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Nosso adeus a Marco de Bari, amigo e fotógrafo

Em quase 30 anos de carreira, Bari deixa um legado difícil de mensurar. O artista de Quatro Rodas é insubstituível

Por Ulisses Cavalcante
Atualizado em 23 nov 2016, 21h20 - Publicado em 8 jul 2016, 20h50
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  • Marco de Bari
    Um dia típico de trabalho no autódromo de Interlagos ()

    Marco de Bari tinha duas habilidades incomuns: uma delas era seu talento para a fotografia. Um artista espetacular, cujas lentes nos levaram a descobertas que nossos olhares são incapazes de perceber. Mas isso é um detalhe. Outra aptidão que ele executava com maestria era a capacidade de transformar as pessoas. O “Vovô” sempre contagiou o ambiente em que estava com sua alegria e vivacidade. Não havia pessoa que, no mínimo, não o classificasse como “gente boa”.

    Ele se interessava legitimamente por todos os que cruzavam seu caminho. Bari levava meia hora para almoçar. E outra meia hora só para cruzar os 50 metros que separavam a redação da Quatro Rodas do restaurante da empresa. Ele não conseguia caminhar sem esbarrar em conhecidos. E esse privilégio ele viveu como ninguém: recebeu carinho e admiração no auge.

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    Marco de Bari
    Faturando o Prêmio Abril de Jornalismo de 2013 ()

    Daí o apelido. Chamá-lo de Vovô era o melhor elogio para o melhor da turma. Ao contrário do que acontece com os carros, pessoas melhoram conforme a quilometragem aumenta. E Bari tinha muita: 37 anos dedicados ao ofício. E quase 30 fotografando para a Quatro Rodas. Ele compartilhava conhecimento, técnica e experiência com quem fosse, com humor e disposição de garoto. Pelo menos duas gerações de fotógrafos automotivos foram formadas e influenciadas por sua obra.

    R8 da Audi, 911 Turbo da Porsche e SLS AMG da Mercedes, durante teste compartivo
    Audi R8, Porsche 911 Turbo e Mercedes-Benz SLS AMG ()

    Sem dúvida, Marco de Bari era o melhor fotógrafo de carros do Brasil. A técnica fotográfica e a sensibilidade no olhar se somavam a um profundo conhecimento automotivo. Apaixonado pelo trabalho e por carros, chegou até a aprender a pilotar – era um dos melhores pilotos da redação, aliás. Essa combinação se refletia nas páginas de Quatro Rodas: composições que destacavam os traços e detalhes que nenhum texto poderia descrever. Suas imagens, belíssimas, eram repletas de informações, perfeitas para atender os exigentes leitores da publicação.

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    Traseira do R8 GT modelo 2012 da Audi, durante teste da revista Quatro Rodas
    Audi R8 GT ()

    “Tenho ele como referência na minha carreira profissional. E continuará fazendo a diferença, mesmo tendo nos deixado”, afirma Guilber Hidaka, diretor da produtora Bufalos. Ele também era extremamente exigente com a integração entre o carro fotografado e a locação. Não admitia que fios, manchas de óleo no asfalto, postes ou reflexos na lataria interferissem em seus cliques. “Sempre fiquei impressionado com seu perfeccionismo e otimismo”, diz Alexandre Battibugli, fotógrafo (ex-Placar).

    Porsche 911 Turbo
    Porsche 911 Turbo ()

    A carreira na revista começou em 1989. Ele era um iniciante que raramente tinha a chance de fotografar carros, mas a ausência de profissionais na redação levou o editor da Quatro Rodas a chamá-lo para fazer a capa, de última hora. O Escort XR3 1.8 amarelo deu início a uma era que se estenderia até julho de 2016. Trabalhou quase 30 anos ininterruptos.

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    Testemunhou diversas reformas gráficas e reestruturações e fez parceria com quase uma centena de repórteres em uma quantidade incontável de matérias. Na sua última grande reportagem, Bari fotografou os takumis, mecânicos-artesãos que montam à mão os motores do Nissan GT-R e assinam suas obras ao fim de cada trabalho. Ele conferia o mesmo nível de esmero aos seus trabalhos. O fotógrafo estava entre iguais.

    Marco de Bari
    A primeira capa (julho de 1989) e uma das mais lembradas, com a Ferrari F40 (novembro de 1992) ()

    Bari adorava velocidade e realizou seu sonho registrando as grandes provas do automobilismo: Fórmula 1, 500 Milhas de Indianápolis, Le Mans. Conheceu alguns ícones – num trabalho primoroso, mostrou a intimidade de Ayrton Senna pouco antes do acidente que o mataria. Também passaram por seu crivo coisas que não tinham motor e pneus. Teve uma mostra dedicada a suas fotos sobre tatuagens, outro tema de que gostava. Palmeirense roxo, assistia a todos os jogos – no estádio ou no Bar do Tonico, reduto de palmeirenses em São Paulo, sua cidade natal.

    Marco de Bari
    Com o repórter Adriano Griecco nas 500 Milhas de Indianápolis ()

    Ayrton Senna testando o Audi S4 para a revista Quatro Rodas, no autódromo de Int
    Registro de Ayrton Senna testando o Audi S4 em fevereiro de 1994, dois meses antes de sua morte (Acervo/Quatro Rodas)

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    Vovô morreu jovem. Tinha 53 anos, nem era tão mais velho que os outros jornalistas da redação. Mas era o que mais sabia. É difícil entender. É difícil aceitar. Mas o mundo está aí fora para a gente descobrir e fotografar. Anote o que ele disse: “Temos que olhar e prestar atenção no que estamos vendo”. Também podemos nos esforçar para fazer como ele ensinou: seja bom com os outros e curta a viagem.

    Marco de Bari, fotógrafo, sobre o Fitti-Vê, monoposto de Fórmula Vê, construído
    Malabarismo para fotografar um raro monoposto Fitti-Vê, no Autódromo de Interlagos (Marco de Bari/Quatro Rodas)

    Bari não está mais aqui, mas não vai nos deixar. Vovô é pra sempre. A gente nunca se esquece do nosso. Saímos da infância, crescemos, tocamos a vida, mas a memória não se apaga – vive enquanto existirmos. Com a lembrança de Bari não será diferente: ficará impressa em nossos corações, em nossas mentes e nas milhares de páginas que ele publicou.

    Nós, amigos, somos muitos. Então teremos bastante coisa boa pra lembrar. Fora a saudade, que já bate forte, fica a primeira reflexão: nunca fomos só amigos. Somos fãs. E a gente te ama, Vovô.

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