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Militec-1 pode ser corrosivo para o motor e não tinha registro, aponta ANP

Produto que promete reduzir consumo e aumentar a confiabilidade é apontado como danoso para o motor pela ANP por conter cloro; fabricante foi multada

Por Henrique Rodriguez Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 26 out 2022, 17h13 - Publicado em 14 ago 2020, 16h11
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  • Vendido como condicionador de metais, o Militec-1 tem em seu rótulo a promessa de redução de emissões e consumo do motor, aumento da confiabilidade e do desempenho, e redução de atrito dos componentes internos.

    Mas laudo da Agência Nacional de Petróleo (ANP), que circula nas redes sociais, revela que o produto deveria ter sido vendido com registro no órgão, tem erros na embalagem e que, na prática, pode ser danoso ao motor.

    Nota

    A empresa Militec Brasil Importação e Comércio Ltda. obteve uma liminar suspendendo a veiculação desta reportagem. A Editora Abril recorreu junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná e o Agravo de Instrumento concedido pelo Desembargador Roberto Portugal Bacellar suspendeu a liminar. A decisão destacou que o inteiro teor da sentença da ANP é público e que “há veracidade nas informações, consubstanciadas na reprodução e transcrições fiéis tanto do relatório de ensaio quanto do conteúdo da sentença administrativa, bem como referência de que a ausência de regular registro perante o órgão público e a conclusão de que a utilização do produto Militec 1 pode acarretar em “corrosão dos motores”. Logo, a princípio, pelo que temos nos autos até o momento, não se trata de “fake news” como alegado pela agravada”.

    A ANP coletou duas amostras do Militec-1 para análise do seu registro e de sua qualidade em 2018.

    ANP 1
    Clique na imagem para ter acesso à integra do ensaio da ANP (ANP/Reprodução)

    Foi constatada não conformidade em dois aspectos: o produto não estava registrado no órgão e, após análise laboratorial, constatou-se a presença de cloro na composição do produto – o rótulo afirmava não possuir parafinas cloradas. 

    “Contudo, ao realizar o ensaio de Espectrômetro de Fluorescência de Raio-X por Energia Dispersiva, que é uma técnica analítica para determinação de elementos químicos, percebe-se a presença deste elemento, em quantidades superiores a qualquer outro. A composição está em desacordo com a declarada pelo produtor. Destaca-se, ainda, que a presença de cloro pode levar à formação de cloretos ácidos, mesmo a baixas temperaturas (120°C), que podem ocasionar a elevação do índice de acidez do produto, acarretando em problemas de corrosão dos motores, diminuindo sua vida útil.”

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    Militec 3
    (Reprodução/Internet)

    A empresa Militec Brasil Importação e Comércio foi intimada a prestar sua defesa prévia. Disse que seu produto não se enquadra nas determinações da resolução nº 22/2014 e que há a “resolução ANP nº 804/2019, que revogou a obrigatoriedade de Registro do produto MILITEC-1”.

    Completou dizendo que a “presença de Cloro no produto conforme demonstrada por si só não nos traz elementos conclusivos sobre a formação de cloretos ácidos, pois não há um quantitativo do elemento, sendo assim, conforme descrito no relatório são suposições” e se comprometeu “a suprimir do seu rótulo, mediante a concessão de tempo hábil para substituição a menção “NÃO CONTÉM PARAFINA CLORADA'”.

    anp 2
    Clique na imagem para ter acesso à integra da decisão da ANP (ANP/Reprodução)

    Na decisão de infração, a ANP rebate.

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    Ao revés do alegado pela autuada, conforme prevê a Resolução ANP nº 804/2019, de 23/12/2019, em seu art. 24: “Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Ressalta-se que a própria autuada afirma em defesa que importava e comercializava o produto desde o ano de 2007. Desta forma, até o dia de publicação do novo texto normativo (Resolução ANP nº 804/2019), a Resolução ANP nº 22/2014 era a legislação vigente para o registro de aditivos em frasco para óleos lubrificantes de motores automotivos, claramente obrigando o produto MILITEC-1 a ser registrado.

    Atualmente, os chamados ‘aditivos em frasco’, como o órgão caracteriza o Militec, podem ser comercializados no Brasil sem a necessidade de registro na ANP.

    O ensaio realizado pela ANP rebateu a alegação de que a presença de cloro não é conclusiva.

    Militec 4
    (Reprodução/Internet)

    “A presença do elemento Cloro no produto é inequívoca e independe de ser originária de parafinas ou alfaolefinas cloradas. A presença desse elemento pode levar à formação de cloretos ácidos após algum tempo de uso, que podem ocasionar a elevação do índice de acidez do produto, acarretando em problemas de corrosão dos motores, diminuindo sua vida útil. Além disso, a presença de substâncias cloradas pode levar à fragilização das superfícies metálicas e das partes de vedações (selos).”

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    A Militec Brasil Importação e Comércio foi autuada pelas duas infrações. Multa de R$ 20.000 por produzir e comercializar aditivo para óleo lubrificante de motor automotivo sem registro ativo e R$ 20.000 por produzir e comercializar aditivo para óleo lubrificante de motor automotivo não conforme quanto à qualidade.

    A decisão foi publicada em abril.

    Hoje, a definição da Militec sobre seu produto em seu site é a seguinte:

    É um líquido sintético de coloração dourada, similar aos óleos SAE 10 em viscosidade. Mesmo que, na maioria dos casos, Militec-1, seja adicionado ao óleo, não é um aditivo de óleo, pois não contém melhoradores do índice de viscosidade, não al­tera a composição físico-química, nem o intervalo de troca de óleo. Militec-1 é um condicionador de metais.”

    A ANP foi procurada se limitou a dizer que está investigando como um documento sigiloso veio a público.

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    Já a Militec Brasil Importação e Comércio enviou a seguinte nota:

    A Militec Brasil informa que atende todos os requisitos legais necessários para a comercialização do produto Militec 1 no Brasil. 

    A empresa afirma que segue protocolos rígidos de qualidade e realiza testes em renomados institutos de pesquisa no Brasil, sem que exista nenhuma evidência até então de que o produto cause qualquer prejuízo a seus consumidores.

    A eficiência do Militec 1 é comprovada pelos mais de 5 milhões de consumidores brasileiros satisfeitos em 28 anos de mercado e pelo baixíssimo índice de manifestações recebidas em seus canais de atendimento (inferior a 0,001% nos últimos 12 meses).

    A marca esclarece que existem clientes que atestam os benefícios do produto no uso contínuo desde 1995.

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    A companhia confirma que é parte em processo de ordem administrativa junto à ANP (Agência Nacional de Petróleo), o qual está sendo julgado em primeira instância, e que aguarda notificação formal da sentença para se manifestar junto ao órgão.

    A Militec Brasil deseja com este comunicado reforçar seu compromisso de qualidade com seus consumidores e parceiros.

    A empresa também enviou duas cartas de homologação do produto para aplicações industriais, e não em motores, e-mail de equipe de competição motociclística (patrocinada pela Militec) elogiando o produto e um parecer técnico de 1999 feito pelo departamento de engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, feito a pedido de um representante da empresa em Minas Gerais. Pode ser acessado aqui.

    O parecer técnico apresenta “ausência total de ácido clorídrico” e afirma que o produto não tem parafinas cloradas. Contudo, não esclarece por quanto tempo a mistura testada foi analisada, se houve análise cíclica, nem consta se os testes foram feitos em motores, onde haveria reação com hidrogênio e comprometimento da lubricidade a médio e longo prazo. E isso é importante, como veremos a seguir.

    Como o cloro pode prejudicar o motor?

    De acordo com Eduardo Polati, mestre em engenharia mecânica, especialista em combustíveis e lubrificantes da consultoria em energia e propulsão Powerburst, a presença de cloro, seja por um composto organoclorado ou por uma parafina clorada, é danosa ao motor.

    “A intenção da ANP não era dizer quanto tinha, mas dizer que tinha e que o rótulo estava errado. Que o produto tem cloro. O ensaio da ANP mostra índice de acidez total (IAT) de 0,17 mg/g, o que quer dizer que foram necessários 1.700 ppm de hidróxido de potássio para neutralizar o composto ácido no produto. É muito, por mais que se considere que será diluído no óleo do motor. No máximo poderia ter 10 ppm de cloro, que é uma contaminação de processo.”

    A Militec recomenda, em seu site, a adição de 200 ml do produto para cada 4 litros de óleo lubrificante.

    Eduardo explica os malefícios do cloro no motor:

    “O Militec tem organoclorado no principio ativo, que é um cloro ligado a um carbono-hidrogênio. Dentro do motor esse cloro vai reagir com o hidrogênio resultante da mistura incompleta do combustível e se transformar em ácido clorídrico, que por sua vez reagirá com os aditivos detergentes do óleo. Ao longo do tempo, vai comprometer a eficiência do lubrificante.

    É um aditivo que pode causar um malefício para o motor a médio e longo prazo. Ele também diminui a viscosidade do óleo e compromete a quebra de espuma no óleo – que é evitado no com o aditivo de silício orgânico adicionado aos óleos disponíveis no mercado”.

    Polati ainda aponta que a adição de condicionador de metais ao óleo do motor por conta própria não é necessária. “O aditivo antidesgaste é um um condicionador de metal. Ele combina com a superfície oxidada do motor, que é muito suscetível ao cisalhamento, e funciona como um polimento superficial químico. Pode ser a base de zinco, fósforo ou ésteres fotofosfatados, por exemplo.”

    “O aditivo antidesgaste tem uma característica ácida, mas não é agressivo. Até porque os detergentes, que são aminas, dão alcalinidade ao óleo. Ele vai dar limpeza e é um anticorrosivo e antioxidante, que atua se unindo aos óxidos. Essa propriedade se desgasta naturalmente, mas depois do prazo de troca de óleo recomendado pelo fabricante. Com um ácido agressivo na mistura, gerado da adição do organoclorado, o óleo vai perder a propriedades mais rapidamente, possivelmente antes da troca de óleo. E quando o aditivo deixa de funcionar a acidez do óleo e a corrosividade dele cresce exponencialmente”, completa Polati.

    Desta forma, além dos possíveis problemas de corrosão dos motores e fragilização das superfícies metálicas, apontados pela ANP, o Militec também comprometeria as propriedades lubrificantes do óleo do motor. E, consequentemente, o motor.

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