Se você é dono de Gol, novo Uno, Peugeot 207 e Chevrolet Classic, todos sem airbag, saiba que acabou de ganhar um motivo para se preocupar com sua segurança. Segundo o Latin NCAP, instituto que testa modelos comercializados na América Latina e no Caribe, esses modelos oferecem grave risco de lesões fatais em caso de acidente. A pedido de QUATRO RODAS, o Latin NCAP reelaborou sua lista de carros já avaliados em crash tests aplicando sua nova regra, em vigor desde julho, que passa a seguir o mesmo rigor dos critérios adotados pelo tradicional Euro NCAP. Com a mudança, esses quatro modelos tiveram nota rebaixada de uma estrela para zero.
Uma das principais alterações ocorreu no sistema de pontuação do impacto frontal: a partir de agora, quando o dummy (manequim usado nos crash tests) sofre cargas que supõem uma lesão fatal, o carro automaticamente não pontua, ou seja, obtém a classificação zero estrela. “No critério anterior, mesmo que o dummy tivesse classificação ‘pobre’ (a mais baixa de todas) para cabeça, pescoço ou peitoral, o modelo poderia pontuar e obter uma estrela”, afirma o engenheiro Alejandro Furas, diretor técnico da Global NCAP, entidade que reúne outros institutos NCAP pelo mundo.
Desde 2010, o Latin NCAP já avaliou 32 modelos em quatro baterias de testes, que revelaram que a maioria dos carros testados apresenta graves falhas de segurança em colisões. Considerando que com uma classificação de até três estrelas o carro é reprovado no teste, o Latin NCAP conclui que na América Latina foram vendidas mais de 450 000 unidades em 2012 que apresentam sérios riscos à segurança. Entre os modelos reprovados, estão o atual Gol e o novo Uno, respectivamente líder e vice-líder do mercado em 2012 e também no primeiro semestre deste ano.
A análise do Latin NCAP considerou apenas os modelos comercializados em 2013 no nosso mercado. Mas a entidade salientou que não só os veículos com zero estrela oferecem perigo: os carros que tiveram a classificação de uma estrela também provocaram nos testes lesões que aumentam o risco de morte dos ocupantes (veja lista abaixo). Ou seja, zero ou 1 estrela, eles são potencialmente fatais.
Uma das razões apontadas por especialistas para um desempenho tão negativo estaria na estrutura dos veículos, que seria inferior à dos vendidos na Europa e nos EUA. “Isso pode ser constatado com a disparidade de resultados em testes realizados em modelos iguais pelo Latin NCAP e Euro NCAP”, diz o consultor em segurança veicular Marcus Romaro. O Nissan March recebeu só duas estrelas no teste do Latin NCAP, enquanto o mesmo modelo na Europa (batizado lá de Micra) foi classificado como cinco estrelas. Isso leva à conclusão que o automóvel fabricado no México apresenta diferenças estruturais relevantes em relação ao europeu.
Os especialistas dizem que uma das explicações para essa discrepância é a economia de aços de alta resistência na estrutura do veículo, que além de garantir a integridade da cabine contribui para reduzir o peso. “A participação de aços de alta resistência é de cerca de 8% no peso total dos carros brasileiros”, diz Francisco Satkunas, conselheiro da SAE (Sociedade de Engenheiros da Mobilidade). Para dar uma ideia de como estamos atrasados, a aplicação desse tipo de aço na indústria mundial ultrapassa 50% do peso do carro. O material é normalmente aplicado na coluna dianteira e central do veículo, além dos painéis laterais e arcos do teto.
Segundo Furas, há ainda outro tipo de economia na construção do veículo. “Em alguns casos pode-se retirar o reforço interno que há na coluna dianteira (que fica entre o para-brisa e a porta), para cortar custos”, afirma. Outro ponto destacado é a redução nas soldas. “Um carro fabricado na Europa pode ter mais pontos de solda e, portanto, ser mais resistente em comparação ao fabricado na América Latina. Isso muitas vezes é feito para poupar tempo na linha de montagem e também eletricidade”, diz Furas.
Uma pesquisa da consultoria IHS Automotive explica o que representaria essa diferença: as montadoras lucrariam 10% em cada veículo feito no Brasil, enquanto nos EUA o total seria de 3% e a média global, de 5%. Segundo a consultoria, a diferença estaria na economia do material utilizado, o que seria facilitado pela atrasada legislação brasileira. Enquanto na Europa o carro tem de ser aprovado no crash test, no Brasil a regra só se aplica a modelos que foram desenvolvidos depois de janeiro de 2012 – o que exclui Gol, Uno e companhia. Mas há uma boa notícia: a partir de 2014, todos os modelos comercializados, sejam projetos velhos, sejam novos, deverão ser aprovados em crash tests. Nesse ano também passa a valer a obrigatoriedade do airbag e ABS, algo adotado na Europa e nos EUA desde 1990.
Consultada, a Anfavea (que representa as montadoras no Brasil) respondeu em nota que nossos carros estão em linha com os padrões mundiais de segurança e que os modelos produzidos aqui seguem a legislação exigida no país.
Nota Máxima Carro cinco estrelas tem que passar pelo impacto lateral
Se antes já era difícil conquistar estrelas tanto no quesito de proteção aos adultos quanto no de segurança às crianças, agora está ainda mais complicado. Com as novas regras, para poder ser classificado com cinco estrelas no quesito de proteção aos adultos, os modelos deverão se sair bem no teste de impacto frontal e lateral, contar com quatro canais de ABS, tecnologia que permite também a instalação do controle eletrônico de estabilidade, e ainda apresentar o sistema que emite alerta sonoro quando os ocupantes dianteiros estão sem cinto de segurança. “O impacto lateral só é realizado em carros que obtêm nota máxima no crash test frontal”, diz Alejandro Furas, diretor técnico do Global NCAP. A partir de 2015, o impacto lateral será feito em todos os carros testados. Também a partir deste ano, para obter as cinco estrelas de proteção às crianças, os modelos deverão oferecer de série nos três principais mercados da América Latina (Brasil, Argentina e México) sistemas de retenção infantil, como o Isofix, usado para fixação das cadeirinhas. Anteriormente, para chegar à nota máxima, era obrigatório o sistema apenas em dois desses mercados. É importante ressaltar que o Latin NCAP é uma instituição independente de defesa do consumidor, que não tem interferência na legislação de homologação de carros vigente em cada país.
ZONA MORTAL Estes são os carros vendidos no Brasil que tiveram o pior desempenho. Com zero ou uma estrela, eles oferecem risco de morte aos ocupantes – mesmo equipado com airbag
Peugeot 207: zero
VW Gol 1.6: zero
Renault Sandero: ★
Chevrolet Celta: ★
JAC J3: ★
Ford Ka: ★
Chevrolet Classic: zero
Fiat Novo Uno: zero
Renault Clio: zero
Chevrolet Agile: zero
ZONA CRÍTICA Oito modelos tiveram duas ou três estrelas no programa, mas apenas os quatro abaixo são vendidos atualmente. Os veículos com essa classificação são considerados reprovados
Hyundai HB20: ★★★
VW Novo Gol 1.6: ★★★
Nissan March: ★★
Peugeot 207: ★★
ZONA DE PROTEÇÃO Os modelos aprovados, com avaliação acima de quatro estrelas, pertencem a categorias mais caras, como compactos premium e sedãs médios: a exceção é o Toyota Etios
Ford EcoSport: ★★★★
Toyota Corolla: ★★★★
Ford Focus: ★★★★
Chevrolet Cruze: ★★★★
Toyota Etios: ★★★★
Ford New Fiesta: ★★★★
Honda City: ★★★★
Renault Fluence: ★★★★
VW Polo: ★★★★