Em questão de poucos anos, será difícil comprar um carro novo sem nenhum grau de eletrificação – que é o que, na prática, caracteriza um carro híbrido.
Seja por economia de combustível, performance, consciência ambiental ou mera adequação às leis, os veículos daqui em diante tenderão, cada vez mais, a se apoiar na energia elétrica para melhorar a experiência do motorista. Uns com motor elétrico mais fraco, outros com vários motores. Uns com baterias minúsculas, outros com baterias gigantes.
Mas a tecnologia tem seus preços e desafios e, por isso, carros “menos ou mais elétricos” coexistirão até um futuro de longo prazo, onde o motor a combustão será finalmente abandonado, restrito a carros de coleção ou modelos de nicho. Nem assim, entretanto, o caminho é único.
O que é um carro híbrido?
Carros híbridos são aqueles que combinam o motor a combustão tradicional a um ou mais motores elétricos para mover o carro. A intenção sempre é aumentar a eficiência do motor a combustão. Quem faz essa gestão é um módulo eletrônico, não o motorista.
Para isso, o motor elétrico pode atuar para dar um impulso extra em momentos mais críticos, como acelerações, ou até mesmo para que o carro possa ser movido apenas por um ou mais motores elétricos por mais de 100 km. Isso vai depender, por exemplo, da potência dos motores elétricos e da capacidade da bateria que dá suporte ao sistema elétrico.
Há diversos tipos de carros híbridos e ainda não é possível dizer qual deles é o melhor. O que é possível afirmar é que, quanto maior for a participação dos motores elétricos na tração do carro, menor será o consumo de combustível.
Quer comprar um carro híbrido e não sabe qual? O mais indicado é entender como cada tipo de sistema funciona e qual tipo de carro híbrido pode ser o mais indicado para sua rotina ou seus deslocamentos.
Hoje, há carros com eficiência tão grande e com baterias parrudas que garantem autonomias próximas a 2.000 km (a depender do ciclo de medição), por exemplo.
É possível classificar os carros híbridos quanto à arquitetura da sua mecânica, quanto ao funcionamento e quanto ao seu tipo de tração. Veja a seguir.
MHEV: o híbrido leve
“Veículo elétrico híbrido leve”, na sigla em inglês, o MHEV é o tipo de carro eletrificado que mais deve ganhar as ruas brasileiras daqui a diante, tracionados pelos novos Fiat Pulse e Fastback Hybrid. Isso acontece porque sua construção é mais simples e, consequentemente, muito mais barata. Justamente por isso, os carros híbridos mais baratos do Brasil são os leves.
Na maioria dos automóveis híbridos leves, não há sequer um motor elétrico independente, mas uma versão mais robusta do alternador e do motor de partida, unidos em uma única peça alimentada por um sistema que geralmente é de 48V (mas pode ser 12V como em carros convencionais). É o sistema BSG: um único motor elétrico é conectado não às rodas, mas ao virabrequim do motor convencional, através de uma correia.
Hoje, não é impossível que o carro se mova só pela força da eletricidade, pois já existem os carros MHEV+ – ainda assim, a participação do motor elétrico é mais limitada. A grande vantagem do sistema está em recursos como o modo Velejar do Kia Stonic e outros modelos com câmbio DCT, nos quais o motor pode ser desligado em um momento de pouca demanda do acelerador (uma descida, por exemplo) e religado imediatamente, favorecendo o consumo – que pode ter uma redução que varia entre 10 e 15% no ciclo urbano.
Dependendo da fabricante, também é possível ter algum ganho de torque durante poucos segundos, favorecendo a arrancada do veículo – justamente quando o motor a combustão gasta mais combustível.
As baterias desse sistema são bem pequenas, o que contribui bastante para o preço reduzido de acrescentar tal sistema a um veículo. No caso do Stonic, a marca estima cerca de R$ 10.000 a mais no seu preço; nos Fiat Pulse e Fastback, o aumento de preço foi de apenas R$ 2.000. Modelos futuros da Renault e Volkswagen também terão sistemas semelhantes no país.
HEV: o híbrido convencional
O maior representante dessa categoria no Brasil é o Toyota Corolla e sua variante SUV Corolla Cross. A principal mudança em relação ao MHEV é a troca do BSG por um motor elétrico que, de fato, está conectado às rodas mas não pode ser recarregado na tomada.
No caso dos Corolla nacionais, o motor elétrico tem 72 cv; mais potência do que modelos 100% elétricos como o Renault Kwid E-Tech. Mesmo assim, os modelos da Toyota não rodam mais do que poucos instantes em regime 100% elétrico, já que as baterias, ainda que maiores que as de um híbrido leve, também não são grandes.
Desse modo, um HEV necessita de sistemas eletrônicos mais avançados, que a todo instante dosam a exigência de cada um dos motores conforme a intenção da marca e o modo de direção. Além disso, a frenagem regenerativa tende a ser mais intensa e, dependendo do modelo, o motor a combustão também pode servir como um gerador de eletricidade, alimentado as baterias.
No caso dos Corolla, o motor elétrico atua principalmente no para-e-anda da cidade, o terror do consumo de gasolina. Em casos de engarrafamento, o modelo híbrido pode ser aproximadamente 7 vezes mais econômico que o 2.0 comum, contando ainda com a vantagem do torque instantâneo. Na cidade, o Corolla híbrido pode fazer um litro de gasolina render 100% mais quando comparado com a versão 2.0.
Atualmente, a diferença do Corolla Altis Premium 2.0 e híbrido está na casa de R$ 14.000, o que indica o sucesso da japonesa na economia de escala e diluição de preços da tecnologia, que é importada. Esse exemplo, por outro lado, mostra que as fabricantes com produção nacional podem fazer com que os híbridos leves tenham acréscimo no valor bem abaixo dos R$ 10.000 aproximados da Kia.
Variações de um híbrido convencional
Ainda que o sistema do Corolla seja relativamente simples, as possibilidades mecânicas do carro híbrido são amplas. Um caso notável de eletrificação complexa é a da Honda, que vende o Civic e:HEV no Brasil.
Nesses modelos, o motor a combustão nunca carrega as baterias diretamente: ele alimenta um motor-gerador elétrico que realiza tal função. Em condições urbanas, um outro motor elétrico movimenta o carro e, em cenários de mais velocidade, o motor a combustão assume o domínio da propulsão.
Graças a esse esquema, o Honda Civic pode rodar por longos períodos em regime elétrico, mesmo sem trazer baterias grandes, e mantendo sempre um rendimento acima dos 20 km/l. Funcionando em ciclo Atkinson e evitando fases mais ineficientes, o motor a combustão também acaba sendo muito mais econômico — nessa “dança” complexa, os sistema eletrônicos do carro calculam, em tempo real, uma função de várias variáveis, que sempre ativa os propulsores mais eficientes à ocasião.
PHEV: o híbrido plug-in
Recarregar um carro apenas pela frenagem regenerativa é algo impraticável para modelos como o BYD Song Plus, híbrido plug-in mais vendido do Brasil. Nesse arranjo, motor a combustão e elétrico coexistem como em um híbrido convencional, mas a conexão do carro aos carregadores externos permite a instalação de baterias muito maiores, que mudam tudo.
Haval H6 PHEV e Chery Tiggo 8 Pro são outros hibridos plug-in que vendem bem e podem rodar de 30 a 100 km em modo elétrico. Assim, quem tem um wallbox em casa ou no trabalho, por exemplo, consegue utilizar um PHEV desses por dias sem gastar uma gota de gasolina e recarregando-o em pouco mais de uma hora.
Mesmo assim, a grande vantagem dos híbridos plug-in está na maior liberdade de interação entre os dois motores, por conta das baterias maiores. Assim, os computadores dos carros conseguem um grau de liberdade ainda maior na extração de um bom consumo do motor a combustão, que fica mais bem amparado.
Outro arranjo interessante, inclusive explorado pelo Jeep Compass 4XE, é a possibilidade instalar o motor elétrico no eixo traseiro e prover um tipo diferente de tração integral, que dispensa o peso e complexidade do cardã. Ainda que esse arranjo seja possível com híbridos convencionais, não compensa tanto quanto seu uso em um PHEV.
Como atuam sozinhos por longos períodos, os motores de carros do tipo também costumam ser mais potentes e fortes que os de HEVs. Esse fator, somado ao tamanho das baterias e os componentes de carregamento, fazem com que tais modelos sejam consideravelmente mais caros que equivalentes a combustão.
Existe, porém, uma desvantagem importante: os híbridos plug-in conseguem fazer excelentes números de consumo apenas enquanto suas baterias estão carregadas. Quando descarregam, passam a funcionar como HEVs e têm sua potência limitada, e o peso da bateria maior faz com que seu consumo seja maior que o de um carro convencional. Em outras palavras, só são eficientes com a bateria carregada.
REEV: o elétrico “sujo”
Um dos primeiros carros elétricos à venda no Brasil, o BMW i3 é, também, um dos raros modelos que conta com o extensor de alcance. É uma alternativa muito específica e que, a exceção de determinados modelos chineses, vem caindo em desuso globalmente — por mais que isso possa mudar com o uso de etanol ou gasolina sintética.
No caso “veículo elétrico com extensor de alcance”, da sigla em inglês, a movimentação do carro sempre é feita pelo motor elétrico, de modo que a todo instante seu comportamento é de um carro elétrico. Mesmo assim, esses modelos trazem um motor a combustão que funciona exclusivamente para recarregar as baterias, que não são grandes.
Além da condução com torque instantâneo e sem marchas, o REEV não tem seu custo inflado pela necessidade baterias grandes. Além disso, a autonomia do carro acaba sendo limitada como em um carro a combustão: pela disponibilidade de postos de gasolina.
A maioria desses modelos também têm tomadas de carregamento, de modo que é possível ativar o motor-gerador a gasolina só quando necessário. Como ele funciona para uma função específica, também é possível otimizar significativamente o regime de funcionamento do motor, fazendo com que cada gota de gasolina renda mais do que renderia em um carro comum.
BEV: o elétrico de verdade
Entre todos os tipos de carros elétricos citados até agora, em nenhum deles há, 100% do tempo, rodagem sem emissão de poluentes. É por isso que o consenso na indústria global aponta para um futuro com o domínio do “carro elétrico a baterias”, o BEV; ou o “carro elétrico”, simplesmente.
Sem o amparo da gasolina, os BEVs necessitam de baterias bem maiores, com energia armazenada o suficiente para alimentar uma casa média por semanas. Isso, obviamente, resulta em custo bem mais elevado. Outros desafios incluem a necessidade de infraestrutura custosa para recargas rápidas e, em escala maior, a obrigatoriedade de uma transição global a fontes de energia renováveis.
No Brasil, isso não é problema, mas o potencial ainda é subexplorado. A guerra na Rússia, ao mesmo tempo, acelerou o processo da União Europeia, que desembolsará cerca de R$ 1 trilhão nos próximos cinco anos para depender cada vez menos dos combustíveis fósseis. Além do ganho ambiental, a geração de energia eólica e solar, entre outras, tende a diminuir a dependência de produtores pontuais, como os países com grandes reservas de petróleo que, por isso, conseguem modificar a economia global através de decisões localizadas.
Com o avanço da tecnologia, subsídios e novos meios de propriedade dos carros — assinaturas e carsharing, por exemplo — ainda pode ser que os carros elétricos jamais sejam tão baratos quanto o Fiat Uno do passado. Mas os ganhos na vida coletiva podem sobrepor o simples benefício individual.
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