Vitais para o funcionamento do motor, as válvulas são responsáveis pela entrada da mistura ar e combustível e pela saída dos gases resultantes da combustão. Mas a quantidade de válvulas dos motores sempre foi motivo de discórdia – pelo menos no Brasil, um lugar estranho onde até as quatro portas já foram um tabu.
Hoje, motores com duas válvulas por cilindro (6V em motores três cilindros e 8V nos de quatro cilindros, no total) são minoria, mas eté chegar a este ponto houve muito preconceito e evolução técnica.
As válvulas ficam no cabeçote e abrem-se por meio de comandos, que por sua vez são ligados ao virabrequim do motor por uma correia dentada ou corrente. Para que o motor tenha bom rendimento em altas rotações é necessário que as válvulas de admissão e escape tenham bom tamanho.
Aí surge outro problema: válvulas grandes também eram pesadas e este peso fazia o motor perder desempenho em altas rotações. Passar a usar duas válvulas de admissão (maiores) e duas de escape (menores) resolveu esses problemas.
Assim configurados, os motores com quatro válvulas por cilindro (multiválvulas) se valem de abertura maior para a passagem dos gases, o que favorece a potência e o desempenho em rotações mais altas. Era uma boa solução para grandes motores, mas precisaria superar o preconceito de mecânicos.
O primeiro carro nacional com 16V foi o Fiat Tempra 2.0 de 1993, que não podia reclamar de desempenho, mas que acabou sofrendo com rotinas de manutenção menos cuidadosas.
Por outro lado, os multiválvulas sofrem pela falta de torque em baixas rotações. Esta diferença é notável em motores pequenos, como nos antigos 1.0 16V, que obrigavam o motorista a dar uma acelerada antes de arrancar com o carro para o motor não morrer.
Não deixa de ser curioso notar que, enquanto em 1997 começavam a surgir os motores 1.0 16V no Brasil, com Volkswagen, Fiat, Chevrolet e Renault, após 2004 apenas a Renault (e a Peugeot, por tabela) continuaram usando um 1.0 16V. As outras voltaram atrás e otimizaram os antigos 1.0 8V, que por anos permaneceram nas versões básicas de seus carros
A explicação é simples: quando há duas válvulas por cilindro, todo ar necessário para a queima precisa passar por uma válvula, fazendo com que o ar entre no motor com maior velocidade, disponibilizando o torque máximo mais cedo. Em outras palavras, era muito mais confortável encarar o trânsito em um Gol 1.0 8V de 65 cv do que no 1.0 16V, de 76 cv. Quando seu carro é fraco, você espera que ele ao menos tenha força nas saídas, certo?
Segunda chance
Enquanto motores maiores passavam a adotar as quatro válvulas por cilindro como padrão, os 1.0 seguiam com duas. Até que a busca por motores mais potentes e de consumo menor levou as fabricantes a darem uma nova chance aos multivalvulas.
A falta de torque em baixas rotações passou a ser amenizada pela tecnologia. Além da redução de atrito e de novas tecnologias, entraram em cena sistemas que eram vistos apenas em motores maiores, como o variador de fase continuamente variável e o comando de válvulas variável (CVVT), dependendo do motor.
A vantagem do primeiro está em variar o tempo de cruzamento das válvulas para propiciar melhor enchimento dos cilindros, enquanto o segundo muda não só os tempos de abertura e fechamento, como também o levantamento das válvulas para otimizar o desempenho. Isso favorece o surgimento do torque mais cedo, além de melhorar a mistura ar-combustível e, consequentemente, o consumo e a potência. No final, a balança é favorável ao desempenho e ao consumo.
Hoje, os motores 1.0 tricilíndricos de Volks, Ford e Hyundai disponíveis no Brasil empregam quatro válvulas por cilindro. A Fiat, por outro lado, seguiu um rumo oposto com os novos motores 1.0 e 1.3 Firefly, lançados com duas válvulas (bem leves) por cilindro e variador de fase.
Foi a forma mais fácil e barata de entregar mais torque em baixas rotações e conseguir bom consumo de combustível sem lançar mão de tecnologias caras como o CVVT usado por Ford e Volks – para entender tudo o que foi implementado nos 1.0 e 1.3 Firefly, clique aqui. A Fiat não divulga informações a respeito, mas certamente sua nova família de motores teve custos de desenvolvimento e produção menores que os da concorrência.
Potência | Torque | |
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VW 1.0 12V do Up! | 82 cv a 6.250 rpm | 10,4 mkgf a 3.000 rpm |
Ford 1.0 12V do Ka | 85 cv 6.500 rpm | 10,7 mkgf a 3.500 rpm |
Hyundai 1.0 12V do HB20 | 80 cv a 6.200 rpm | 10,2 mkgf a 4.500 rpm |
Fiat 1.0 6V do Uno | 77 cv a 6.250 rpm | 10,9 mkgf a 3.250 rpm |
A tabela comparativa acima mostra que, de fato, o 1.0 Firefly tem um pouco mais de torque e um pouco menos de potência máxima que os de VW, FOrd e Hyundai.
Em nosso teste com o Uno equipado com os novos motores, o resultado foi satisfatório. Já o Mobi 1.0 Firefly com câmbio GSR chegou ao ponto de se tornar o automatizado mais econômico à venda no país.
Atualizações recentes também garantiram vida longa aos 1.4 8V e 1.8 8V da Chevrolet, que mesmo antigos conseguem entregar números de desempenho e consumo adequados às exigências do consumidor e das regras de eficiência do Conpet.
A não ser que você dependa muito do desempenho do motor em altas rotações, é melhor não desmerecer os com duas válvulas por cilindro em motores pequenos… Ainda.