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Parar uma fábrica de carros é bem mais difícil e demorado que você imagina

Processo pode demandar até duas semanas de planejamento para manter integridade do maquinário e não pegar fornecedores de surpresa

Por Leonardo Felix
Atualizado em 24 abr 2020, 12h05 - Publicado em 13 abr 2020, 07h00
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  • Fábrica da FCA em Goiana (PE) (Divulgação/Jeep)

    A pandemia do novo coronavírus criou, pelo menos na indústria automotiva nacional, um cenário imaginado apenas por loucos como Raul Seixas na canção O Dia em que a Terra Parou.

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    São 63 fábricas e 123.000 funcionários totalmente parados desde o início de abril, numa ação em cadeia que afeta ainda 250.000 trabalhadores da cadeia de fornecedores e 350.000 das redes concessionárias.

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    Isso sem falar em outras de áreas correlatas, o que perfaz um total acima de 1.000.000 de pessoas com as atividades profissionais parcial ou totalmente paralisadas.

    Inicialmente prevista para durar uma semana, a paralisação completa das atividades tende a se estender até o final de abril, com retorno gradual das operações durante a primeira semana de maio.

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    Carros só devem voltar a passar pelas linhas de montagem em maio (Divulgação/Volkswagen)

    Embora pareça orquestrada, a interrupção conjunta das fábricas de carro instalados no Brasil ocorreu a toque de caixa e envolveu árdua negociação com fornecedores, pressão de sindicatos e muita, muita dor de cabeça.

    Isso porque se engana quem acha que, para promover uma paralisação fabril, basta apertar um botão e desligar as luzes. Pelo contrário: o processo está longe de ser simples e demanda uma série de rituais e preparativos.

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    “Não é algo que dá para fazer em um dia apenas, muito menos em uma hora”, afirma Henry Joseph Jr., diretor técnico da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), que por 37 anos trabalhou como engenheiro da Volkswagen.

    E olha que a tecnologia dos tempos atuais joga a favor. “No passado, o processo era mais vertical e havia áreas muito complicadas, como fundição, forjaria e produção de plásticos, que hoje são terceirizadas e demandam de sete a dez dias de preparação até serem interrompidas”, explica o especialista.

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    As áreas mais complexas

    Resfriar caldeiras que ajudam a gerar energia é um dos maiores desafios (Divulgação/Chevrolet)

    Mesmo assim, continuam a existir áreas do processo que demandam cuidado e movimentações gradativas para que não entrem em colapso.

    “Ainda há empresas que geram sua própria energia com caldeiras e fornos, e também usando de vapor de água, o que requer cuidados. São necessários dias para o resfriamento e a redução gradual da transmissão dessa energia”, comenta.

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    Outro setor delicado é o de pintura, porque envolve o bombeamento constante de tintas. “Se você paralisa de uma vez, as tintas secam e entopem todos os dutos”, esclarece o engenheiro.

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    A área de pintura é uma das que mais demandam cuidado (Divulgação/Jeep)

    No caso específico da pintura, é preciso levar em consideração o tempo de “hibernação”, para saber se compensa forçar sua parada ou manter os dutos ativos mesmo com a produção interrompida. Neste último caso, a tinta bombeada tem de ser, obviamente, armazenada.

    “Se parar, será preciso fazer uma limpeza periódica dos dutos com solventes, algo que demora de um a dois dias para ser concluído. conta o diretor técnico da Anfavea.

    Como não poderia deixar de ser, a limpeza requer muito cuidado para não contaminar as tintas com solventes.

    Robôs modernos já são capazes de se auto lubrificarem (Divulgação/Volkswagen)

    Também demandam atenção os robôs, que têm de ser lubrificados constantemente. A boa notícia para quem já aplicou o conceito de indústria 4.0 é que máquinas mais modernas já são capazes de se auto lubrificarem.

    Questões logísticas tampouco podem ser ignoradas. Nos dias atuais, complexos industriais trabalham com quantidades cada vez menores de peças armazenadas, a fim de otimizar espaço e custos.

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    Em vez disso, contratam empresas que organizam o recolhimento e reúnem a distribuição dos componentes de diversos fornecedores em cadeia, entregando-os de uma só vez à fábrica todos os dias.

    O conceito é conhecido como “milk run” ou “caminhão de leite”, em menção a um sistema de distribuição de leite aplicado nos Estados Unidos no século 20.

    Interrupção do fornecimento de peças também precisa ser muito bem orquestrada (Divulgação/Jeep)

    “A fábrica terá de avisar seus fornecedores com antecedência, para que estes também tenham tempo de comunicar os seus fornecedores e estes, os seus fornecedores”, afirma Joseph Jr.

    Não podemos esquecer das relações trabalhistas: os funcionários serão colocados em férias coletivas? Regime de layoff? Haverá suspensão de contratos ou dispensas? Tudo tem de ser negociado com sindicatos.

    Portanto, segundo o especialista, não dá para paralisar uma fábrica sem um planejamento de pelo menos cinco dias, que podem se estender a dez ou 15 dias até que tudo esteja devidamente alinhado.

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    “O único modo de não arrebentar nenhum elo da cadeia produtiva é fazer tudo com planejamento, pois uma decisão errada ou afobada pode afetar não apenas a sua empresa, como outra de porte menor que não terá o mesmo capital de giro para se recuperar”, conclui.

    “Condição de guerra”

    Em entrevista a QUATRO RODAS, Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea, afirmou que a interrupção das atividades da indústria automotiva provocará um “impacto muito forte” na saúde financeira dos fabricantes instalados no país.

    Setor ainda não calculou, mas prejuízo com as semanas paradas deve ser bilionário (Divulgação/Volkswagen)

    “Já estamos projetando um segundo trimestre muito ruim, ao mesmo tempo em que temos que continuar pagando salários e fornecedores. É um cenário próximo ao de uma guerra”, alertou.

    Enquanto não houver uma visão mais precisa por parte do governo de como lidar com esse problema, teremos que estar preparados para tudo”, segue.

    Moraes defende que o governo lidere um plano que ajude a aumentar a liquidez das empresas no período.

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    “Precisamos de redução de impostos e estímulo a empréstimos com juros mais baixos para termos capital de giro. Os bancos não estão liberando empréstimos a juros aceitáveis”, aponta o presidente.

    O representante mor da associação diz ser ainda muito cedo para calcular o prejuízo, mas que “o buraco, com certeza, será muito grande”.

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