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O carro reciclável

Do nascimento à hora da despedida, como o automóvel vem aprendendo a respeitar o planeta

Por Gustavo Henrique Ruffo
Atualizado em 9 nov 2016, 12h44 - Publicado em 23 set 2013, 22h15
geral

Uma das cenas mais emblemáticas publicadas na história de QUATRO RODAS é a sequência que você vê aqui, originalmente divulgada na edição de janeiro de 1965. Sob o título “Não é doce morrer no mar”, a reportagem de duas páginas mostrava que, para se livrarem de seus carros usados, sem valor de revenda, os suecos tinham duas opções: abandonar o veículo em alguma rodovia deserta ou pagar 30000 cruzeiros (valor que convertido para os dias de hoje daria pouco menos de 600 reais) ou, como piratas, colocá-los para andar na prancha e deixá-los morrer no mar. Se as cenas em preto e branco são fortes sob o ponto de vista ecológico, elas ganham ainda mais força ao lembrarmos que foram feitas na Suécia, país totalmente engajado na proteção do meio ambiente e com histórica preocupação com segurança no trânsito. Vale lembrar que a falta de constrangimento quanto ao descarte estava longe de ser uma exclusividade sueca. Passadas quase cinco décadas, a cena é quase surreal. Hoje automóveis antigos agora são desmontados e reciclados. Fluidos são drenados e processados. Os pneus são usados para fabricar asfalto, pisos ou como combustível de fornos. Praticamente tudo se aproveita.

Mas não foi apenas na hora da despedida que os carros diminuíram sua agressividade em relação ao planeta. “Emissões e ruídos foram as primeiras preocupações ambientais em relação ao automóvel. No Brasil, em 1986, surgiu o primeiro regulamento, o Proconve (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores). A partir daquela data, todo veículo precisa passar por certificação. Nos Estados Unidos e na Europa, o movimento não começou muito antes. Foi na década de 1980, também”, afirma Edson Orikassa, diretor técnico da AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva). De acordo com Orikassa, um motor do início dos anos 1980 emitia 28 vezes mais poluentes do que um atual, tanto pelo maior consumo de combustível quanto pela falta de catalisadores. Segundo ele, nem é necessário voltar tanto no tempo: o nível de emissão de monóxido de carbono de um carro atual para um de 1998 é 86% menor. O automóvel atual emite 98% menos hidrocarbonetos e 96% menos óxidos de nitrogênio”, diz Guilherme Heinz, diretor do comitê de Sustentabilidade do Congresso SAE 2013.

O fato é que os veículos evoluíram tanto em emissões que hoje, do total de poluentes produzidos no teste-padrão, 97% deles são gerados na fase fria (os primeiros 8 minutos e 25 segundos de funcionamento do motor), ou seja, da partida até a temperatura ideal de trabalho dele, segundo o engenheiro Waldemar Christofoletti, do comitê de Veículos Leves da SAE. “O catalisador precisa atingir sua temperatura ideal de funcionamento, de 600 a 700 oC. Quando isso acontece, dizemos que ele acende ou que chegou ao light-off. Nessa fase, o catalisador elimina 99% de todos os poluentes.”

Resíduos sólidos

Para que as grandes cidades sofressem menos com a poluição causada por carros, seria necessária uma completa renovação de frota, mas isso geraria outro problema: como nos livraríamos de tantos carros antigos? Ao contrário da Suécia, a dos anos 1960 ou a atual, nossos automóveis não perdem tanto preço de revenda. “A renovação de frota é difícil porque os veículos no Brasil têm um valor residual muito alto. Isso dificulta esse tipo de programa. No Japão, a carga tributária torna impossível manter os modelos mais velhos.

Quando o carro brasileiro resolver esse problema (talvez custando menos do que hoje), a solução para lidar com os veículos antigos será a reciclagem e o reúso. “O reaproveitamento das peças é muito frequente no Brasil, próximo dos 90%. Aqui, já temos a remanufatura de motores, de caixas de câmbio, de turbos, da parte elétrica, do alternador”, diz Heinz. Mais de 75% do peso de um veículo é composto de componentes metálicos. Eles são uma riqueza que, antigamente, não interessava pelo baixo preço dos minérios metálicos. Com a escassez dessa matéria-prima, é mais barato reciclar do que produzir.

Atualmente, nos lançamentos de veículos, ouve-se falar em 80% ou mais de reciclabilidade. Esse número é calculado com base no peso do veículo. Como cerca de 75% da massa do carro é composta de metais, sobra muito pouco que não poderia ser reaproveitado. “Fluidos não são recicláveis, por exemplo. São recuperáveis, mas não dá para reciclar ainda. Pneus também não. Ele são aproveitados. A reciclagem exige que as matérias-primas sirvam para fazer novas peças. No exterior, há recuperação de para-choque até nas concessionárias. São peças recuperadas e vendidas em revendas como originais, capazes de atender a todas as exigências. No Brasil, isso ainda não compensa porque o custo é alto”.

Mais do que reaproveitar devidamente tudo o que se usa para criar um carro, a tendência atual é pensar no descarte de uma peça antes mesmo de ela ser inserida em um automóvel. Se não dá para aproveitar, ou se os materiais são nocivos, eles não entram. “Tem coisas que foram abolidas nos veículos. Usavam tinta com base em chumbo. Não tem mais. Pastilhas com amianto também foram banidas. A gente tem atacado os problemas mais urgentes de formas evolutivas. Descarte de bateria é controlado. As concessionárias acumulam e o reciclador recolhe de tempos em tempos. Para cada quatro pneus vendidos, você tem de reciclar cinco, no Brasil. Tudo para limpar a poluição anterior. Depósitos de pneus inservíveis estão diminuindo. Quando o item causa impacto muito grande no ambiente, entram legislações para tratar do problema”.

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A nova onda de carros híbridos e elétricos, que se por um lado produz níveis de emissões mais baixos – ou até mesmo conseguem zerá-los, no caso daqueles movidos exclusivamente a bateria -, por outro traz novos desafios na hora da despedida, principalmente no que diz respeito ao descarte das baterias. E os obstáculos não param por aí. “Hoje estamos partindo para o combate à poluição eletromagnética. Não só do veículo, mas de todos os emissores desses tipos de onda. Isso está poluindo muito o ambiente. Não é um risco de saúde pública, mas já tivemos casos de o veículo não funcionar adequadamente por interferência”, diz Orissaka.

ANOS 1960 Carro ao mar!

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Era assim que os suecos davam fim aos seus carros velhos: o dono pagava para que eles fossem jogados no oceano

ANOS 2010

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Hoje os carros são projetados e fabricados de modo a facilitar o desmonte e a reciclagem

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Etiquetagem: As peças recebem código padronizado que ajuda no processo de separação de materiais

Plásticos: Entre 15% e 20% das partes plásticas de um BMW são produzidas com materiais reciclados

Segurança: Airbags e pré-tensionadores do cinto são projetados para ser neutralizados na desmontagem sem oferecer riscos

Fluidos: Peças que contêm líquidos (óleo de motor ou câmbio, fluido de radiador ou freio) têm desenho que facilita a drenagem

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No Centro de reciclagem e Desmonte ao norte de Munique, carros aguardam para ser desmontados e ter as peças separadas para ser reaproveitadas, os líquidos drenados e até os gases do airbag recolhidos.

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