Tucker 48 era o carro do futuro há quase 80 anos, mas fracassou
Projeto audacioso do norte-americano Preston Tucker, o Tucker 48 teve apenas 51 unidades produzidas e a terceira está em museu brasileiro

Muita gente chama esse carro de Tucker Torpedo, mas este foi o nome dado a um protótipo. A realidade é que o primeiro carro da Tucker Corporation foi lançado e começou a ser encomendado antes mesmo de existir. O carro chama-se Tucker 48 e uma unidade em perfeito estado agora faz parte do CARDE Museu, em Campos do Jordão (SP).
QUATRO RODAS foi até lá conhecer este carro que foi revolucionário no seu tempo e até hoje é lembrado por ter uma história extremamente conturbada. Uma história que começou a ser escrita por ter sido lançado antes mesmo de existir.
Passada a Segunda Guerra Mundial, os aviões, tanques e caminhões feitos pela Tucker Aviation Corporation perderam espaço. Seu proprietário, Preston Tucker, passou a dedicar seu esforço e tempo a criar um carro grande, baixo, seguro, rápido e com boa aerodinâmica.
O primeiro emprego de Preston havia sido como office-boy da Cadillac, depois vendeu carros, teve uma concessionária Packard e aos 30 anos era diretor comercial da Pierce-Arrow – que faliu em 1938.

Preston começou a pensar no novo carro ainda durante a guerra, quando a indústria automotiva norte-americana estava estagnada por causa do esforço de guerra. Quando a guerra acabou, porém, o mercado estava ávido por novidades e os veteranos de guerra, ansiosos para usar seu dinheiro.
Entre 1944 e 1948, diversos designers e estúdios se envolveram nas linhas do carro da Tucker, sendo que o carro foi apresentado pela primeira vez em junho de 1947. O evento na fábrica, em Chicago, inclusive, foi um fiasco porque o carro teve uma série de defeitos desde a véspera, era muito barulhento e parecia se esforçar muito para andar.
O carro apenas não estava pronto. Na verdade, nunca esteve pronto.
Com alguns protótipos funcionais montados, Preston Tucker passou a rodar os Estados Unidos para apresentar seu carro. Havia uma série de características inovadores no seu carro.
- Cabine toda acolchoada – inclusive à frente dos caronas
- Todos os comandos do carro ao alcance das mãos do motorista
- Pneus sem câmara autovedantes
- Suspensão independente sem molas (usava um sanduíche de borracha)
- Chassi preparado para suportar impactos laterais
- Barra de proteção no teto
- Para-brisa laminado projetado para saltar para fora em colisões
- Farol central direcional

O carro também seria o primeiro carro com freios a disco e teria injeção mecânica e comandos de válvula hidráulicos, mas foram retirados dos carros de produção.
Para garantir o dinheiro que seria demandado para o desenvolvimento do seu carro, Preston Tucker já havia negociado ações na Bolsa e vendido representações da marca pelo país, mas ainda precisava de mais dinheiro.
A inovação foi o Tucker Accessories Program, que vendia acessórios do carro, como capas de banco, rádio e até malas, àqueles que já estavan na fila. Quem comprava os acessórios também avançava para o início da fila de espera pelo carro.

Àquela altura, quem tinha prioridade em receber carros eram os veteranos de guerra. Com a venda de acessórios, quem não era veterano de guerra também poderia se tornar um cliente prioritário e isso levou a uma investigação por parte da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, que tornou-se um escândalo.
Em paralelo, também o acusaram de mentir em uma publicidade onde dizia que o carro da Tucker havia sido desenvolvido por 15 anos. Os executivos da Tucker Corporation chegaram a ser acusados de fraude, maculando a imagem da empresa.
Não faltavam problemas à Tucker. Enquanto teorias conspiratórias culpavam as grandes fabricantes norte-americanas (Chrysler, GM e Ford) por supostamente sentirem-se ameaçadas pelo carro de Preston Tucker, o empresário também precisava contornar a falta de uma mecânica adequada às suas promessas. Afinal, ele havia se comprometido em lançar um carro com pelo menos 150 cv.

O primeiro protótipo, chamado Tin Goose, tinha motor 9.6, que estava sendo desenvolvido pela própria Tucker e que dependeria de conversores de torque em cada uma das rodas traseiras. Refinar este conjunto, contudo, demandaria muito tempo e Preston, então, foi ao mercado em busca de soluções prontas.
Primeiro, tentaram colocar um motor Lycoming, de avião, na traseira do Tucker. Não coube. Depois, recorreram a um motor de seis cilindros contrapostos 5.5 refrigerado a ar que era usado em helicópteros da Bell, o Franklin O-335 da Air Cooled Motors. Preston comprou a empresa (que detinha 6% do mercado de motores de helicóptero) e dedicou sua operação à fabricação de motores para seus carros.

Havia um detalhe: esse motor foi convertido para ser refrigerado a água e extensamente modificado para ser aplicado em um automóvel. Chegou aos 168 cv e 52 kgfm, mas não havia um câmbio adequado a este motor, por estar montado na traseira do carro, atrás do eixo. Também não teriam tempo de criar um novo câmbio.
Alguém, porém, lembrou que o Cord 810/812 da década anterior, o primeiro carro norte-americano de tração dianteira, tinha um câmbio de quatro marchas com trocas feitas por meio de um sistema de eletrovácuo.
Este câmbio ficava à frente de um V8 e agora ficaria à frente do motor boxer do Tucker. Mas não havia produção deste câmbio há muito tempo, até porque não era confiável. Mas casou bem com o motor do Tucker, após alterações que corrigiam alguns dos problemas deste câmbio.

Funcionários da Tucker, então, percorreram os Estados Unidos em busca destas transmissões dos Cord para fazer seu recondicionamento. Encontraram 22 delas para garantir o início da produção, após alongarem suas relações, melhorarem o sistema de vácuo e eixos. Mas os problemas no sistema de eletrovácuo no sistema de trocas de marcha nunca foram resolvidos, não deu tempo.

A Tucker chegou a produzir 58 chassis e carrocerias. Destes, 36 unidades do Tucker 48 chegaram a ser produzidas antes do fechamento da fábrica. Outras 14 foram montadas por alguns funcionários antes da venda dos ativos da empresa, chegando a 50 carros prontos. Um foi parcialmente montado. Duas unidades (um deles, protótipo do modelo 1949) tiveram chassi e carroceria montados, mas o destino deles é desconhecido.
Tucker no Brasil
A derrocada na história do Tucker 48 não parou Preston Tucker. Ele veio ao Brasil no início de 1950 com a ideia de fabricar carros no país. Seria uma linha de carros. Estabeleceu um escritório em Copacabana, no Rio de Janeiro, e passou cerca de cinco anos discutindo com políticos e investidores a ideia de fabricar seus carros.
Um dos carros ganhou forma. Era o Tucker Carioca, um esportivo com as rodas separadas da carroceria que teria motor quatro cilindros com cerca de 100 cv e que teria consumo ao redor dos 11 km/l graças às formas aerodinâmicas.

Ex-governador de São Paulo, Adhemar de Barros revelou interesse no Tucker Carioca e ofereceu incentivos para a produção do carro por lá, mas Preston não quis, pois teria achado a cidade muito fria e úmida. Àquela altura Preston queixava-se de fadiga e, ao retornar aos Estados Unidos, foi diagnosticado com câncer de pulmão. Ele faleceu em 26 de dezembro de 1956, antes que qualquer protótipo do Carioca tenha sido produzido.
Até então, o único Tucker 48 do Brasil era um exemplar que chegou ao Brasil em 1949 e que hoje faz parte do Museu Paulista de Antiguidades Mecânicas Roberto Lee, em Caçapava (SP). Esta unidade, além das marcas do tempo, recebeu um motor V8 Cadillac nos anos 1950. Mas, dada a relevância do carro, existe um monumento ao carro na cidade.

A unidade que acaba de chegar ao Brasil é a #1003, a primeira com os para-lamas traseiros definitivos, e que pertenceu à coleção de George Lucas, criador de “Star Wars” e “Indiana Jones” e produtor executivo do filme “Tucker, um homem e seu sonho” (1988)..
Esta unidade foi comprada em leilão no Concurso de Elegância de Pebble Beach no ano passado por cerca de 2 milhões de dólares, e veio ao Brasil para integrar o acervo do CARDE. O carro vem em regime de importação temporária e ficará no Brasil por cinco anos antes de retornar aos EUA. Depois, poderá voltar ao Brasil em novo regime de importação temporária.