Quando Ayrton Senna venceu lendas da F-1 com um Mercedes em Nürburgring
A mercedes convidou os 20 melhores pilotos para competir com o Mercedes-Benz 190 E com motor Cosworth. Só teve um problema: choveu naquele dia
O pequeno Mercedes 190, lançado em 1982, era para ser um carro desprezado pelos puristas, que acham feio tudo o que não tem caráter superior e tradicional, na marca. Mas seu design foi assinado por Bruno Sacco (chefe de estilo da Mercedes de 1975 a 1999) e teve um “problema” raro para os duas atuais: foi superprojetado.
Conhecido internamente como W201, o Mercedes 190 começou a ser projetado em janeiro de 1974 e ficou pronto no final de 1982. O sedã trazia algumas inovações como suspensão traseira multilink, freios ABS, airbags e cintos de segurança pre-tensionados, além de ser o primeiro modelo da indústria a ter carroceria feita com aços especiais (mais leves) em escala comercial.
Conhecido como Baby-Benz, esse modelo foi um projeto que colocava a Mercedes em um segmento em que a marca não existia, de carros compactos. Quis o destino, porém, que ele se tornasse uma lenda nas pistas.
O 190 foi apresentado em duas versões 190 e 190 E (“E” de Einspritzung, ou injeção de combustível) , equipado com motor de quatro cilindros, 2.0, gasolina, de 90 e 122 cv e pouco tempo depois ganhou uma versão diesel, 2.0 de quatro cilindros e 72 cv.
No ano seguinte, em 1983, a Mercedes adotou uma nova opção de motor, o 2.3 que foi o primeiro 16V da marca. Seu sistema de injeção já era multiponto e o cabeçote foi projetado pela inglesa Cosworth, que fornecia motores para a F-1.
A empresa inglesa criara um cabeçote com duplo comando e quatro válvulas por cilindro para o motor M102 de 2,3 litros. Nascia, então, o belo Mercedes-Benz 190 E 2.3-16. Com injeção eletrônica Bosch K-Jetronic, o sedã ia de 0 a 100 km/h em 7,5 segundos e atingia 230 km/h.
Poucas semanas antes do sedã esportivo fazer sua primeira aparição em público no Salão de Frankfurt, três unidades foram enviadas para o circuito italiano de Nardo, onde percorreram 50.000 km a uma média de 247,94 km/h, quebrando, assim, 12 recordes mundiais de longa duração.
Foi aí que a sorte do Mercedes-Benz 190 começou a mudar.
Com a justificativa de celebrar tanto o início da comercialização do seu sedã quanto a abertura do novo circuito de Nurburgring, com um traçado de 5.148 metros ao lado gigante Nordschleife, com 22 quilômetros de extensão, a Mercedes promoveu uma corrida com 20 unidades do 190 no grid.
O circuito havia sido fechado após Niki Lauda quase ter morrido em um acidente ali em 1976. O piloto austríaco estava nesta reinauguração.
Para pilotar os carros, a empresa convidou estrelas da Fórmula 1 e batizou a prova como Corrida do Campeões. A corrida foi marcada para 12 de maio de 1984.
Entre os convidados: Niki Lauda, Keke Rosberg, Alain Prost, James Hunt, Carlos Reutmann, Jody Scheckter, Jack Brabham, Phill Hill, John Surtees, Alan Jones e Stirling Moss, entre outros.
Fangio não foi. Já estava com 72 anos. E Emerson Fittipaldi cancelou a participação por conta de compromissos às vésperas de disputar as 500 Milhas de Indianapolis, sugerindo que o novato Ayrton Senna tomasse o seu lugar.
Senna havia estreado na F-1, com a Toleman, naquele ano e já somava um ponto na categoria, em seu segundo Grand Prix, que foi em Kyalami, na África do Sul.
No grid, Prost cravou a pole position à frente de Senna e Reutmann. Na primeira das 12 voltas sob garoa, Senna tratou de passar o francês e assumir a ponta, posição em que se manteve até o final, mesmo com os ataques de Lauda, que chegou em segundo.
Prost saiu da pista, voltou e terminou em décimo quinto. E Reutmann ficou em terceiro. A volta mais rápida, porém, foi de Jody Scheckter: 2:12.50 na volta 11.
Hoje o carro que Senna pilotou nesta corrida lendária é um dos mais visitados no museu da Mercedes-Benz, em Sttutgart.
O 190 E 2.5-16 seguiu brilhando nas pistas. Estreou no Campeonato Alemão de Turismo (DTM) em 1985 por equipes independentes. O time de fábrica estreou só em 1988, em parceria com a AMG, na época independente. Respeitando o regulamento, a cilindrada subiu a 2,5 litros, dando origem ao 2.5-16. O aumento no curso do virabrequim resultou em 204 cv e 24,5 kgfm.
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Em 1989, surgiu uma nova versão de homologação, denominada 2.5-16 Evolution, com a mesma cilindrada, porém com pistões maiores e menor curso do virabrequim. Ao todo, 502 unidades foram produzidas para as ruas, caracterizadas por apêndices aerodinâmicos maiores, molduras nos para-lamas e rodas aro 16.
Um ano depois viria o Evolution II, com 235 cv e 25 mkgf. Desta vez, outras 502 unidades ganharam visual muito mais agressivo. Os para-lamas eram alargados para acomodar rodas aro 17 polegadas com pneus 245/40 e a asa traseira estava quase na mesma altura do teto. A máxima era de 250 km/h, com 0 a 100 em 7,1 segundos.
A conquista viria em 1992: levou a vitória em 16 de 24 provas. O 2.5-16 ainda competiu em 1993, mas após dez anos e 50 vitórias na DTM ele por fim deixou a linha de montagem e as pistas para definitivamente entrar na história da marca.