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A arrancada da indústria automobilística no Brasil

Menos de uma década após a implantação, nossa indústria já era a nona maior do mundo, porém certas escolhas e ações cobrariam seu preço naquele início

Por André Fiori
Atualizado em 28 Maio 2018, 01h07 - Publicado em 29 jun 2016, 20h32

* reportagem originalmente publicada em setembro de 2006

Linha de montagem do VW Fusca
Linha de montagem do VW Fusca (Acervo/Quatro Rodas)

No começo dos anos 50, o Brasil que ria nos cinemas com as chanchadas estreladas por Oscarito, Grande Otelo e Ankito começava a se preparar para o desafio de fabricar carros nacionais.

No dia 23 de março de 1953, num armazém alugado no bairro do Ipiranga, em São Paulo, nascia a Volkswagen do Brasil, ao mesmo tempo em que erguia sua fábrica, em São Bernardo do Campo.

Ela não ficaria sozinha. Logo Mercedes-Benz e Willys-Overland também começaram as obras de suas instalações próximas ao ABC paulista. Tudo motivado por incentivos fiscais em várias esferas.

“Foi semelhante ao que ocorre hoje: imposto baixo, financiamento a perder de vista e isenção de tudo que se possa imaginar”, conta Ricardo Bock, professor do curso de engenharia automobilística da FEI, comparando a guerra fiscal entre estados que se vivenciou no fim dos anos 90. Já em 1954, a Willys produzia o Jeep, enquadrado na categoria de comercial leve.

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O salto do programa aconteceria com o começo do Plano de Metas de Juscelino, com a implantação do GEIA, que já em 1956 (ano em que a frota do Brasil, a maior da América Latina, chegava a 811.121 unidades, todas importadas) estipulava um grau de nacionalização de 40%.

Linha de montagem da perua DKW F91 Universal
Linha de montagem da perua DKW F91 Universal (Acervo/Quatro Rodas)

Índice que o Romi-Isetta, lançado em 5 de setembro daquele ano, bateu com sobras com seus 70% de brasilidade. No entanto, por possuir apenas um banco e uma porta, não era aprovado pelo GEIA, perdendo incentivos.

Somente em 19 de novembro apareceria um carro de passeio que se enquadrava como tal: a perua DKW F91 Universal. Fabricada pela Vemag (Veículos e Máquinas Agrícolas S/A), ela utilizava 60% de peças brasileiras.

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As duas empresas nacionais, que respectivamente produziam sob licenças da Iso italiana e da Auto Union alemã, abriram a trilha que seria seguida pelas fábricas estrangeiras aqui naturalizadas.

Em 1957, seria a vez da Volkswagen iniciar a fabricação da Kombi, um veículo comercial leve. Seu carro de passeio e principal marca registrada, o Sedan (mais tarde oficialmente batizado como Fusca), aportaria no mercado só em 1959.

Linha de montagem da Kombi na Volkswagen, em 1958
Linha de montagem da Kombi na Volkswagen, em 1958 (Acervo/Quatro Rodas)

“Era um clima de euforia. Houve uma confiança crescente no automóvel nacional”, afirma o engenheiro ambiental de segurança Eduardo Burgos, funcionário da Ford há 37 anos e estudioso da história da marca. Mas nem só de bons ventos viveria o mercado.

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Modelos ultrapassados

Os “50 anos em cinco”, o lema de Juscelino Kubitschek, acabariam por resultar num excessivo número de fábricas autorizadas a funcionar, o que teria prejudicado a economia de escala no setor. Em 1964, o Brasil já era o nono produtor mundial, com total de 183.721 unidades. No entanto, a marca não escondia o superdimensionamento da capacidade de produção em relação à demanda.

Nesse mesmo ano, a Willys, por exemplo, registrou produção 46% inferior à que poderia atingir. O recorde negativo ficou com a Simca, que alcançou meros 26% de sua capacidade, conforme o Diário do Congresso Nacional atestava em 5 de setembro de 1968.

Certamente não contribuiu para um melhor desempenho nas vendas o fato de as fábricas terem optado por importar de suas matrizes equipamentos e ferramental de modelos já ultrapassados em seus países de origem, beneficiadas pela instrução 113/55 da Superintendência de Moeda e Câmbio (Sumoc).

Coincidentemente, era a época em que Europa e Estados Unidos iniciavam a renovação de seus parques industriais.

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Isso se refletiu em carros hoje considerados clássicos nacionais, como Simca e Aero-Willys, lançados em 1959 e 1960 respectivamente, ambos com tecnologia já superada. Ainda que beneficiados por um protecionismo e com baixa escala de produção, os pioneiros encontrariam consumidores ávidos por eles, entusiasmo gerado pela própria carência do mercado.

Linha de montagem do Aero Willys no Brasil
Linha de montagem do Aero Willys no Brasil (Acervo/Quatro Rodas)

No início das fábricas, havia dificuldade para contratar trabalhadores especializados, formados num ritmo menor que a demanda. “Creio que o chão de fábrica acabou sendo uma grande escola”, afirma Eduardo Burgos.

Em decorrência da situação, acabou por imperar um clima de união. “Do jardineiro ao gerente-geral, todos os funcionários da empresa se viam como uma grande família.”

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As exigências na contratação da mão-de-obra tinham de ser baixas. Não raro o ensino formal era custeado pelas empresas. Para quem tinha maior escolaridade, a contratação era praticamente certa. “A Vemag era a Embraer da época”, compara o jornalista Bob Sharp ao lembrar dos tempos em que trabalhou no grupo e do fascínio que o setor exercia naquele Brasil bossa-nova.

Quando a indústria começou a demonstrar força, surgiram planos de incentivo à exportação. Mas o movimento em direção ao exterior esbarraria no fato de outros países já desfrutarem de carros mais modernos.

Com a intenção de viabilizar a competitividade de nossos automóveis, em 1966 surgiu a lei 4951, que autorizava fábricas instaladas até outubro de 1965 a importar equipamentos mais novos com isenção de imposto. São frutos desse novo tempo carros como Ford Galaxie e Chevrolet Opala, que seriam lançados no fim da década.

O quadro de fabricantes seria reduzido em 1967, quando a Ford adquiriu a Willys; e a Volkswagen, a Vemag e depois a Chrysler. As duas, junto com a Mercedes e a GM, seriam responsáveis por 95,4% da produção nacional já no ano seguinte.

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