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Aviões estão ‘enlouquecendo’ por causa de GPS falso em zonas de guerra

Jatos comerciais evitam sobrevoar países em guerra, mas nem isso está evitando que eles sofram com técnicas que buscam desorientar mísseis e drones inimigos

Por Eduardo Passos
22 mar 2024, 17h03
Voos entre Europa e Qatar estão entre aqueles afetados pelos sinais falsos de GPS
Voos entre Europa e Qatar estão entre aqueles afetados pelos sinais falsos de GPS (Divulgação/Qatar Airways)
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Nos últimos dois anos, as guerras cresceram e chegaram à vizinhança da União Europeia, ao mesmo tempo que os conflitos do Oriente Médio aumentaram. É a era dos combates transmitidos ao vivo por redes sociais, com amplo uso de drones e ataques de mísseis que são precisamente guiados.

As defesas também se adaptaram, e, cada vez mais, há mecanismos que bloqueiam ou falsificam sinais de GPS para impedir ataques de precisão. O problema é que não dá para controlar quem será afetado por essa medida, e os aviões comerciais estão sofrendo cada vez mais com isso.

General Atomics MQ-9 Reaper
MQ-9 é drone militar dos EUA que frequentemente sobrevoa a região da Ucrânia (Leslie Pratt/Wikimedia)

Desde o ano passado, cresceram os incidentes nos quais jatos de passageiros perdem o sinal de GPS e até ‘enlouquecem’, como no vídeo compartilhado pelo ex-comandante da TAP, José Correia Guedes. As imagens foram cedidas sob anonimato por um colega do português, mostrando um Boeing 777 que voava 12 km acima do Golfo Pérsico: o sinal de GPS não apenas foi perdido, como também soaram os alarmes de proximidade com o solo, ainda que nem o monte Everest chegue perto da altitude em que o jato estava.

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O site alemão Aero.de relata o caso de outro 777, cuja tripulação acreditava estar acima de Tel Aviv, em Israel, mas já estava no espaço aéreo do Egito. Outro caso foi do Embraer Legacy 650 que ia da Europa para Dubai e, durante o voo, teve sua rota no GPS alterada em quase 150 km. Durante o incidente, por pouco a aeronave fabricada em São José dos Campos (SP) não entrou no espaço aéreo do Irã sem autorização.

Risco oculto

A estratégia de “embaralhar” a comunicação do inimigo é antiga: na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, os Aliados se preparavam para o Dia-D e mandavam mensagens para a Resistência Francesa através de frases insuspeitas, durante transmissões de rádio da BBC e outras emissoras. No vídeo abaixo, o ruído bizarro é justamente o modo que os alemães tentavam barrar a comunicação, através do chamado jamming.

Na era do GPS, o jamming funciona emitindo ondas eletromagnéticas que barram o contato com os satélites, e há relatos desse método desde a Guerra do Iraque, pelo menos. O problema é que, agora, o spoofing está ganhando força. 

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Como é fácil notar que o sinal de GPS está sob interferência, o spoofing age enganando o veículo que obtém a localização através de sinais fabricados. No caso de um drone militar, por exemplo, ele pode achar que está chegando ao lugar que deve atacar mas, na verdade, chega a quilômetros dali, em zona com defesas antiaéreas que irão abatê-lo.

No caso dos aviões comerciais, entretanto, esse desvio pode ser fatal, uma vez que as rotas entre Europa e Ásia (que antes atravessavam Ucrânia e Rússia) agora utilizam corredores estreitos bem ao sul do mar Negro. É justo ali onde há maior incidência do spoofing, segundo dados do FlightRadar24, e aí fica fácil sobrevoar um país em guerra por acaso.

Mapa Spoofing GPS
Blocos em vermelho indicam alta incidência do spoofing em lugares como Polônia, Turquia e Oriente Médio (FlightRadar24/Divulgação)

Situação parecida, com desfecho trágico, viveu um Boeing 747 da Korean Air em 1983. Em voo dos EUA para a Coreia do Sul, a tripulação se confundiu e um erro de posicionamento fez o Jumbo invadir uma pontinha da União Soviética, cuja Força Aérea derrubou a aeronave e matou 269 pessoas.

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À moda antiga

Os aviões comerciais utilizam, há um bom tempo, o IRS, um sistema de navegação do tipo inercial que aplica as leis de Newton para saber a posição desde que a partida seja dada de um lugar conhecido. O GPS (e sistemas parecidos de outros países) se juntaram para aumentar a precisão do IRS, fazendo correções em tempo real.

Exemplo de bomba russa guiada pelo GLONASS, o GPS do país de Putin
Exemplo de bomba russa guiada pelo GLONASS, o GPS do país de Putin (Vitaly V. Kuzmin/Wikimedia)

Segundo a Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO), o perigo maior do spoofing é justamente não saber que ele está ocorrendo. Logo, uma vez ciente da “fraude” no GPS, a tripulação pode recorrer ao controle de tráfego aéreo para obter as direções até o destino.

É importante que quem voe perto de zonas de guerra consulte os boletins que informem sobre problemas no sinal de satélite. Outra saída é recorrer às boas e velhas ondas de rádio: desde sempre, um dos métodos mais comuns de navegação aérea é sintonizar estações específicas para que o avião aponte a direção e distância delas. Daí em diante, cabe aos aviadores o uso do lápis e da geometria para chegarem à moda antiga ao aeroporto.

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