Só de combustível, a economia de uma hora rodando com o primeiro New Holland T6 Methane Power do Brasil foi de R$ 100. Ao mesmo tempo, também evitou que 208 kg de CO2 chegassem à atmosfera.
Tudo porque, em vez de 18 litros de diesel (sob o custo de R$ 110, ou R$ 6,11 o litro), seu motor queimou 10 m³ do biometano produzido com… dejetos dos milhares de porcos criados na própria Fazenda São Francisco, em Brasilândia (MS), ao custo de R$ 1 por metro cúbico. É um processo que precisa de muita sujeira para ser viável, mas que no fim do dia é muito limpo.
Tecnicamente, o T6 Methane Power é semelhante a um caminhão a gás ou automóvel convertido. Isso significa que há uma série de mudanças mecânicas na comparação com os T6 convencionais, a diesel.
Seu motor é um FTP N67 NG, um seis cilindros 6.7 que aproveita bloco e grande parte dos componentes da versão a diesel (mantendo, inclusive, os custos de manutenção), mas tem cabeçote exclusivo com local para as velas e os injetores de gás, necessários para que passe a funcionar em ciclo Otto em vez de ciclo diesel. A taxa de compressão, por sinal, cai de 19:1 para 12:1 e ainda há um catalisador de três vias no sistema de escape.
O rendimento é bom: são 182 cv e 75,5 kgfm, enquanto a versão a diesel mais potente à venda no Brasil tem 132 cv e 59,5 kgfm. O câmbio é semiautomático com 16 marchas comandadas por botões no joystick de potência. A tração nas quatro rodas também é ativada por botão e tem a ajuda do bloqueio eletro-hidráulico do diferencial traseiro e do auto-blocante no diferencial dianteiro, providenciais para andar na lavoura.
As outras diferenças o Methane Power tenta esconder. A caixa na dianteira não é um baú ou lastro, mas proteção para três cilindros de gás que respondem por metade da capacidade de 105 m³. Eles podem ser retirados para o uso de implementos. Há um par de cilindros atrás do eixo dianteiro, na vertical, de cada lado do trator e mais três sob o chassi.
Todos são interligados e têm válvulas mecânicas e eletrônicas de proteção e controle. A válvula de abastecimento fica atrás de uma portinhola na escada de acesso à cabine. É a mesma válvula de carros a gás, porque o abastecimento é feito em uma bomba igual.
Há outras vantagens: um motor de ciclo Otto faz menos barulho, é mais suave e vibra menos. Por sinal, no New Holland T6 a suspensão está sob a cabine, porque o chassi é uma estrutura rígida, o que me desencorajou a buscar a velocidade máxima de 40 km/h – mal passei dos 15 km/h – por causa das irregularidades da estrada de terra.
Mas é uma máquina fácil de operar. Sem implemento, pude arrancar na marcha mais alta e até inverter o sentido do movimento sem parar. Também é muito fácil de manobrar: tem 9,6 m de diâmetro de giro, tanto quanto um Nissan March.
Um trator como esse custa cerca de R$ 1 milhão, ou 20% mais caro que o equivalente a diesel. Mas poder usar um combustível fabricado na propriedade, com esterco, bagaço ou qualquer outro rejeito orgânico ajuda a fechar a conta. Na verdade, até gera créditos de carbono.
A economia e a redução das emissões não vêm só da queima do biometano dentro do motor do trator, mas também do ciclo virtuoso proporcionado pela produção do gás. A decomposição da matéria orgânica por si só gera gases, no qual o metano representa até 60%. Como o metano é quatro vezes mais poluente que o CO2, ele não deve ir para a atmosfera.
De acordo com a New Holland, pelo menos 1.000 fazendas de médio e grande porte no Brasil já têm biodigestores para fazer a decomposição da matéria orgânica e queimam o biogás produzido ali em geradores de energia. O líquido resultante da decomposição, por sua vez, é aproveitado como fertilizante na lavoura, que neste caso é do milho e do sorgo usados na ração dos animais.
Essas fazendas só precisam do equipamento para purificar o biogás e, aí sim, gerar o biometano. Na Fazenda São José são cinco os biodigestores, que enviam o biogás para um reservatório muito parecido, chamado pulmão, e dali ele pode ser usado por geradores ou transformado em biometano.
Esse processo começa com o gás passando por um filtro de carvão ativado (onde o enxofre é retirado), depois é secado, pressurizado e passa por uma membrana que separação o CO2 (que vai para a atmosfera) do metano. O menor equipamento do tipo processa 50 m³ de biogás por hora, produzindo 28 m³ de biometano.
Se o gás entra na máquina por um cano grande, sai pressurizado em um duto estreito e é armazenado em um conjunto de cilindros de 300 m³ – praticamente três abastecimentos do trator. A bomba de abastecimento ligada a eles mostra a economia que se tem ao usar o biometano, que custa apenas 1 real por metro cúbico.
A prioridade é o abastecimento, mas a sobra do biometano vai para um gerador de energia que só queima biometano – mais estável e com menos impurezas que o biogás. Então até a energia do equipamento que produz biometano vem do gás que ele produz. E se a fazenda não dá conta de usar toda a eletricidade disponível, vende a sobra para a rede local. Dá para zerar a conta de luz.
Tudo isso exige investimento. Cada biodigestor custa cerca de R$ 1 milhão. O equipamentos de purificação e abastecimento custaram 1,7 milhão. Isso vai se pagar em até 4 anos, tempo que será reduzido com mais tratores e caminhões usando o biometano.
O impacto financeiro é tão grande quanto o impacto ecológico. Em uma conta conservadora, apenas um T6 a biometano usado por 6 horas diárias ao longo de um ano garante economia anual de R$ 260.000. Quita a diferença do preço da máquina. Mas 460 toneladas de CO2 deixariam de ser liberados no ar, seja pelo aproveitamento do metano, seja por evitar a queima de diesel. Para ter noção, o Citroën C3 1.0 do Longa Duração precisaria rodar 5 milhões de quilômetros com gasolina para emitir tudo isso.
Veredicto
Com um trator a biometano como o New Holland T6, fazendas do Brasil já podem começar a buscar sua autossuficiência e até abrir mão dos combustíveis fósseis.
Ficha Técnica
Preço: R$1.000.000
Motor: biometano, diant., long., 6 cilindros, turbo, 6.700 cm³, 182 cv e 75,5 kgfm a 1.200 rpm
Câmbio: semi-aut., 16 marchas, tração 4×4
Direção: hidráulica
Suspensão: eixos rígidos fixos
Freios: disco em banho de óleo (diant. e tras.)
Pneus: 540/65 R28 (diant.) e 650/65 R38 (tras.)
Dimensões: comprimento, 454 cm; largura, 234 cm; altura, 297 cm; entre-eixos, 264 cm; peso, n/d; capacidade de carga, 10,5 toneladas, tanque de combustível, 105 m³