Reportagem publicada em 2010 na revista Quatro Rodas Performance:
“Se tivesse que escolher um, com qual dos três você ficaria?” Eu ainda estava sob efeito da adrenalina de acelerar o Audi R8 V10, o Mercedes SLS AMG e o Porsche 911 Turbo quando o fotógrafo Marco de Bari disparou a pergunta. Uma animada discussão logo se formou na redação.
Todos apresentamos argumentos consistentes a favor de nossos preferidos, mas nenhum de nós estava completamente convencido de sua escolha.
No fundo, queríamos levar os três para casa, porque cada um deles à sua maneira tem todos os ingredientes que apreciamos em um esportivo. Mas o desafio era apontar um e apenas um entre os três superesportivos. Você, o que responderia?
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Pensando em desempenho, o Porsche foi unanimidade. E não podia ser diferente. Na pista de testes, o 911 Turbo deixou os rivais para trás, acelerando de 0 a 100 km/h em 3,1 segundos, na melhor passagem. Na média de quatro ensaios, demorou um pouco mais: 3,2 segundos.
Mercedes e Audi também foram rápidos, mas não o bastante. O SLS cravou 4 segundos e o R8 V10, 4,4 segundos. No cronômetro, a vantagem do Porsche pode parecer pequena. Mas, na prática, é grande.
Só para você ter uma ideia, o 911 Turbo acelera tão rápido quanto uma moto esportiva de 1 000 cc, como a nova BMW S 1000 RR, que em nossa edição especial MOTO bateu as rivais Yamaha YZF-R1, Kawazaki ZX-10R e Honda CBR 1000RR, com o tempo de 3,22 segundos, nas provas de 0 a 100 km/h. E olha que a relação peso/potência do Porsche, de 3,1 kg/cv, é pior que a da BMW, de 0,95 kg/cv.
O 911 Turbo arranca com uma energia avassaladora. Na partida, o motorista recebe um tranco e, em seguida, sente a velocidade crescer vertiginosamente com um ímpeto que parece não ter fim.
Em 10 segundos ele já está a 200 km/h. Logo depois de cruzar os primeiros 1 000 metros da pista, o superesportivo atingia 260 km/h. Nessa velocidade, a paisagem era apenas um borrão, a frente do carro parecia querer decolar e a direção que antes exigia esforço nas manobras agora recomendava firmeza nas mãos.
No restante da reta respirávamos fundo e sentíamos a adrenalina percorrer o corpo da cabeça aos pés, como um revigorante banho de cachoeira.
O Mercedes chegou a 252,7 km/h, no fim do primeiro quilômetro, e o Audi, a 246,5 km/h. Mais uma vez, ficaram atrás do Porsche, mas não dá para dizer que eles nos proporcionaram experiências monótonas. Pelo contrário. Estamos falando de um clube onde nenhum sócio é aceito com menos de 500 cv no motor. O mais potente dos três, aliás, é o Mercedes SLS AMG, com 571 cv (a 6 800 rpm).
O R8 V10 vem na sequência, com 525 cv (a 8.000 rpm), e o Porsche fica nos “modestos” 500 cv (a 6.000 rpm). A vantagem do 911, que é o único biturbo na pista, aparece no torque. Ele tem 71,4 kgfm (a 2.100 rpm), enquanto o Mercedes conta com 66,3 kgfm (a 4.750 rpm) e o Audi, com 54,1 kgfm (a 6.500 rpm).
O ronco do V10 é o que dá mais prazer de ouvir. Ele é encorpado, grave, nervoso. O SLS é gostoso de escutar principalmente nas reduções, quando ocorrem estouros de gases, simulando gasolina explodindo no escapamento, como nos carros de corrida. Mas nas acelerações o SLS tem um timbre de V8 americano, o que combina mais a bordo de um Camaro ou Mustang. O motor do 911 ronca forte e empolga naturalmente.
Nós não medimos as velocidades máximas, mas, de acordo com os números das fábricas, o que voa mais rápido é o Mercedes SLS, que chega a 317 km/h. O R8 V10 vem colado em segundo, com a marca de 316 km/h, e o 911 Turbo fica em terceiro, com 312 km/h.
Porsche 911 Turbo e Audi R8 V10 possuem tração integral, portanto, na hora de acelerar, eles empurram o asfalto com as quatro rodas, enquanto no Mercedes SLS a tração é traseira.
Em relação aos câmbios, algumas curiosidades: a Audi, que foi a primeira marca a apresentar a transmissão com dupla embreagem, ainda não instalou o sistema no R8. O argumento é de que o conjunto S-Tronic não suportaria um volume de torque tão grande. O R8 vem com o câmbio R-Tronic de seis marchas.
A Mercedes, por sua vez, jurava amor eterno ao câmbio automático sequencial 7G-Tronic, mas cedeu aos encantos dos sistemas manuais robotizados com dupla embreagem, em uma caixa igualmente de sete marchas.
Na Porsche, o câmbio PDK (com sete marchas e dupla embreagem) não é novidade. Esse sistema já equipa o 911 desde a geração passada. Mas o 911 Turbo também traz surpresas na linha 2010.
As trocas de marcha, no modo manual, são feitas por meio de borboletas “soltas” atrás do volante e não mais com botões na face da direção, dispositivos que exigiriam destreza de prestidigitador em um carro rápido como o Turbo.
Ainda no que diz respeito à quebra de paradigmas, a Porsche, que sempre se orgulhou de fabricar esportivos capazes de voar baixo em uma pista e depois circular com elegância no trânsito, desta vez fez um carro para ser dirigido o tempo todo com a faca entre os dentes. Um esportivo em estado bruto.
Apesar da assistência hidráulica, a direção do 911 parece diretamente conectada com as rodas, exigindo força e atenção ao volante. Com proposta semelhante, a suspensão chega a ser áspera.
Quem dirige o 911 Turbo e em seguida assume o volante do Audi R8 ou do Mercedes SLS logo sente a diferença. Com os sentidos calibrados para o 911, os rivais se transformam em dóceis cupês. A direção do R8 parece leve – e lenta. E a suspensão do SLS se torna (ainda mais) macia.
Para comparar o comportamento dos esportivos, é necessário um tempo de adaptação a cada um deles.
A partir daí é possível notar que Audi e Porsche têm mais semelhanças entre si do que esses dois em relação ao Mercedes. A posição de dirigir, por exemplo: enquanto no R8 e no 911 o motorista se posiciona no centro da plataforma, no SLS ele viaja mais próximo do eixo traseiro.
Isso porque R8 e 911 são cupês, o primeiro com motor central-traseiro, o segundo com motor traseiro; e o SLS é um roadster com motor central-dianteiro.
Outra coisa: R8 e 911 têm comportamento mais neutro nas curvas. Graças a suas trações integrais, eles manobram como se andassem em trilhos. O SLS, ao contrário, tem características sobre-esterçantes, ou seja, ele tende a sair de traseira. Para quem gosta de contornar curvas deixando o carro escorregar levemente, isso é diversão garantida, apesar do controle eletrônico de estabilidade.
Pensando em não estragar a festa, a Mercedes dotou o SLS de um sistema ESP com três níveis de permissividade: nenhuma (com máxima assistência), média (com alguma tolerância a desvios de trajetória) e total (com o sistema desligado).
O SLS, no entanto, é um carro bastante previsível e mantém o motorista o tempo todo informado do que se passa à volta. Um diálogo muito agradável, diga-se. O controle por parte do motorista tem a garantia do chassi bem equilibrado – com o peso dividido em partes balanceadas, na razão de 47% para a frente e 53% para trás, centro de gravidade baixo e uma carroceria com alta resistência estrutural.
O equilíbrio também se faz presente na hora de parar. Chegando a 266 km/h no fim da reta da pista, o SLS desacelera para contornar uma curva a 100 km/h sem balançar a carroceria ou mergulhar a dianteira.
O bom comportamento dinâmico foi o atributo mais lembrado do SLS em nossa eleição. Mas o Mercedes também agradou por acomodar bem o motorista no cockpit. Diferentemente dos rivais, o SLS não tem ajustes no banco, apenas o longitudinal, mas o motorista se encaixa de tal modo em seu banco concha que a impressão é de que o cockpit foi feito sob medida.
O corpo fica perfeitamente alinhado e apoiado e o volante se encontra quase vertical, o que torna a condução fácil e divertida, seja na pista, seja na rua. A suspensão do SLS copia o asfalto tanto quanto a do 911 Turbo, mas faz isso sem abrir mão do conforto característico dos Mercedes.
Ao contrário da Porsche, a Mercedes conservou a suavidade típica de seus veículos. Essa postura tradicional, aliás, foi causadora de algumas brigas entre os projetistas da Mercedes e da McLaren por ocasião do desenvolvimento do Mercedes SLR McLaren, uma vez que os ingleses defendiam um comportamento dinâmico mais visceral.
No fim das contas, o SLR ficou mais confortável que o próprio SLS, projetado pelos alemães da AMG, divisão esportiva da Mercedes, livres das pressões do sócios.
No caso da Audi, o R8 V10 apresenta um comportamento intermediário. Ele não é tão arisco quando o Porsche, mas é bem mais esportivo que o Mercedes. Para quem quer um esportivo para exercitar os reflexos, mas sem ficar cansado, essa calibragem é a mais indicada. Mas o que mais chamou atenção no Audi R8 V10 foi seu visual.
Deixando da lado a tradição do SLS, recriação do lendário 300 SL Asa de Gaivota, e a do próprio 911, que nunca mudou radicalmente desde os primeiros tempos, o R8 é o mais futurista dos três. Do para-choque dianteiro até o traseiro, o R8 surpreende com inovações que passam pelo design dos faróis, pelo caimento da linha do teto e pela lâmina lateral que separa a cabine do compartimento do motor. Internamente, o motorista se sente no comando de um caça.
Os instrumentos circundados por duas órbitas simétricas dão ideia de movimento mesmo com o carro desligado. E um arco de fibra de carbono que começa na porta e vai até o console cria uma atmosfera de unidade no cockpit. Os bancos também são do tipo concha, como os do SLS, mas têm diversos ajustes elétricos, como os do 911.
Em relação ao acabamento, os três esportivos usam materiais do mais alto padrão na indústria, a exemplo do alumínio em peças como alavancas de câmbio e de freio e detalhes no painel, da fibra de carbono no console, do couro nos bancos e da camurça no teto.
Nas avaliações feitas pela QUATRO RODAS, por ocasião dos lançamentos, o SLS foi o único a receber cinco estrelas como média final, enquanto os outros ficaram com quatro estrelas e meia. A vantagem do SLS surgiu no item “Seu bolso”, porque, apesar de caro, ele chegou custando menos da metade do SLR McLaren, modelo que o SLS veio substituir no topo da pirâmide Mercedes (embora, conceitualmente, os dois tenham muitas diferenças).
Além disso, por ser a recriação de um mito, o SLS é cotado também como um investimento, podendo ser disputado por colecionadores, no futuro – como uma Ferrari F40 hoje, por exemplo. A diferença de preço entre os três, porém, não é grande, e, como materializações de sonhos, quem poderá dizer o que é caro ou barato?
No fim da discussão, o placar terminou quase empatado. Meu voto foi para o Mercedes. O Porsche foi o preferido do editor Péricles Malheiros e do assistente Juliano Barata. E o Audi caiu no gosto do fotógrafo Marco de Bari e do diretor de arte, Tarcísio Alves. Mas, como fui eu que fiz o teste, meu voto teve peso maior. Deu SLS.
Veredicto
Cada um à sua maneira, Audi R8 (V10), Mercedes SLS AMG (V8) e Porsche 911 Turbo (6 cilindros opostos) têm atributos mais que suficientes para agradar quem gosta de superesportivos.
Em comum, eles oferecem tecnologia de ponta, sofisticação, desempenho e capacidade superior de divertir quem tiver a oportunidade de dirigi-los, seja numa pista, seja nas ruas.
Como objetos de desejo, a escolha de um deles depende mais da afinidade que o comprador tem com o visual, com o estilo e com a marca que com aspectos mais racionais, como preço.
No visual, o R8 é o mais futurista. No estilo, o SLS, que recria o lendário 300 SL, é o mais charmoso. E, no desempenho, o 911 é superior. No preço, os três estão na mesma faixa.
Audi R8
Desempenho
0-100 km/h (s) – 4,4
0-1 000 m (s) – 22,1
D 40 a 80 km/h (s) – 2,2
D 60 a 100 km/h (s) – 2,1
D 80 a 120 km/h (s) – 2,2
Velocidade máxima (km/h) – 316*
Frenagem
120/80/60 km/h a 0 (m) – 49,1/21,5/12,7
Ruído interno
PM/RPM máx. (dBA) – 48,3 / 74,6
80/120 km/h (dBA) – 65,7 / 68,5
Velocidade real a 100 km/h (km/h) – 97
Consumo
Cidade (km/l) – 6,7
Estrada (km/l) – 9,9
Tanque de combustível/autonomia (l)/(km) – 90 / 891
Ficha técnica
Motor – V10 / 40V / 5 204 / central / longitudinal
Diâmetro/curso (mm): 84,5 / 92,8
Taxa de compressão: 12,5:1
Potência (cv a rpm): 525 a 8.000
Torque (kgfm a rpm): 54,1 a 6.500
Câmbio – automatizado / 6 / integralDireção – hidráulica / 3 voltas
Suspensão – independente, do tipo duplo A, nos dois eixos
Freios – disco ventilado (diant.) / disco (tras.)
Pneus – 235/35 R19 (diant.) / 295/30 R19 (tras.)
Dimensões
Comprimento/entre-eixos (cm) 443 / 265
Altura/largura (cm) – 125 / 190
Porta-malas (litros) – 100
Peso (kg) – 1.620
Peso/potência (kg/cv) – 3,1
Peso/torque (kg/kgfm) – 29,9
Diâmetro de giro (m) – 11,8
* Dados de fábrica
Mercedes-AMG SLS
Desempenho
0-100 km/h (s) – 4,0
0-1 000 m (s) – 21,6
D 40 a 80 km/h (s) – 2,1
D 60 a 100 km/h (s) – 1,9
D 80 a 120 km/h (s) – 2,4
Velocidade máxima (km/h) – 317*
Frenagem
120/80/60 km/h a 0 (m) – 49/21,8/12,0
Ruído interno
PM/RPM máx. (dBA) – 56,9 / 74,1
80/120 km/h (dBA) – 65,2 / 68,9
Velocidade real a 100 km/h (km/h) – 99
Consumo
Cidade (km/l) – 7,2
Estrada (km/l) – 8,5
Tanque de combustível/autonomia (l)/(km) – 99 / 841
Ficha técnica
Motor – V8 / 32V / 6 208 / central / longitudinal
Diâmetro x curso: 102,2 x 94,6 mm
Taxa de compressão: 11,3:1
Potência (cv a rpm): 571 a 6.800
Torque (mkgf a rpm): 66,3 a 4.750
Câmbio – automatizado / 7 / traseiro
Direção – hidráulica, progressiva / 2,5 voltas
Suspensão – independente, do tipo duplo A, na dianteira e na traseira
Freios – discos ventilados e perfurados
Pneus – 265/35 R19 (diant.) / 295/30 R20 (tras.)
Dimensões
Comprimento/entre-eixos (cm) – 464 / 268
Altura/largura (cm) – 126 / 194
Porta-malas (litros) – 176
Peso (kg) – 1 620
Peso/potência (kg/cv) – 2,8
Peso/torque (kg/mkgf) – 24,4
Diâmetro de giro (m) – 11,9
* Dados de fábrica
Porsche 911 Turbo
Desempenho
0-100 km/h (s) – 3,2
0-1 000 m (s) – 20,5
D 40 a 80 km/h (s) – 1,8
D 60 a 100 km/h (s) – 1,7
D 80 a 120 km/h (s) – 2,1
Velocidade máxima (km/h) – 312*
Frenagem
120/80/60 km/h a 0 (m) – 49,7/21,9/12,7
Ruído interno
PM/RPM máx. (dBA) – 53,3 / 66,0
80/120 km/h (dBA) – 66,2 / 69,9
Velocidade real a 100 km/h (km/h) – 103
Consumo
Cidade (km/l) – 6,9
Estrada (km/l) – 10,5
Tanque de combustível/autonomia (l)/(km) – 67 / 703
Ficha técnica
Motor – 6 cil. / biturbo / 24V / 3 800 / tras. / long.
Diâmetro x curso: 102 x 77,5 mm
Taxa de compressão: 9,8:1
Potência (cv a rpm): 500 a 6.000
Torque (kgfm a rpm): 71,4 a 2.100
Câmbio – automatizado / 7 / integral
Direção – hidráulica
Suspensão – Dianteira: independente, McPherson / Traseira: independente, multilink
Freios – discos ventilados e perfurados
Pneus – 235/35 R19 (diant.) e 305/30 R19 (tras.)
Dimensões
Comprimento/entre-eixos (cm) – 445 / 235
Altura/largura (cm) – 130 / 185
Porta-malas (litros) (diant./tras.) – 105 /190
Peso (kg) – 1.595
Peso/potência (kg/cv) – 3,1
Peso/torque (kg/kgfm) – 21,9
Diâmetro de giro (m) – n/d
* Dados de fábrica
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