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Kasinski Prima Electra

As alegrias - e os contratempos - de rodar dez dias sem gastar nem uma gota de combustível

Por Marcelo Brettas
Atualizado em 9 nov 2016, 11h49 - Publicado em 27 jan 2011, 18h27
Kasinski Prima Electra

O contato inicial, meio relutante, foi no condomínio onde moro, em um vaivém de curtos percursos. Confiança ampliada, arrisquei uma ida ao supermercado e uma e outra visita aos amigos que moram perto. Aqui é chegada a hora da primeira confissão, absolutamente previsível: para alguém acostumado a pilotar motocicletas que beiram os 300 km/h, a expectativa de andar a mais ou menos 30 km/h durante dez dias não era das mais alentadoras.

A segunda constatação também é clara: a quantidade de vezes que ouvi o famoso “posso dar uma voltinha?” foi certamente recorde. Se minha resposta clássica sempre é na linha “ah, não dá, não!”, dessa vez assenti com satisfação. Afinal, a reação das pessoas seria um importante componente nesta avaliação. E, convenhamos, os riscos de emprestar um veículo que dificilmente ultrapassa 40 km/h são bem menores.

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Motociclistas experientes torceram o nariz. Os mais radicais nem pestanejaram: “Prefiro uma bicicleta!”. Pilotos como o Rafa Paschoalin, acostumados a levar ao limite as mais potentes motocicletas, precisaram mostrar, meio sem jeito, o nariz do pequeno scooter ralado, após um inesperado encontro com o para-choque de um automóvel. O grande álibi de nosso colaborador/piloto está em duas das características do scooter que testamos, o Kasinski Prima Electra: sua baixa capacidade de esterçamento e um sistema de segurança que impede a aceleração e a frenagem simultâneas. Quem anda de moto bem sabe que esse recurso é fundamental para manobras mais justas e precisas.

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Mas, se é verdade que o silencioso scooter causou ceticismo nessa parcela de usuários mais experientes, também é certo que arrancou sorrisos quase infantis daqueles que se valem de motocicletas apenas eventualmente ou, muitas vezes, nem as utilizam no dia a dia.

Uma tarde, no estacionamento da Editora Abril, em meu voo mais longo com o Prima Electra a partir de casa, quase precisei introduzir um sistema de senhas, tal o número de interessados em prová-la. Editores de diferentes revistas e até integrantes da diretoria, muitos de terno e gravata, rasgavam elogios ao silêncio, ineditismo e desempenho no plano, e disparavam a inevitável pergunta: “Mas é só carregar em qualquer tomada comum e sair andando?” E logo chamavam alguém: “Ó, é elétrica, vem ver que legal!”

Moro a 20 km de distância do prédio da Abril. Naquele dia, havia programado um bate e volta preciso, e pelos meus cálculos não seria necessário carregar as três baterias de chumbo. A ideia era utilizar praticamente toda a autonomia anunciada para o modelo – algo entre 40 e 50 km. Portanto, cada nova volta que os colegas dividiam causava uma apreensão que dava frio na barriga.

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Pouco antes, ao sair de casa, o scooter estava com as baterias a pleno, após terem sido carregadas por bem mais do que as 5 horas regulamentares durante a noite anterior. É bem verdade que eu poderia tê-las recarregado durante o período em que estive na editora, mas o risco fazia parte do teste.

Na ida, com pouco trânsito e trafegando grande parte do trajeto por uma movimentada estrada, precisei utilizar minha experiência de ciclista, com escapadas estratégicas pelo acostamento e pilotando o tempo todo com um olho no retrovisor e os ouvidos aguçados, missão facilitada pela baixa emissão de ruídos do veículo.

Na volta, paguei o preço pela generosidade com que distribuí “sins” no estacionamento! Horário de pico, trânsito carregado. Até que o trecho inicial foi de um tipo sádico de prazer, passando silenciosamente entre os carros parados no congestionamento paulistano de todo dia, tão lentamente e relaxado que era possível observar as expressões tensas dos motoristas. Logo vieram os primeiros trovões e a chuva. A baixa velocidade não permitiu chegar ao próximo viaduto para vestir o abrigo de chuva. Molhado estava, molhado fui adiante.

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Não demorou para o pequeno scooter revelar mais uma de suas facetas. Diferentemente dos veículos a combustão, ele não sofre pane seca. A carga das baterias vai se esvaindo aos poucos – e a força do motor também. As subidas passam a ser intermináveis e, em uma delas, faltando cerca de 2 km para chegar ao destino, me vi obrigado a descer e dar aquela força, empurrando com os pés pesados pela água que seguia caindo. Subi a rua de casa, que não pode exatamente ser chamada de subida, relembrando os tempos do patinete: com os dois pés alternando impulsos – e me censurando. “Mas por que raios fui deixá-los dar tantas voltas?”

ELETRICIDADE EM ALTA A Kasinski não está sozinha no segmento. Enquanto as primeiras unidades do Prima Electra são produzidas em Manaus, a MotorZ faz scooters elétricos em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. E a italiana LEM anuncia para março a fabricação em Itajubá (MG) do elétrico E-Max 90S, já importado.

Além das três pioneiras, outras marcas estão em fase de homologação ou implantação. Enquanto a autonomia dos acumuladores não melhorar, os veículos elétricos impõem limites a seus usuários. No Rio de Janeiro, existem estudos avançados para a implantação de postos para cargas rápidas nas baterias. A Kasinski deve instalar no Rio uma fábrica de motociclos elétricos. Além do Prima Electra, bicicletas elétricas, um miniscooter (hoje produzidos em Manaus) e, em breve, motocicletas mais potentes serão cariocas. Segundo especialistas, nesses postos, o tempo de carga total das baterias pode ser reduzido de 5 horas para cerca de 20 minutos. A Kasinski planeja ainda a produção e implantação de postos de recarga solares, principalmente nas regiões que não utilizem matrizes energéticas tão limpas como a hidrelétrica.

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Nas medições, o Prima Electra, com seu motor de 2000 watts de potência, levou 4,3 segundos para acelerar de 0 a 30 km/h, atingindo a velocidade máxima de 43,8 km/h. Apenas por curiosidade aferimos seu desempenho em declive, onde o pequeno scooter evoluiu até quase 70 km/h. Dispensamos a aferição em subidas, onde a velocidade pode oscilar de 30 km/h a menos de 5 km/h, dependendo da angulação do aclive.

O fabricante informa que o gasto na conta de luz de uma carga completa das baterias de chumbo que o equipam é de cerca de 1 real. Transformando tudo para o custo atual da gasolina, podemos projetar que seu gasto seria o correspondente ao de um veículo que percorre 100 km com 1 litro de gasolina. Scooters elétricos mais modernos, com baterias de lítio, estão apregoando o dobro dessa distância pelo mesmo custo.

É certo que forçamos o Prima Electra. Seu objetivo são pequenos percursos em cidades planas. No uso idêntico ao de um scooter a gasolina de pequena cilindrada, a baixa potência, as rodas pequenas, suspensão limitada e mesmo a baixa ergonomia dos comandos são insuficientes. A sensação é a de anos atrás, quando surgiram os primeiros “tijolos” da então revolucionária telefonia celular, com alcance restrito, ligações precárias e baterias efêmeras.

Hoje, é aceito que o foco principal dos usuários de scooters elétricos não está na performance e tampouco na economia imediata de alguns reais. São pessoas afinadas com sustentabilidade e com um processo de mudanças, em que atitudes pessoais passam a ter relevância global. A busca por novas matrizes energéticas é algo irreversível – e o planeta agradece!

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