não chegava a arrasar quarteirões. A linha de cintura alta e os faróis duplos com o pisca triangular na frente não agradavam a todos.
E embora fosse equipado com o venerado motor Chevrolet 250-S, com 171 cavalos, não era assim um Porsche… Com maior peso (1.270 quilos contra 1.210), ele perdia em desempenho para o Opala SS-6.
No segundo teste feito por QUATRO RODAS (julho de 1979), fez 170 km/h de máxima e 13,1 segundos no 0 a 100 km/h. No segundo ano de vida, apresentava significativos progressos em relação ao modelo anterior.
Na reportagem, o editor Claudio Carsughi elogiou a melhora no acabamento: o ar-condicionado embutido no painel foi saudado, assim como a correção na posição dos cintos retráteis. A dificuldade de manter a trajetória nas retas em velocidade, relatada no primeiro teste, foi sanada com nova calibragem de suspensão.
O ano de 1984 reservou surpresas para os fãs do SM 4.1. Assumindo o perfil três volumes, o porta-malas cresceu e houve aumento da área envidraçada na traseira, melhorando a visibilidade.
Mas a grande novidade era a versão conversível. Vinha com duas capotas, uma de lona e outra rígida, de fibra, semelhante ao sistema adotado pelo Mercedes SL.
Para entender o carisma do SM 4.1 é preciso andar nele. Foi isso que percebi ao dirigir o modelo 1984 que você vê nas fotos.
Começa pela boa posição de dirigir e pelo conforto do banco de couro. À frente, o painel envolvente recheado de instrumentos fecha o cerco em torno do motorista.
Ao acelerar o seis cilindros fica claro que hoje o carro não mantém o mesmo compromisso com o significado “esportivo”. Mas a elasticidade do motor e sua força em baixa rotação proporcionam prazer na condução do carro.
A direção responde rápido, mas o câmbio, nem tanto: bem que poderia ser aquele dos primeiros Opala de quatro marchas…
O que impressiona até hoje é o rodar silencioso. Em nenhum momento ruídos estruturais lembram tratar-se de uma estrutura de fibra.
Também experimentei a versão conversível, que confirmou a boa construção: o carro quase não torce e seus ruídos se resumem aos típicos de um sem-capota. Equipado com o motor 250-S, o conversível se mostrou mais “vivo” nas arrancadas que seu irmão.
O SM 4.1 atravessou os anos 80 como símbolo de carrão. Mas as boas vendas não conseguiram rebocar a fábrica de vagões, em sérias dificuldades no final da década.
Sua produção se encerrou em 1988, com poucas unidades feitas sob encomenda até 1990. Com a atividade reduzida e focada no ramo ferroviário, a fábrica ainda atende a pedidos de algumas peças, segundo a própria Ana Lidia, a “mãe” do SM 4.1.
* Reportagem originalmente publicada em novembro de 2002