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Gasolina vai ficar mais barata? A culpa é do ICMS? Especialistas explicam

QUATRO RODAS buscou especialistas com diferentes experiências e visões para opinar sobre a atual situação dos combustíveis

Por Eduardo Passos
Atualizado em 24 ago 2021, 10h24 - Publicado em 24 ago 2021, 03h00
Esferas de armazenamento de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) da Refinaria Duque de Caxias - REDUC
Enquanto culpados variam uma coisa ninguém discute: os combustíveis estão caros (André Motta de Souza / Agência Petrobras/Divulgação)

O que corre nas suas veias? Talvez a resposta nem seja gasolina, como na redação de QUATRO RODAS e em seus leitores mais assíduos, mas as recentes altas nos preços tornaram não só o combustível do seu carro, mas o abastecimento energético em geral, pauta da imprensa e das contas mais complexas no orçamento pessoal.

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Se o preço dos combustíveis é questão antiga e que envolve fatores políticos, sociais e, claro, econômicos, a atual conjuntura torna mais difícil a compreensão e consenso sobre os motivos para que o processo — iniciado com a mudança na estatal pós-impeachment de Dilma Rousseff — chegasse ao ponto de alguns estados registrarem preço médio de R$ 7/litro da gasolina.

Um dos maiores embates ocorre em relação à atual política de preços da Petrobras, que comanda praticamente sozinha a produção de combustíveis fósseis no Brasil. Desde a chegada de Michel Temer à Presidência a empresa atrela o preço dos seus produtos aos valores praticados internacionalmente.

De um lado, têm-se maior garantia de que a operação será saudável, sem prejuízos. Do outro, fatores como a disparada do dólar atingem sem amortecimento a população, já calejada com pandemia e crises diversas.

Para debater e oferecer ao leitor diferentes opiniões sobre tudo que envolve os altos preços de combustíveis, convidamos cinco especialistas para responder quatro perguntas que não saem das rodas de discussão e soam para alguns óbvias enquanto, para outros, não passam de impropérios.

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Os combustíveis estão caros no Brasil?

Uallace Moreira Lima, é Doutor em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp e professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia:

Sim, considero que os preços dos combustíveis estão caros e têm impactos diretos na vida dos trabalhadores, principalmente. Com o preço elevado dos combustíveis, temos um efeito na cadeia produtiva em relação aos impactos nos preços, penalizando principalmente os assalariados.

O agravante do processo de política de preços da Petrobras que impacta nos preços dos combustíveis, está associado a um mercado interno em crise, com elevado desemprego, inflação e perda do poder de compra da classe trabalhadora, penalizando assim os trabalhadores com a alta do custo de vida, particularmente considerando que não há no país uma política de valorização do salário mínimo no período recente, reduzindo cada vez mais o salário real dos trabalhadores.

Heloisa Cruz, CFA, é gestora do Stoxos FIA:

Sim, estão caros sim. A quantidade de impostos sobre combustíveis no Brasil é muito grande, em especial o ICMS. Acreditamos que isso atrapalha bastante o custo Brasil e a competitividade do país, e esperamos que a Reforma Tributária enderece esse tipo de problema.

Ricardo Jacomassi, sócio e economista-chefe, da TCP Partners:

Sim, se compararmos o mesmo período acumulado de janeiro a julho de 2020 e 2021 do etanol e gasolina, sendo a referência a cesta que compõe o IPCA divulgado pelo IBGE, temos cenários bem opostos: enquanto que em 2020 o etanol e a gasolina caíram 12,8% e 8,9%, respectivamente, em 2021, o cenário é completamente diferente, o preço para o consumidor do etanol está subindo 34,7% e o da gasolina, 27,5%. Veja o gráfico

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Louise Nakagawa, Doutora em Energia pela Universidade Federal do ABC e Pesquisadora do Cebrap Sustentabilidade:

Está tudo muito caro no Brasil, e no caso dos combustíveis não seria diferente. Se por um lado a alta do dólar impacta no preço do petróleo, por outro, temos um cenário de crescente inflação. Embora o preço dos combustíveis seja composto por um conjunto de fatores internos (impostos, distribuição, custos Petrobras etc), a variação do câmbio tem reflexo direto no alto valor da gasolina/diesel hoje. Para checarmos se a gasolina está cara no Brasil hoje, basta compararmos com os valores no mesmo período o ano passado.

Você vê mais chances de que, ao final do ano, os combustíveis estejam mais baratos ou mais caros?

Brasília - Posto de combustíveis do DF vende gasolina com preço quase 40% menor no Dia da Liberdade de Impostos
Há quem diga que gasolina barata está relativamente barata. Especialistas ouvidos por QUATRO RODAS discordam unanimemente (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Uallace: Se eventualmente continuar um processo de variação do preço do barril do petróleo no mercado internacional, com os preços das commodities tendo tendência de alta e a política de preços política de Paridade de Preços de Importação (PPI) da Petrobras tiver continuidade, é possível termos um processo de continuidade de elevação dos preços dos combustíveis até o final do ano.  

Heloisa: Não imagino que esteja muito diferente de onde está hoje. Com as políticas novas dos EUA sobre combustíveis, a oferta de petróleo foi reduzida num momento em que a demanda aumenta com menores restrições por conta da pandemia.

Ricardo: O cenário é de alta nos preços. No caso do etanol os impactos das geadas e da seca devem reduzir a produção das usinas sucroalcooleiras, justamente no período em que deverá aumentar a demanda por causa do aumento da circulação de veículos motivada pela reabertura da economia. No caso da gasolina, o cenário também é de alta devido a pressão do dólar que influencia no preço do litro em reais e o aumento do consumo.

Louise: Existe muita discussão sobre o cenário para os próximos meses, mas alguns especialistas têm apontado que a expectativa é de que com a redução do preço do dólar e estabilização do mercado internacional, a tendência é que haja uma redução no valor dos combustíveis no país até o final deste ano. Contudo, é importante ressaltar que existem variáveis externas que podem interferir no desdobramento desse cenário, e a variante Delta pode ser uma delas. Hoje tem sido bem difícil desenhar, com precisão, qualquer cenário para o médio prazo.

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O que você acha da sugestão dada pelo Presidente da República de que os governadores zerem o ICMS a fim de baratear os combustíveis?

(Florianópolis - SC, 04/02/2021) Presidente da República Jair Bolsonaro, posa para fotos com motoristas e inspeciona automóveis do sistema MOBSUAS.Foto: Alan Santos/PR
Jair Bolsonaro cobrou que governadores baixem alíquota de ICMS que estados aplicam sobre os combustíveis (Alan Santos/Presidência da República)

Uallace: O discurso do Presidente da República é, na verdade, uma cortina de fumaça para não discutir o verdadeiro problema do elevado preço dos combustíveis no país, qual seja: a política de Paridade de Preços de Importação (PPI) da Petrobras e o desmonte da cadeia produtiva da Petrobras. O Presidente da República, lamentavelmente, tenta responsabilizar os governadores pela crise dos preços dos combustíveis, como também já fez em relação a outras problemáticas no país, como a crise da Covid.

Heloisa: Não sei se zerar, mas o ICMS dos estados é o grande peso sobre os combustíveis hoje. Mas acredito que seria adequado uma redução substancial, talvez de 75% sobre os impostos pagos hoje. Se tem uma gordura hoje, ela está ali.

Ricardo: É uma medida inócua, que pode ter impacto no curtíssimo prazo, mas não se sustenta ao longo já que as variáveis que influenciam são de mercado e econômicas, como a alta do dólar no caso da gasolina e da seca para o etanol.

Louise: Apesar dos diversos impostos que incidem sobre o preço dos combustíveis, e é importante destacar que isso varia de estado para estado, o que realmente gera alta ou baixa no valor da gasolina/diesel e etanol é a variação cambial, é a negociação do barril de petróleo no mercado internacional. Mexer no ICMS não gerará os impactos que o consumidor espera.

A política de preços adotada pela Petrobras é a ideal?

Uallace: Na minha avaliação, a política de Paridade de Preços de Importação (PPI) e o desmonte da cadeia produtiva da Petrobras são políticas adotadas desde o governo Temer e intensificadas no governo Bolsonaro, que resultam em uma gestão da Petrobras que não tem preocupação com os impactos sociais e estratégicos das políticas de desinvestimento e de maximização dos lucros para os acionistas, penalizando principalmente os mais pobres.

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Atualmente, o Conselho Administrativo da Petrobras, basicamente, representa os interesses dos acionistas de curto prazo e dos fundos financeiros, e até de grupos de importadores de derivados, os quais pressionam a diretoria da Petrobras para acelerar os reajustes dos preços dos combustíveis.

O governo Temer, e depois o governo Bolsonaro, aprofundaram a política de repasse dos preços internacionais para os preços domésticos, sem considerar as diferenças entre os mercados de vários países e a realidade do mercado de combustíveis no Brasil. Os projetos de expansão da capacidade de refino foram paralisados e ampliou-se o market share de derivados importados na oferta nacional dos produtos.

Isso porque é importante ficar claro que o parque de refino da Petrobras foi historicamente construído para processar petróleo leve importado, que o Brasil não produzia. Com o aumento da produção do petróleo brasileiro mais pesado, a empresa, durante os governos Lula e Dilma, fez um vultoso investimento nas unidades de processo, para aumentar a capacidade de conversão do petróleo nacional pesado em derivados leves. Esse investimento permitia o processamento do petróleo nacional aos seus custos de produção, dando margens para a Petrobras administrar as margens de seus segmentos de produção de petróleo cru e seu refino.

Vejam que a Petrobras era uma empresa integrada, com um parque de refino capaz de atender grande parte da demanda nacional, montando uma infraestrutura logística que possibilita a entrega dos produtos em qualquer parte do território nacional. Isso deu poder de mercado a Petrobras, criando obstáculos para a entrada de novos concorrentes, mas com a empresa tendo compromisso com as necessidades nacionais, adotando uma política de preços que isolava parcialmente as flutuações dos preços internacionais dos preços dos derivados vendidos no mercado brasileiro.

Com o desmonte da Petrobras, a empresa perde mais aceleradamente sua participação no mercado, dando espaço para os importadores, aumentando a sensibilidade dos preços internos às variações internacionais, com o objetivo de criar um ambiente propício para a venda de parte do parque de refino da empresa.

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Ou seja, há uma escolha de reduzir o papel da Petrobras e ampliar a presença de outros atores no mercado de refino, vendendo participações em algumas refinarias e, para isso, é necessário criar um ambiente que atraia potenciais investidores. Preços internacionais, espaços ocupados por importadores, redução da integração vertical na logística, com aberturas ao mercado, podem criar um cenário de uma política de preços para agradar ao mercado, mas penalizando os trabalhadores, com preços dos combustíveis elevados.

Como resultado dessa lógica, recentemente, enquanto os preços dos combustíveis se elevam, a Petrobras lucrou R$ 42 bilhões no 2º trimestre de 2021 e anunciou que antecipará o pagamento de R$ 31,6 bilhões aos acionistas, relativos ao exercício de 2021.

Heloisa: Enquanto a Petrobras for uma estatal monopolista, acredito que a política é a que funciona. Paridade com o preço internacional, mas sem ajustes abruptos por conta do principal perfil dos transportadores: autônomos que combinam frete por viagem. O modelo ideal envolveria a privatização de refinarias para vários players diferentes, de preferência ninguém com mais que 30% de market share. Nesse cenário, eles poderiam competir preço entre si.

Ricardo: A Petrobras segue uma política que ajusta sua operação conforme a variação da cotação do petróleo internacionalmente, portanto, é uma política de mercado que é ideal para mercados de commodities. Certos artifícios na precificação, como controle de preços que já vimos no passado, não são favoráveis para a operação.

Louise Nakagawa não respondeu à última questão.

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