Teste: Ford Maverick híbrida indica que picapes a diesel têm dias contados
Primeira picape híbrida do país se sai muito bem em consumo e aceleração. Para superar concorrentes a diesel, basta um preço mais próximo da realidade
Em um país com vocação agropecuária e distâncias continentais, picapes a diesel são sucesso absoluto, mesmo com a alta desse combustível nos últimos anos. Mas se as caminhonetes híbridas prometem os mesmos benefícios do diesel com ainda mais vantagens, é questão de tempo para que elas dominem o mercado, certo?
Essa premissa começará a ser testada a partir de agora, com a Ford Maverick Hybrid: ela é a primeira picape híbrida do mercado nacional, chegando um ano após após a estreia da picape intermediária em versão 2.0 turbo com tração integral.
Com tração apenas na dianteira e menos performance, a Maverick híbrida mantém algumas virtudes off-road – afinal de contas, a Ford trata com zelo sua fama de picapeira. Por outro lado, a fabricante norte-americana não esconde que esse é um veículo com foco no consumidor urbano, que usa a caçamba como um porta-malas.
Ela chega na mesma versão Lariat da variante a combustão; logo, o pacote de equipamentos é o mesmo. A diferença está no conjunto mecânico, que rende 194 cv e 23,9 kgfm (contra 253 cv e 38,7 kgfm da versão AWD). O preço, entretanto, é rigorosamente igual: R$ 244.890.
Não falta performance, mas também não há o comportamento da versão 2.0; o foco aqui é o consumo: foram 16,3 km/l na estrada e 18,9 km/l na cidade obtidos em nosso teste, sempre a gasolina (não há versão flex). É economia notavelmente superior ao que a Fiat Toro a diesel fez em nosso último teste, no qual cravou 11,3 km/l na cidade e 14,3 km/l na estrada.
JEITO DE SUV
Pioneira no segmento das picapes intermediárias, a Toro é uma comparação óbvia e inevitável com a Maverick, que é ligeiramente maior e um pouco mais baixa que a rival fabricada em Pernambuco. Tais características contribuem para um centro de gravidade mais baixo da picape da Ford, que surpreende positivamente pelo seu comportamento em curvas, no qual inclina pouco.
O curioso é que não há sequer suspensão independente no seu eixo traseiro, mas molas especiais que vieram dos esportivos da Ford e, em vez de exercer força apenas para cima, também conseguem exercê-la para os lados.
A força resultante desse conjunto é inclinada, mas no sentido oposto ao da cabine; assim, mesmo em curvas de alta velocidade, a Maverick tem rolagem comparável à de um bom veículo de passeio, contrastando com as picapes médias em geral.
Outro protagonista do seu comportamento dinâmico elogiável é um reforço estrutural na coluna C, na parede que separa cabine e caçamba, explica o engenheiro brasileiro Klaus Mello, que gerenciou o desenvolvimento global da caminhonete e destaca o fato de essa tecnologia ser patenteada e proprietária.
Dessa forma, compensa-se a falta de teto na parte traseira e a picape não perde a rigidez estrutural bem maior de um monobloco frente à carroceria sobre chassis.
Ainda que a Maverick seja menor que uma picape como a Ranger, sua cabine encaixotada aproveita melhor o volume do habitáculo. Há bom espaço para os ocupantes na picape, tanto à frente quanto atrás. Para os ombros ou para as pernas, o aperto segue inevitável.
Ainda que a Maverick faça bom uso de plásticos texturizados e bem montados, e bancos com tecido premium, o interior peca pela simplicidade de itens como a central multimídia, que não vai além do necessário. Pelo quarto de milhão de reais cobrados, a falta de itens como detector de pontos cegos, carregador de celular por indução e sensores de estacionamento também causam frustração.
DIFERENTES EMOÇÕES
Em uma tendência global de simplificação do seu catálogo, a Ford vem se apegando à boa fama na fabricação de picapes para manter relevância em mercados como o brasileiro. É por isso que a Maverick híbrida, ainda que pensada para quem passa maior parte do tempo na cidade, consegue encarar estradas de terra com conforto e certa habilidade.
A direção é sensível e leve, mas não é problema como a visibilidade do retrovisor esquerdo plano. Por conta dele, é difícil de manobrar a Maverick e a falta de um mísero sensor de estacionamento é pecado difícil de ser justificado, assim como o alerta de pontos cegos inexistente.
Na estrada, é difícil falar que 194 cv é pouco. A bateria é sempre recarregada nas frenagens e, mesmo quando o motor elétrico não tem energia, o 2.5 a gasolina tem 165 cv e 21,4 kgfm que dão conta do recado (a cilindrada incomum se deve ao funcionamento em ciclo Atkinson: altera-se o tempo de abertura das válvulas para maior economia, mas perde-se potência específica).
Além do consumo e aceleração, a manutenção pode ser outro aspecto no qual as picapes híbridas podem superar as concorrentes. A Maverick já conta com um sistema que detecta a qualidade do óleo em tempo real, definindo seu ciclo de revisão a partir disso. Modelos híbridos plug-in terão a vantagem de poupar freios com frenagem regenerativa e diminuir problemas ao eliminar o cardan, por exemplo, com uso do motor elétrico em um eixo e o térmico em outro, provendo tração integral mesmo assim
Também há câmbio e-CVT, que utiliza engrenagens planetárias no lugar de correia e não traz marchas simuladas, com rotação constante que pode incomodar. O motor elétrico traciona sozinho a picape em baixas velocidades, além de ajudar em retomadas; são 8,9 s para ir de 0 a 100 km/h, mostrando que a união funciona bem, e, com exceção do câmbio, não há maiores frustrações na condução.
No fim das contas, a Maverick híbrida chega a superar sua irmã esportiva em testes de retomada, graças ao torque instantâneo. O ruído interno também é menor, o que só acrescenta à sensação geral de mais conforto, típica de um veículo eletrificado.
Com uma estratégia de vendas diferente, no qual as margens de lucro parecem se impor sobre ao volume de vendas, é improvável que a picape da Ford obtenha grandes números nos rankings de emplacamento. A primeira caminhonete híbrida do país, entretanto, sugere que é só questão de preço para que o diesel seja gradualmente preterido. Ano que vem, inclusive, já teremos modelos maiores e mais eletrificados sendo fabricados no Brasil; um caminho que parece inevitável.
Teste de desempenho – Ford Maverick Hybrid Lariat
- Aceleração:
0 a 100 km/h: 8,9 s
0 a 1.000 m: 30,1 s – 173,9 km/h - Velocidade Máxima:
180 km/h - Retomada:
D 40 a 80 km/h: 3,8 s
D 60 a 100 km/h: 4,6 s
D 80 a 120 km/h: 5,7 s - Frenagens:
60/80/120 km/h – 0 m: 14,8/26,3/58,6 m - Consumo:
Urbano: 18,9 km/l
Rodoviário: 16,3 km/l - Ruído Interno:
Neutro/RPM máx.: 35,7/— dBA
80/120 km/h: 61,2/67,0 dBA - Aferição:
Velocidade real a 100 km/h: 100 km/h
Rotação do motor a 100 km/h em 8ª marcha: — - Volante:
2,5 voltas
Ficha técnica – Ford Maverick Lariat FX4
- Preço: R$ 244.890
- Garantia: 3 anos
- Motor: gas., dianteiro, transversal, 4 cil., 16V, 2.485 cm³, 165 cv a 5.600 rpm, 21,4 kgfm a 4.000 rpm; elétrico, dianteiro, 128 cv, 23,9 kgfm; potência combinada, 194 cv; torque combinado, 23,9 kgfm.
- Câmbio: e-CVT, 1 marcha, tração dianteira
- Suspensão: ind. McPherson (dianteira), eixo de torção (traseira)
- Freios: disco ventilado (dianteira) e sólido (traseira)
- Direção: elétrica, 12,2 m (diâmetro de giro)
- Pneus: 225/60 R18
- Dimensões: comprimento, 507,3 cm; largura, 184,4 cm; altura, 173,3 cm; entre-eixos, 307,6 cm; caçamba, 943 l e 659 kg de capacidade; tanque de combustível, 53 litros
- Vão livre do solo: 21,1 cm