Rejeitado para carros, GNV é visto como alternativa ao diesel no Brasil
Possibilidade de o proprietário do caminhão poder produzir o combustível, no caso o biogás, coloca solução na frente dos elétricos no mercado brasileiro
A Europa já virou a chave. Veículos comerciais urbanos elétricos já são uma realidade e, não por acaso, o IAA Transportation 2022 está repleto de caminhões elétricos e de soluções técnicas e logísticas vinculadas a este tipo de mecânica. Mas o mercado de veículos pesados europeu é completamente diferente do brasileiro.
Enquanto caminhões elétricos de uso rodoviário estão entre as grandes novidades de Mercedes-Benz, Iveco e Scania, solução de combustível alternativo mais adequada ao mercado brasileiro neste primeiro momento é exibida em segundo plano para o mercado europeu: o gás natural.
Na verdade, pode ser gás natural, biometano, ou gás natural liquefeito (gás natural condensado a baixas temperaturas, o que aumenta seu rendimento), pois a mecânica será basicamente a mesma. Em geral, são motores das mesmas famílias dos turbodiesel de cada fabricante, mas funcionando em ciclo otto (o mesmo usado para álcool e gasolina).
São combustíveis com baixos níveis de emissões após a queima, 90% menores que a de motores diesel equivalentes. O biometano ainda é renovável, pois é produzido a partir de rejeitos agrícolas.
É curioso, porém, ver fabricantes de caminhões adotando o gás natural como alternativa enquanto a indústria automotiva parece ter largado mão do combustível gasoso em prol do etanol e, na maior parte das vezes, dos carros elétricos.
Após quase 20 anos das primeiras soluções de carros a GNV homologados pelas fabricantes, com garantia, não há qualquer opção de carro a gás de fábrica. O Fiat Siena Tetrafuel, que saía convertido a GNV de fábrica, foi o ápice. Até 2020, porém, o Grand Siena poderia ser fabricado já preparado para ter gás.
Um dos problemas é a questão do espaço. Se em um carro de passeio perde-se, quase sempre, espaço do porta-malas, em caminhões os cilindros ocupam espaços vazios dos chassis e também os locais onde iriam os tanques de combustível. Isso porque motores de caminhões a gás usam apenas o gás e são otimizados para não depender de mistura de qualquer combustível líquido.
O Brasil ainda tem grande potencial de expansão da tecnologia, que permite até que o operador dos caminhões a gás produza o próprio combustível. Contudo, sem infraestrutura pública de reabastecimento o alcance dos veículos fica limitado. É um impasse também enfrentado para viabilizar caminhões elétricos (e os próprios carros elétricos) no Brasil.
Hoje a Scania explora o mercado de caminhões a gás em caminhões de média distância, com motores de 9 litros com 280 ou 340 cv, e em caminhões de uso rodoviário, com um 13 litros com 410 cv.
A substituição deste último motor, porém, foi um dos anúncios da fabricante sueca em Hannover. Agora seus maiores caminhões a gás terão motores de 420 cv e 460 cv, com maior torque e maior eficiência frente ao antigo. Além disso, o motor maior poderá ser aplicado em aplicações com nove eixos.
Ambos logo estarão disponíveis no Brasil, mas a confirmação deverá ser feita apenas durante a Fenatran, dentro de um mês. A Scania oferece a opção de gás natural e gás natural liquefeito, este com autonomia de até 1.700 km.
De acordo com o vice-presidente executivo das Operações Comerciais globais da Scania, Mats Gunnarsson, o Brasil ainda não tem grande demanda por elétricos, mas sim por caminhões movidos a biometano e biodiesel.
A próxima fabricante a entrar no mercado de caminhões a gás no Brasil é a Iveco, que já tem prevista a produção de 20 unidades do Iveco Hy-Way em sua fábrica em Sete Lagoas (MG) para serem testados junto a clientes. A seu favor tem o fato de a Itália, país de origem da empresa, já ter tradição no uso do gás em veículos.
O início das vendas do primeiro Iveco a gás no Brasil está previsto para 2023. A expectativa é por uma variante do Iveco S-Way, uma das novidades esperadas para a Fenatran. O motor já está definido, será um Cursor 13 (de 13 litros) trabalhando em ciclo Otto para gerar 460 cv.
Este motor será importado da Europa e, de acordo com a Iveco, é robusto o suficiente para durar mais de 1 milhão de quilômetros. Na Europa, porém, há opções de caminhões menores a gás, como do próprio Iveco Daily.
Por sinal, o Iveco Daily já tem outras opções de mecânica como emissão zero. O eDaily tem motor elétrico de 190 cv e 42 kgfm, e consegue autonomia de 185 km com dois módulos de bateria que somam 144 kWh e carga útil de 5,2 toneladas.
Uma particularidade é que o Daily tem carregador integrado, bastando conectá-lo à rede elétrica, bifásica ou trifásica. A porta de carregamento fica na dianteira para evitar acidentes, explica a fabricante.
Outra novidade é o eDaily FCEV promete autonomia maior, de 350 km, graças ao sistema de célula de combustível de hidrogênio de 90 kWh fornecido pela Hyundai. Tal autonomia é obtida com apenas 12 kg de hidrogênio armazenado em cilindros ao longo do chassi e com 3 toneladas de carga.
“Sim, essas soluções e tecnologias irão para o Brasil, mas em um tempo diferente. Primeiro, o custo total da operação precisa fazer sentido”, explica o presidente da Iveco para a América Latina, Márcio Querichelli, que diz já manter conversas com a Hyundai no Brasil para expandir a colaboração entre as duas empresas.