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Romi-Isetta, o primeiro carro nacional que o governo não levou a sério

Hoje, todos param e cumprimentam quando ele passa. Mas, na época, ninguém levava o Romi-Isetta a sério

Por Sérgio Berezovsky
13 jul 2024, 14h00
Automóvel Romi-Isetta. 2001
A visibilidade é  perfeita, quase sem pontos cegos. Até para cima, se o teto for aberto ” uma necessidade nos dias mais quentes (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Duvido que você não tenha aberto um sorriso ao ver a foto acima. Quando ele passa, não há quem não vire a cabeça. Muitos acenam e alguns tentam estabelecer contato com os ocupantes na base do grito. É inútil, pois a bordo tudo o que se escuta é algo parecido com uma máquina de fazer caldo de cana operando em ritmo de pastelaria lotada.

O Romi-Isetta é o carro mais exótico já fabricado no Brasil. O eixo traseiro é bem mais estreito que o dianteiro e ele aparenta ser ainda menor do que realmente é, com 2,27 metros de comprimento por 1,38 de largura. Entra-se nele literalmente pela frente.

Foi justamente por falta de uma segunda porta que o carrinho, lançado em 1956, não foi considerado oficialmente o primeiro carro nacional. Nem era considerado um automóvel de fato.

Segundo as normas do GEIA, órgão governamental cuja atribuição era criar regras e condições para a implantação da Indústria Automobilística no país, receberiam incentivos os automóveis convencionais, com, no mínimo, duas portas e quatro lugares. Como a Romi-Isetta tinha apenas uma porta e dois lugares (ou três, caso o terceiro passageiro fosse uma criança), não teve benefícios como incentivos fiscais e importação de maquinaria e componentes a dólar subsidiado.

Automóvel Romi-Iseta 1959, produzido pela fábrica brasileira Romi, sob licença da ita (1)
Vista de frente, a diferença de bitolas é gritante: 1,20 m na dianteira e 0,52 m na traseira (Marco de Bari/Quatro Rodas)
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As Indústrias Romi, que até hoje fabricam máquinas operatrizes em Santa Bárbara d’Oeste (SP), deram início à fabricação da versão brasileira da Isetta em 1955, sob licença da fábrica italiana Iso.

De pé sobre o piso do carro e apoiado na capota, com uma ligeira meia-volta já estou instalado no banco para dois lugares. Antes de dar a partida, apanhei um bocado do câmbio – as posições são invertidas (a primeira é para baixo) e as trocas são feitas com a mão esquerda.

Encontrar o trilho das quatro marchas é uma questão de sorte, muita paciência e um pouquinho de jeito – ou força, cá entre nós. Quem tem o volante nas mãos fica com a coluna de direção entre os pés. Os instrumentos não são mais que um pequeno velocímetro – que marca até 100 km/h – e três luzes-espia: dínamo, pisca e farol alto. Com exceção do para-brisa, os “vidros” são de plástico e garantem a visibilidade de um caça Spitfire da Segunda Guerra.

Romi Isetta azul visto de frente com a porta aberta
Por só ter uma porta, ele não era considerado um automóvel pelas autoridades (Marco de Bari/Quatro Rodas)
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O Romi-Isetta tinha algumas soluções originais. Por exemplo: o motor de partida e o dínamo, que alimenta o sistema elétrico de 12 volts, formam uma única peça. Debaixo do banco há uma torneirinha, como nas motos, que comuta a passagem para a reserva de 3 litros do tanque de combustível (com capacidade de 13 litros). E a transmissão é feita por duas correntes, que levam a força do motor às rodas traseiras.

Os primeiros Romi eram equipados com motor dois tempos, de dois cilindros. Para o modelo 1959, o último a ser fabricado regularmente, a fábrica anunciava nas revistas uma velocidade máxima de 95 km/h, um consumo de 25 km/l e garantia que o carro “vence com sobras as subidas mais íngremes”, graças ao novo motor BMW de quatro tempos monocilíndrico, de 298 cm3 e 13 hp de potência.

Interior da Romi-Isetta.
O painel é minimalista. Junto com a porta vem o volante. E a alavanca de câmbio fica na lateral. Original, não? (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Descontado o entusiasmo do redator do “reclame”, 80 km/h por hora me parece uma velocidade mais próxima da realidade. Quanto às ladeiras, não ponho a mão no fogo. Nas retas, eu garanto: o carrinho desenvolve bem, desde que não haja timidez no trato com o acelerador. Dos buracos, é melhor passar longe.

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A suspensão é cumpridora, mas não pode fazer milagres com as rodas de aro 10. Mas os freios seguram bem a barra. Abrir o teto de lona é uma necessidade nos dias mais quentes: os grandes quebra-ventos não dão conta de ventilar a cabine.

Automóvel Romi-Isetta. 2001
Atrás do banco fica o motor de 13 hp (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Mesmo depois de encerrada a produção, alguns Romi-Isetta ainda foram montados, com o estoque de peças remanescente dentro da fábrica. No total, foram produzidas cerca de 3 000 unidades.

O público nunca levou o Romi-Isetta muito a sério. Era visto mais como uma excentricidade do que uma solução prática de transporte. E o fato de ter ficado à margem da política de incentivos à indústria automobilística, durante o governo Juscelino Kubitschek, fez com que seu preço não fosse competitivo – em 1959, ele custava mais de 60% do preço de um Fusca.

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Romi Isetta azul visto de lado
Romi-Isetta, modelo 1959 (Marco de Bari/Quatro Rodas)

Esses fatores contribuíram em parte para encurtar sua temporada por aqui. Mas, assim como muitos animais pré-históricos, ele foi vítima da seleção natural, devido a suas próprias limitações. Especialmente a de locomover-se mais rápido.

Ficha técnica – Romi-Isetta

  • Motor: monicilíndrico, 298 cm3, Taxa de compressão: 7:1 Potência: 13 cv a 5 800 rpm, Torque: 1,9 mkgf a 4 200 rpm
  • Câmbio: manual, 4 marchas
  • Velocidade máxima (estimada): 95 km/h
  • Dimensões: comprimento, 227 cm; largura, 138 cm; altura, 132 cm; entre-eixos, 150 cm; peso, 360 kg
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