Quem ama carros torce pela diversidade de modelos, versões e ofertas de acessórios, mas precisa encarar uma realidade ligeiramente diferente. A indústria automotiva já entendeu que simplificar é mais lucrativo e, tão importante quanto, que uma receita pode ser aplicada com sucesso de maneiras levemente distintas.
Esse case pode ser exemplificado com a Chevrolet, que compreendeu o gosto do brasileiro por versões com visual esportivo, ainda que nada mude em termos mecânicos. Deu certo com o Onix RS, relativamente certo com o Equinox e o Cruze RS e os frutos do Tracker RS logo devem surgir. Dessa forma, há motivos para acreditar na estratégia adotada com a nova Montana RS.
Picapes esportivadas eram incomuns até então, mas reforçam a tendência do consumidor nacional de comprar caminhonetes mais pela carroceria atraente do que pelas capacidades de carga ou de encarar trilhas. As peculiaridades do segmento, entretanto, fizeram da Montana mais atrevida o primeiro RS topo de linha no Brasil: ela chega por R$ 151.890, logo acima da versão Premier.
A tática encontra ecos na concorrência, afinal de contas a Ram Rampage aposta na versão R/T e a Fiat Strada logo ganhará variante turbo, também com apelo na velocidade e emoção. A Montana RS é quase uma versão preventiva.
Tudo parece um grande pacote opcional. Por fora, o jeito mais fácil de identificá-la e observando a grade, que ganhou novo padrão, em forma de colmeia, e o emblema RS elegantemente assimétrico. As máscaras nos faróis full-led contribuem para o charme mas não vai muito além disso.
A unidade do vídeo é preta, e isso disfarça outros atributos exclusivos da versão, como os retrovisores, emblema da Chevrolet e rack de teto em preto brilhante. Também disfarça um pouco a régua negra na traseira da Montana, onde só há o emblema RS como diferencial. Para que a lista de novidades não ficasse muito curta, a GM ainda acrescentou novo acabamento às rodas de aro 17 e rack de teto próprio — pesquisas mostraram que o comprador da Premier sempre adquiria o acessório à parte, de modo que agora ele é oferecido como uma “cortesia paga”.
Se a ideia de um modelo esportivado envolve exibir seu visual, é uma notícia agridoce que as mudanças mais notáveis estejam por dentro. Na cabine, os bancos em tecido que imita couro ganharam novo padrão com furinhos e costura vermelha.
O painel traz uma variante ainda mais chamativa desse tecido, com furos maiores e cordinhas que lembram elásticos usados em mochilas de trekking ou algo assim. A combinação rubro-negra é regra na família RS e, no entendimento da marca, transmite o equilíbrio ideal entre refinamento e agressividade — chique sem ser chato.
Mas é só citar o plástico em alto relevo nas portas e acabam aqui as novidades da Montana RS. Pelo menos, ao contrário do Tracker esportivado, que força o consumidor a abrir mão de recursos tecnológicos em nome do visual, a picape intermediária repete à risca o pacote de equipamentos da Montana Premier, o que é bom.
Entre as comodidades, se destacam o carregador de celular por indução, ar-condicionado digital e chave presencial. O quadro de instrumentos analógico é eficiente, mas já mostra sinais do tempo; a central multimídia de 8” vem sob moldura moderna e traz Android Auto e Apple Carplay sem fio, mas a qualidade imagem e resposta ao toque é fraca.
Itens como a câmera de ré, sensor de estacionamento traseiro e controle de cruzeiro também estão presentes, como se espera em um veículo desse preço.
Eficiente, mas sem emoção
Um vendedor com boa lábia pode usar a proposta esportiva da Chevrolet Montana RS de maneira sagaz.
O motor 1.2 turbo flex de 133 cv e 21,4 kgfm é o mesmo do resto da linha, assim como o câmbio automático de seis velocidades das versões de cima. Normalmente, é uma surpresa negativa como o barulho do três cilindros invade a cabina em acelerações mais intensas — mas isso é ruim para quem gosta de se sentir a bordo de um carro envenenado?
O que é indiscutivelmente “OK”, por outro lado, é a arrancada da picape, que foi de 0 a 100 km/h em 9,9 s no teste da versão Premier, praticamente idêntica a essa.
Desde o início, os engenheiros da General Motors buscaram criar um “SUV com caçamba”, e essa característica segue presente. A posição de dirigir lembra a de um utilitário, e o monobloco demonstra rigidez que a torna mais confortável do que a média.
Atrás o espaço para as pernas não é farto, mas a largura da carroceria ajuda, por exemplo, a evitar que os ombros dos ocupantes se espremam. Há duas saídas USB, mas nada de saídas de ar-condicionado; algo que pode ser encarado como inversão de prioridades para o público mais jovem.
A calibração da suspensão também traz o talento da marca para ajustá-la ao Brasil. Com McPherson na dianteira e eixo de torção na traseira, o conjunto favorece a estabilidade e não tem baques incômodos ou sacolejo desnecessário.
O uso de batentes duplos com rigidez variável contribui, em tese, para um comportamento adequado com a caçamba cheia ou vazia. Pudemos testar o segundo caso e, de fato, surpreende como a parte de trás do carro não parece solta como é comum em caminhonetes descarregadas.
Algo importante, pois na grande parte das vezes um dono de Montana levará pouco peso atrás. A capacidade de carga de 600 kg é adequada, mas longe da tonelada que leva a Fiat Toro. De fato, a ideia é tratar a caçamba como um porta-malas de 874 litros; até por isso há vedação contra água e poeira e vários acessórios que permitem compartimentá-la, levando objetos de diferentes tamanhos e formatos.
No fim das contas, a Chevrolet Montana RS é basicamente uma Montana Premier com um pacote opcional de estilo. Mas se a então topo de linha era responsável por 50% das vendas da picape, não há porque duvidar que a nova Montana mais cara do mercado também venderá bem.
Ficha técnica – Chevrolet Montana RS
Motor: flex, diant., transv., 3 cil., 12V, turbo, 1.199 cm³, 133/132 cv a 5.500 rpm, 21,4/19,4 kgfm a 2.000 rpm (etanol/gasolina)
Câmbio: aut., 6 marchas, tração dianteira
Direção: elétrica
Suspensão: ind. McPherson (diant.), eixo de torção (tras.)
Freios: disco ventilado (diant.), tambor (tras.)
Pneus: 215/60 R17
Rodas: liga leve, 17’’
Peso: 1.310 kg
Dimensões: comprimento, 471,7 cm; largura, 179,8 cm; altura, 165,9 cm; entre-eixos, 280 cm; caçamba, 874 l, capacidade de carga, 600 kg; tanque de combustível, 44 litros