Brasil tem um carregador para 19 carros elétricos – e isso pode piorar
Elétricos poderão representar 10% dos carros em circulação no Brasil em 2030, mas haverá infraestrutura para garantir esse crescimento?
Mercados como Europa, Estados Unidos e China vivem um processo de descarbonização que dependerá mais dos carros elétricos. No Brasil, a tendência é que os carros elétricos conquistem seu espaço, enquanto os híbridos flex terão maior adesão.
Ainda assim, a implantação de infraestrutura de recarga de carros elétricos será fundamental no Brasil. E, hoje, é carente de maiores investimentos.
O mercado brasileiro passou a aceitar melhor carros elétricos apenas em 2023, quando teve um aumento significativo nas vendas, que continua conforme aumenta a oferta de modelos mais competitivos. O Dolphin, que foi o elétrico mais vendido no ano passado, poderá perder a liderança de 2024 em breve para o Dolphin Mini, que custa R$ 34.000 mais barato.
Em 2023, as vendas de carros elétricos representaram pouco mais de 1% entre todos os carros vendidos no Brasil. Pode parecer pouco, mas representou um aumento de 128%. Foram 8.458 carros em 2022 contra as 19.310 unidades vendidas em 2023.
Isso se deve muito aos incentivos que o governo ofereceu (a isenção do imposto de importação, por exemplo, que acabou) e também à ofensiva de novas marcas, como a BYD e a GWM. Ambas fomentaram o mercado e reduziram muito os valores antes cobrados por carros elétricos e híbridos.
Para este ano, segundo a Anfavea, a expectativa é de que as vendas de elétricos fiquem próximas de 24.000 unidades. É um crescimento possível para um segmento onde recordes de vendas são, ao menos por enquanto, constantes.
Mas, por enquanto, a infraestrutura de carregamento não acompanha a demanda. E quem já chegou em um estabelecimento, como shoppings e supermercados, e não encontrou um carregador desocupado sabe bem disso.
Carros elétricos representarão quase 10% da frota até 2030
O crescimento da frota de carros elétricos do Brasil será exponencial. Hoje, de acordo com a Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE), há 78.000 veículos elétricos rodando pelas ruas do país. Destes, 40.601 são veículos elétricos leves ou carros de passeio.
O total deverá passar dos 100.000 até janeiro de 2025, considerando a projeção da Anfavea. De acordo com a consultoria Bright, hoje os EVs representam 2% da frota circulante brasileira e essa proporção crescerá para 3,3% em 2025 e para 5,6% em 2027 e 9,8% em 2030.
Mas, apesar desta projeção de crescimento ser boa, há um grande impasse no meio do caminho: a rede de carregadores públicos.
Atualmente, segundo a Bright Consulting, há 4.230 unidades de carregadores públicos disponíveis no Brasil e a grande maioria se concentra apenas no estado de São Paulo (1.121). Essa infraestrutura atual seria o resultado de um investimento de R$ 77,8 milhões.
Fazendo uma conta rápida, se considerarmos todos os veículos elétricos que já rodam no Brasil, há 1 carregador para quase 19 veículos elétricos. Fechando a conta apenas ao automóveis, dá cerca de 9 carros para cada carregador. E nem sequer estamos considerando os híbridos plug-in (PHEV), que podem utilizar a mesma infraestrutura de carregamento.
Isso fica ainda mais alarmante quando levamos em conta de que carregadores rápidos, do tipo DC, representam uma minoria. Reduzindo a amostra aos carregadores que têm 150 kW, existem apenas algumas poucas dezenas espalhadas pelo Brasil por enquanto. A maioria dos carregadores públicos do Brasil são do tipo AC e com até 22 kW – sendo que a maioria dos carros aceita até 11 kW em AC.
Custará caro manter a mesma proporção entre carros e carregadores no futuro, considerando o crescimento das vendas de carros elétricos: cerca de R$ 4,5 bilhões, para garantir uma rede com 160.861 carregadores públicos até 2030. Isso, contando que os carros elétricos representarão quase 10% da frota brasileira até lá. Será um grande investimento só para não piorar a relação entre carros e carregadores.
Mesmo assim, serão carregadores lentos em sua maioria. O custo de um carregador de 150 kW, capaz de levar a maioria dos elétricos de 20 a 80% da carga em menos de 1 hora, pode superar R$ 1 milhão.
Por isso sempre reforçamos a importância de os proprietários de carros elétricos e híbridos plug-in terem meios de recarregarem seus carros em casa. Isso evita a busca por carregadores públicos no dia a dia. Em casa, não tem problema se a recarga completa vai demorar uma noite inteira. Quem mora em prédios mais antigos, porém, dificilmente consegue instalar um carregador.
Alguns recentes investimentos, como os da Sheel e do Graal, ambos em parceria com a BYD, vão dar um suporte maior já nos próximos anos com os 600 carregadores rápidos que serão instalados até 2027. Mas, ainda assim será insuficiente para comportar o mercado.
Os carregadores rápidos públicos são providenciais em rodovias e em pontos onde a rotatividade rápida dos carros recarregando é necessária. E são fundamentais para ter uma boa experiência com um carro elétrico em contextos mais amplos. Isso realmente deveria ser uma enorme preocupação para toda fabricante que vende carros elétricos no Brasil, tanto quanto a capilaridade de sua rede de concessionárias.
E, embora não exista a expectativa de que governos instalem carregadores rápidos pelo Brasil, justamente por causa do custo, é fundamental que as empresas de energia disponibilizem infraestrutura. Não são raros os carregadores com potência limitada pela rede elétrica do local.
Na cidade de São Paulo, por exemplo, a implementação de frota de ônibus elétrica não avança pela falta de infraestrutura nas garagens e redes de distribuição da Enel. A cidade espera chegar ao fim do ano com 2.600 ônibus elétricos circulando, mas há apenas 84 em operação – deveriam ter chegado a 600 em 2023.
Nos próximos anos, muitos brasileiros terão a experiência de adquirir seus primeiros carros híbridos e elétricos. É preciso cuidar para oferecer a infraestrutura necessária para que não fiquem frustrados com tal mudança.