Lá se vão 25 anos desde aquele domingo inesquecível para muitos fãs de Fórmula 1. Era a oitava tentativa de Ayrton Senna vencer o GP do Brasil desde sua estreia na F-1. Embora já tivesse dois títulos mundiais no currículo, vencer em Interlagos parecia ser a sina de Ayrton. De problemas mecânicos a problemas com retardatários (leia-se Satoru Nakajima em 1990), sempre havia um obstáculo separando Senna da glória em casa. Mas esta história estava prestes a mudar em 1991.
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A arquibancada já havia ido ao delírio no sábado com a pole-position de Senna. Depois de fazer uma boa largada, o brasileiro rapidamente se distanciou de todos os rivais, menos um: Nigel Mansell. A cada volta completada, o “Leão” diminuia um pouco mais a distância para o líder. Riccardo Patrese também estava rápido, mas não o suficiente para acompanhar os dois primeiros. Uma trapalhada da Williams fez Mansell perdeu tempo demais nos boxes. A sorte parecia sorrir para Senna, que realizou seu pit-stop em menos de sete segundos e ainda voltou à frente de Patrese.Foi aí que Mansell resolveu agir e explorou todo o potencial da veloz Williams para se reaproximar de Ayrton. Mas o inglês levou seu carro ao limite e logo sofreu com o desgaste dos pneus, voltando a se afastar da ponta. Na volta 52 a garoa (sempre ela) começou a cair em Interlagos, deixando a prova ainda mais emocionante. Mesmo sofrendo com outra parada desastrosa, Mansell recuperou o ritmo e quando parecia que ia tomar a liderança aprontou uma das suas e rodou sozinho.
Parecia que era o dia de Ayrton. A vantagem de Senna era de quase 40 segundos para o agora segundo colocado Patrese. Mas o fantasma de Interlagos voltou a assombrar Senna quando a diferença entre eles caiu para apenas 14 segundos em poucas voltas. Algo estava errado com a McLaren. Problemas no câmbio fizeram Senna perder quase todas as marchas pouco a pouco. Na volta 66, o brasileiro guiava apenas com a sexta marcha, mas sabia que precisava chegar até o final.
Patrese continuava se aproximando, mas não havia mais tempo para mudanças. Senna abriu a última volta cautelosamente. Completou os 4.392 metros do Autódromo José Carlos Pace na ponta dos dedos e desabafou. Começou a gritar loucamente no rádio enquanto a multidão explodia com a primeira vitória de seu ídolo. Senna para o carro na Reta Oposta e os fiscais não sabiam se o ajudavam ou celebravam. Um deles tenta entregar uma bandeira brasileira, mas não consegue conter a alegria do momento. Enquanto isso, Senna recebia atendimento médico no próprio carro. Conduzido ao pódio, o piloto mal consegue levantar o troféu. Faz um último esforço e ergue a taça visivelmente fragilizado, mas feliz pelo momento que por tanto tempo esperou: a primeira vitória em casa.
Releia abaixo o depoimento exclusivo concedido a QUATRO RODAS sobre o memorável GP do Brasil de 1991, publicado na edição 369.
“Depois de conseguir em Interlagos uma das vitórias mais emocionantes da minha vida, eu não imaginava que teria um novo desafio em seguida: entrar na minha própria casa, no bairro de Cantareira, em São Paulo. Vocês podem não acreditar, mas foi uma missão quiase impossível chegar perto dos meus familiares para comemorar a primeira conquista num GP do Brasil.
Nunca havia recebido tantas visitas. Para entrar pelo portão, eu e os policiais, que estavam escoltando a minha perua, ficamos pelo menos uns dez minutos esperando. Eu gostaria muito de sair do carro e falar com cada um dos meus fãs, mas com tanta gente no local seria impossível e até perigoso para todo mundo. As pessoas foram, então, se aglomerando em volta do carro. Lá dentro, a impressão era de que estavam amassando tudo. Comentei assustado com o meu irmão. Mas o Leonardo nem se preocupou. “Becão, não liga. Se amassarem, a gente guarda essa perua como troféu e compra outra”. Só mesmo uma vitória no GP do Brasil para ele brincar naquela situação. Se fosse em outro dia…
Acabei entrando em casa por volta das 18h. Aí então pude, pelo menos, acenar por cima do muro para os meus ilustres visitantes. Fiquei um bom tempo ali. Quatro horas depois ainda havia bastante gente no portão. Resolvi voltar e, com a eficiente ajuda dos policiais, pude ficar mais perto dos meus fãs. Estava realmente cansado. O GP em Interlagos foi a prova mais desgastante da minha carreira. Depois de enfrentar os problemas no câmbio a partir da 60ª volta, cheguei ao pódio com espasmos musculares nos braços. Vocês nem imaginam o sacrifício que foi levantar o troféu. Acho que agradeceria se recebesse apenas uma medalha, como na corrida dos Estados Unidos. Mas ganhar só isso não tem muito a ver: acabei esquecendo a medalha no bolso do macacão. E ficou tudo por lá no caminhão da McLaren em Phoenix.
Apesar de todo cansaço, vou lembrar para sempre a emoção de receber a bandeirada em Interlagos. Principalmente por ter ficado apenas com a sexta marcha nas últimas voltas. Foi uma corrida tão especial que, após ser obrigado a passar por duas sessões de massagens com o fisioterapueuta da equipe (uma no boxe e outra em casa), ainda encontrei forças para assistir a todo o teipe do GP no vídeo. Só fui dormir às 2h da madrugada.
Na verdade, este início de temporada tem sido perfeito. O primeiro exemplo aconteceu logo na abertura, em Phoenix: vitória de ponta a ponta com pole. Sem contar a vantagem de mais de 40 segundos sobre o segundo colocado. Muitas pessoas dizem que eu forço demais o carro. Não é verdade. A vantagem aberta nos Estados Unidos foi porque o meu McLaren estava ótimo. E eu até poderia ter andado mais rápido. mas já estava satisfeito com o desempenho do novo modelo MP4/6, que, quase sem nenhum teste, conseguiu colocar dois segundos por volta em equipes que treinaram durante todo o final do ano passado.
Não me sentia tão bem desde 1988, quando a McLaren tinha um carro tão superior que vencemos 15 das 16 corridas. Nos Estados Unidos, ainda fiz minha tradicional escala em Miami, onde revejo uns amigos queridos e ainda aproveito para fazer umas comprinhas. No Brasil… Bem, no Brasil, comemorei meu 31º aniversário na quinta, dia 21 de março, mas só fui receber o presente no domingo. E que presente!”