Suzuki Burgman AN 650
Na relação conforto/preço, não há nada sobre duas rodas que se compare à Burgman 650
A vida é um jogo de perdas e ganhos. Bom, com o devido desconto à filosofia de botequim (que não é necessariamente má, veja lá), essa máxima popular poderia se aplicar à Burgman 650, recém-apresentada pela J-Toledo Suzuki, depois da nacionalização via Manaus.
O parto na floresta fez muito bem ao seu preço. Em agosto de 2008, o modelo era vendido por quase 52000 reais. Passados três anos, o scooterzão zerinho custa agora perto de 38000 reais. As perdas do atual modelo em comparação ao mais caro foram menores, basicamente três: o nome Executive se foi. Ninguém chorou – é um termo desgastado pelo uso em pratos fixos e motéis de estrada. A regulagem elétrica do para-brisa (para baixo e para cima) sumiu. A peça agora é totalmente fixa. E, finalmente, o acionamento elétrico dos espelhos retrovisores também se escafedeu. Pelo menos eles continuam escamoteáveis, manualmente.
Vão-se os anéis, ficam os dedos – mais sabedoria de boteco. A alma do maior scooter à venda no país, e um dos maiores do mundo, continua incólume. Ele é a coisa mais prática e confortável que trafega sobre duas rodas em sua faixa de preço.
Para aqueles afortunados que têm de encarar um trecho de estrada na rotina diária, é próximo da perfeição. Tem praticíssimos porta-luvas no escudo, dois sem chave e um, maior, com fechadura, ideal para documentos celular etc. Ficariam melhores com fundo de borracha macia, ou carpete.
O porta-malas (digno desse nome) de 56 litros, sob o assento, tem carpete, iluminação e amortecedor hidráulico para suster o banco aberto. É um sonho para quem leva laptop ou outros equipamentos delicados. O fotógrafo Guilber Hidaka, que fez o registro desta avaliação, tem um Burgman 400 só por causa do compartimento fechado, para as câmeras e flashes – e já viajou com ele pela Argentina, Uruguai e Chile. Ele tomou-se de amores pelo Burgmão 650, e com razão. Quem gosta da formula “pira” no Burgman 650.
Não é, francamente, meu caso. Estou me esforçando para parecer simpático, mas prefiro moto, motocicleta mesmo, com tanque sob o peito, câmbio no pé esquerdo, freio no pé direito etc.
Deixando de lado as idiossincrasias pessoais, o Burgman maioral é um grande veículo. Anda forte e permite viajar com todo conforto, mesmo em velocidades de cruzeiro mais altas.
O câmbio tem três modos: automático convencional, automático Power e “manual”, com as marchas trocadas apenas pelo polegar. Como a mão esquerda também é responsável pelo freio traseiro, a opção não se mostra confortável e tampouco segura. Mais apropriado seria se o avanço das marchas fosse feito pelo indicador, por meio de um gatilho na parte frontal do manicoto (punho), onde está o lampejador de facho alto. A melhor dirigibilidade é no modo automático Power. O câmbio fica mais ligeiro, mais generoso na subida de rotações e tem umas reduces ótimas – sim, reduz como uma moto mecânica, nada a ver com conversores de torque. O câmbio só desacopla a 10 km/h, velocidade mais que razoável para ficar sem freio-motor.
Mas olha, usar a expressão “pouco prático” perto do Burgman é quase uma blasfêmia. Se tem uma coisa que ele é, é superprático. Tem até tomada 12 volts para carregar celular ou outro aparelho. Computador de bordo compõe painel completo: o pacote de eletrônica embarcado é pródigo. O consumo também: ele fez a média de 15,9 km por litro, confirmada por seu próprio painel, durante todo o teste.
Você bota a bagagem no portamalas, o garupa atrás – ah, e que banco do garupa! – e viaja abrigado pelo parabrisa. O banco é um sofá, cujo encosto tem várias posições de regulagem, de acordo com a sua estatura. Para o garupa (e mesmo você) acomodar-se tão bem, será preciso desembolsar pelo menos uns 50000 reais a mais e partir para uma Gold Wing ou BMW K 1600 (cujo teste comparativo você vê na pág. XX). O pulo é esse mesmo, não há nada entre as duas escalas na categoria. Para viagens curtas em autoestradas, é difícil imaginar coisa melhor.
O motor de 640 cc refrigerado a água é muito competente. Tem força em alta e em baixa, um barulhinho agudo e discreto, como convém, e vibrações mais que aceitáveis para um twin paralelo. Balanceadores duplos no virabrequim ajudam a reduzi-las, além da refrigeração líquida.
A dirigibilidade é excelente, mas há alguns poréns, como em tudo na vida (é, está passando da hora de ir filosofar no bar…). Ele é muito duro e especialmente a suspensão dianteira tem pouco curso. Com garupa, chega ao batente com facilidade (o que também acontece em alguns buracos mais profundos) e raspa em qualquer curvinha. Os freios têm tendência ao travamento e os pneus cantam à toa, em qualquer frenagem mais exigente, gerando alguma insegurança. A impressão é a de que há pouco pneu para o motor e para o peso de quase 250 kg em ordem de marcha, fora o condutor.
Não é perfeita, a supermotoneta, mas é uma máquina belíssima. Se você é um espírito prático, gosta de conforto e privilegia mordomias em lugar de uma rude pilotagem esportiva, acaba de encontrar sua cara metade.
TOCADA
Deliciosa na estrada, satisfatória na cidade. Conforto total, exceto pelas suspensões rígidas. Bom de curva, forte.
★★★★
DIA A DIA
Se você tem de pegar estrada (mesmo curta) todo dia, levando laptop, é o veículo dos seus sonhos.
★★★★
ESTILO
Como um legítimo maxiscooter (talvez o único a realmente merecer o epíteto) é moderno, impecável.
★★★★★
MOTOR E TRANSMISSÃO
Motor sensacional, forte em baixa e alta, progressivo. Câmbio inteligente, reduz, mantém a moto na mão.
★★★★ SEGURANÇA
Freios têm tendência a travar à toa (um ABS seria o céu), e os pneus ficam pequenos para o volume e desempenho que sustêm.
★★★
MERCADO
Um scooter gigante é, por si só, um troço raro, inusitado. Não é fácil vendê-lo usado, mas quem gosta paga.
★★★
VEREDICTO
Praticidade superior e relação conforto/preço imbatível. Não garante liquidez: é produto para aficionados, mas tem baixa desvalorização.