Expedição Sertões ‘cria’ caminhos para garantir aventuras até a pilotos
Um erro logístico levou um piloto a largar as competições e se dedicar a criar aventuras para quem quer acompanhar o rali dos Sertões
![Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/IMG_8648.jpg?quality=70&strip=info&w=1280&h=720&crop=1)
Acompanhar as disputas entre os pilotos no Rally dos Sertões in loco não é fácil, a não ser que você more nas localidades por onde a competição passará (muitas vezes, com carros a 200 km/h). A promessa das Expedições Sertões é, justamente, tentar proporcionar essa experiência a quem quer conhecer conhecer um outro Brasil e até mesmo a quem já competiu no rali.
Vários grupos das Expedições acompanham o Sertões de cidade em cidade, mas com propostas e roteiros diferentes. Uns focam na experiência turística nas cidades por onde passam, há os que focam no off-road. Ao mesmo tempo, alguns grupos dormem em hotéis nas mesmas cidades onde são instaladas as Vila Sertões, enquanto outros acampam na Vila Sertões, fora ou sobre o próprio carro.
Em comum, todos exigem carros 4×4 e com altura suficiente para vencer obstáculos sem problemas, e que receberão inscrição oficial no Sertões. “Quando começamos a fazer as expedições, em 2016, pedimos para a organização garantir que os participantes tivessem credenciais, carros adesivados e até subissem na rampa de largada para viver essa experiência”, conta Renato Perotti, piloto e coordenador das Expedições Sertões.
![1662148382487 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/1662148382487.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
No início, eram 15 carros. Em 2021, 200 carros divididos em 12 experiências diferentes, com categorias para motos, UTVs e picapes e SUVs, além das diferenças no conforto. Operadores diferentes cuidam de cada um dos grupos.
Acompanhamos o grupo encabeçado justamente por Perotti, que começou em Foz do Iguaçu (PR) com 50 carros, dos quais 27 seguirão até o final do Sertões 2022, em Salinópolis (PA). Serão duas semanas de expedição. Há famílias com crianças, casais e até mesmo idosos no grupo, sendo que 80% deles já participou de expedições anteriores.
O custo é da inscrição é de R$ 12.000 para quem participa do trecho sul ou do trecho norte, e de pouco mais de R$ 15.000 para quem fizer a expedição completa.
![1662148382507 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/1662148382507.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
“O mais difícil é ter um grupo homogêneo, que quer viver a mesma experiência. Esse grupo aqui é o ‘raiz’, com gente que curte esse tipo de passeio e que, por mais que tenha condições até para correr no Sertões, dorme em barraca e come aqui com todo mundo”, conta Perotti apontando para a as três costelas que seriam servidas no pão francês na hora do jantar.
O almoço havia sido uma galinhada, servida em um refeitório no povoado de Zigurats (em Curralinho, MS) e na véspera, em Campo Grande (MS) um pantaneiro havia sido contratado por um grupo local para servir no jantar uma verdadeira comida de comitiva feita na frente de todos, na lenha: arroz carreteiro, feijão gordo, macarrão de comitiva e farofa. E todo mundo come feliz e satisfeito.
Mas nem sempre é assim e, justamente por isso, sobram histórias de outras expedições. Um cozinheiro, Fabio, acompanha o grupo e cuida de garantir as refeições em algumas etapas onde não há estrutura.
![1662148382571 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/1662148382571.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
“Uma vez a chegamos na beira do Rio Araguaia e não tínhamos nada para comer. Compramos uns peixes e umas verduras com os índios locais e o Fabio fez uma moqueca de pintado para todo mundo e foi bom demais” conta Leonardo, de Recife (PE), que já está no 12° Sertões, mas por ter se acidentado com seu UTV em 2021, neste ano participa com a expedição.
Caminhos alternativos
![1662148382422 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/1662148382422.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
O dia começou cedo em Campo Grande (MS). Na mesma hora que os UTVs começavam a sair da Vila do Sertões para fazer o deslocamento inicial até a largada, nós estávamos saindo em comboio rumo à cidade de Terenos, ainda pelo asfalto. Lá começava o trecho de terra, um caminho alternativo passando pela serra de Maracaju, um dos limites do pantanal, e pelo morro do Paxixi para chegar ao povoado de Zigurats, sobre a qual falaremos em outra reportagem.
O fato é que este caminho havia sido aberto em meio a fazendas especialmente para a Expedição e nem mesmo os locais conheciam o caminho. Além de mata-burros e porteiras, tivemos que negociar o caminho com um gado jovem que pastava em um trecho do caminho. Aquela centena de animais correndo na nossa frente ficará na memória.
![20220830_103550 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/20220830_103550-e1662149751817.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
“Eu sou uma pessoa que não gosta de ir e voltar pelo mesmo caminho. Se eu tiver que fazer isso, é melhor não ir. Aí conversando com pessoas que moram lá descobri que havia como atravessar as fazendas ao pé do cânion. E caçamos uma nova saída”, revela Perotti, explicando que os moradores vão e voltam por uma estradinha que passa pela localidade de Rochedo.
Tudo começou com um problema logístico
Renato Perotti conta que já foi representante do Rally Dakar no Brasil e trabalhou na Mitsubishi, onde começou a fazer expedições graças a um problema logístico da fabricante.
Perotti contou da vez que a Mitsubishi do Brasil resolveu patrocinar o Dakar fornecendo carros de apoio. “Mas esqueceram que os carros deveriam ser exportados para o Peru e importadas, depois da competição, pelo Chile. Eu era o chefe da equipe Mitsubishi Petrobras e o presidente do Dakar me chamou para falar que os carros estavam sem documento”, lembra. Eram 45 carros.
“Liguei para a Mitsubishi para avisar. E me contaram que os documentos estavam no cofre da Mitsubishi, no Brasil. Eles exportavam carros novos, não os emplacados, então quando disseram que os documentos originais não seriam necessários, não enviaram.”
![IMG_8641 sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/IMG_8641-1.jpg?quality=70&strip=info&w=650)
“Era época de férias coletivas, porque o Dakar começava no dia 2 de janeiro. Então demos um jeito do meu contato na Mitsubishi entrar na empresa, pegar os documentos, colocar em um malote e me enviar por meio do diretor de marketing, que iria para o Peru no Ano Novo. É claro que ele só soube do conteúdo da encomenda depois que tudo estava resolvido…”, completa Perotti.
Os carros só retornaram ao Brasil em abril. Diante da demora, da burocracia e de todo o custo logístico envolvido, Renato deu a ideia de no ano seguinte levar e trazer os 45 carros disponibilizados ao Rally Dakar rodando. Não contratando motoristas, mas vendendo expedições.
“Quando chegou na época do Dakar, me procuraram para seguir minha ideia. Levantei o roteiro em um mês e em uma semana todas as vagas já estavam vendidas para a viagem de 11 dias entre São Paulo a Buenos Aires com tudo incluso. O valor zerava todo o custo logístico”, explica Perotti, lembrando que o retorno dos carros do Chile, onde o rali acabou, foi feito em três expedições de 15 carros. Dois clientes destas primeiras expedições o acompanham nesta Expedição Sertões.
Foi também buscando uma alternativa que levou Renato à organização das expedições. “Fui piloto de moto de rali, fui navegador de rali, competi no Sertões de carro. Na verdade, comecei a correr no motocross, mas depois disso tudo descobri que não gosto de corrida. O que eu gosto mesmo, e depois entendi, é da aventura. Que alguém duvide que eu suba uma montanha e eu vou lá e subo”, conta.
![1662148382445 Expedição Sertões](https://quatrorodas.abril.com.br/wp-content/uploads/2022/09/1662148382445.jpg?quality=70&strip=info&w=1024&crop=1)
Esse desafio motivou Perotti por cinco anos até 2020, quando estabeleceu o recorde mundial de 6.003 m de altitude em um veículo 4×4 (uma Mitsubishi L200 Triton) e sem oxigênio ao subir a Sierra del Valadeiro, na Argentina. Ele repetiu o feito em abril deste ano, com uma Ram 1500 Rebel.
“Quando eu desci de lá pela primeira vez me perguntaram o que faltava, e disse “os amigos para abraçar!”, revela Perotti. Isso ajuda a entender como o piloto abandonou as competições para coordenar as expedições: “Os pilotos enchiam o meu saco. Eu queria uma equipe no rali dos Sertões sem pilotos, para viver toda a aventura do Sertões sem abandonar isso aqui. Foi o que me motivou a apresentar o projeto das expedições”. E assim ele chega à 20° participação no Sertões.