Na virada dos anos 60 para os 70, o Brasil entrava de cabeça na influência cultural americana. Era época em que os jovens mais abonados ouviam rock n’roll e sonhavam com ondas havaianas e uma nova mania importada da Califórnia: o bugue, nascido em 1964 quando Bruce Meyers idealizou o Manx, formado por um chassi VW encurtado coberto por uma carroceria de fibra de vidro. No Brasil, o primeiro bugue registrado no Geia (Grupo Executivo da Indústria Automotora) foi o Tropi, em 1969, desenhado por Anisio Campos e construído pela Kadron, tradicional fabricante de escapamentos e acessórios.
A personalidade dos traços de Anisio ficou evidente nos detalhes, como o santantônio integrado à carroceria e os faróis dianteiros, inspirados no inglês Triumph TR5. Em matéria de estilo, dava um banho nos rivais: o Glaspac era uma cópia do Manx americano e o Bugato tinha o estilo controverso da Gurgel. Outro destaque era a qualidade: a carroceria de plástico reforçado com fibra era fabricada pela Puma e depois enviada à Kadron, que reduzia o chassi VW em 35 cm. Do Fusca também vinha o velho quatro-cilindros boxer – o favorito era o 1.3 -, oferecido a partir de 1967. A redução do peso para apenas 520 kg favorecia as frenagens e o baixo centro de gravidade proporcionava boa estabilidade, garantida também pelos enormes pneus traseiros.
A lista de personalização contava com mais de 30 itens, possibilitando que cada exemplar fosse único: instrumentação exclusiva, bancos concha, para-choque tubular pintado ou cromado, entre outros. Os primeiros usavam as lanternas do Fusca e o motor era protegido só pela placa traseira, num suporte basculante. Como isso dificultava a manutenção e inviabilizava a dupla carburação, Anisio redesenhou a traseira, adotando tampa articulada, para-lamas mais retos e lanternas da Variant. Na dianteira, só um retoque: os piscas inseridos nos para-lamas.
O exemplar das fotos foi fabricado em 1971 e pertence a Waldeney Vaz de Moura, que há mais de 20 anos o usa em passeios e viagens. De tão original, ganhou a placa preta. “A maior dificuldade em obtê-la foi convencer o delegado de trânsito de que ele havia sido fabricado em série”, diz Moura.
Nascido para as praias, o Kadron surfou nas ondas da juventude: foi homenageado na canção Dune Buggy, dos Mutantes, que usavam um Tropi com as cores da bandeira americana. Sua popularidade só foi afetada pela crise do petróleo de 1973 e pelo número de concorrentes, muitos fabricados em fundo de quintal. Em pouco tempo, bugue virou sinônimo de carro mal construído e perigoso.
A Kadron encerrou a produção em 1977. No entanto, a categoria mantém a fibra, especialmente no Nordeste, onde os bugues proporcionam passeios por praias e dunas. Com e sem emoção.
TESTE – Quatro Rodas
Novembro de 1971
>> Confira na edição Aceleração: 0 a 100km/h 18,5 s
Velocidade máxima: 117,69 km/h
Frenagem 80km/h a 0: 24,1 m
Consumo: 10,4 km/l (médio), 7,4 km/l (cidade) e 10,7 km/l (estrada, vazio)
PREÇO
Outubro de 1971
Cr$: 4700 (kit básico, sem a mecânica)
Atualizado: R$ 14 340 (IPC-SP, Fipe)
Motor | longitudinal, 4 cilindros opostos, duas válvulas por cilindro, comando de válvulas simples no bloco, dupla carburação Kadron (Solex 32) |
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Cilindrada | 1493 cm3 |