Ainda me lembro quando tinha uns 10 anos de idade e meu pai me levou a uma pista de autorama. O cheiro de oficina mecânica, o barulho dos motores e os carros coloridos passando em uma velocidade absurda conquistaram meu coração de imediato. Lembro que os olhos do meu pai também brilhavam, afinal de contas, na infância, ele havia pilotado esses carrinhos endiabrados.
Quando meus amigos souberam, a novidade virou febre. Todos ganharam seus carrinhos e íamos juntos às pistas de autorama da cidade – em especial na famosa Parolu, que até hoje fica no bairro do Itaim Bibi, em São Paulo.
Ali, o dono, Paulo Gonçalves, um jovem campeão mundial de automodelismo, atendia os clientes (em sua maioria adultos) com o entusiasmo de criança.
Os anos se passaram e as brincadeiras mudaram, mas nunca abandonei o gosto pelo hobby, tendo voltado a andar outras vezes quando adolescente e também adulto.
Trinta anos depois do meu primeiro contato com o autorama, voltei à Parolu Automodelismo. Desta vez com a missão de escrever esta reportagem, e fiz uma viagem no tempo cheia de boas recordações. Aquele campeão de automodelismo, Paulinho para os frequentadores, hoje com 59 anos, continua com a mesma disposição de trinta anos atrás.
Em uma quarta-feira fria (no dia exato que a loja do Paulo completava 42 anos de vida), em meio à pandemia, fui acompanhar uma corrida da categoria F-Koford – carros de escala 1:24, com chassi de metal e um motor que usa uma caixa de fabricação chinesa e induzido Koford, um famoso fabricante de itens para o hobby.
Há ainda preparação do motor, balanceamento e rebaixamento dos pneus. Nesse campeonato, a carroceria muda a cada corrida, pois a aerodinâmica de cada réplica muda a tocada (o som do carro cortando o ar é muito semelhante ao de uma pista de corrida, em especial dos LMP2 híbridos). Nesse dia, foi um Toyota.
Carros dessa categoria completam uma volta em torno de 3 segundos. A pista tem a extensão de 47 metros lineares. Faça a conta: eles andam a 56,1 km/h de média. Parece pouco, mas impressiona.
O modelo de carro recordista mundial fez esses mesmos 47 em apenas 1,2 s, ou seja, média de 141 km/h. Mas o que mais cativa é o ambiente familiar, tanto no sentido de já ter vivido aquilo quanto no fato de as pessoas serem muito solícitas, educadas e amigáveis. No final da noite, Já me sentia enturmado com o pessoal.
Outra felicidade foi conversar com o Tico, de 52 anos, e seu filho Leo, de 15 anos. Tico, que havia andado de autorama na adolescência, ano passado resolveu voltar. Mas nesse retorno trouxe seu filho. Ambos competem na F-Koford todas as quartas à noite. Aos sábados, vão treinar juntos.
E, falando com os dois, você enxerga o laço criado ali, entre pai e filho, nas pistas. Segundo Tico, é uma terapia, um momento fora de computadores e videogames, só ele e o filho. O Leo vibrou ao contar de como ele achava legal aquilo tudo, lembra-se de quando ganhou seu primeiro carro e diz que chorou ao participar de sua primeira corrida.
Deixei o pessoal em paz, para eles poderem preparar seus carros para a tomada de tempo. Eram 12 competidores que iriam correr em duas baterias. No autorama, ganha quem der mais voltas. Todos correm por 3 minutos em cada fenda, são oito no total e cada uma tem sua particularidade na pilotagem.
Um computador com aferição semelhante ao de corridas de automóveis faz a contagem das voltas de cada participante, tudo é controlado pelo diretor da prova, que nesse dia foi o próprio Paulinho.
Leo marcou um tempo melhor que o do pai, mas uma quebra de motor o tirou da disputa. Mesmo assim, ele terminou a corrida em sétimo lugar.
Entre uma fenda e outra, o carro precisa de reparos rápidos, então quem não está competindo faz o “box” de quem está correndo. A disputa é acirrada, mas todos se ajudam. O automodelismo é o hobby mais barato para quem gosta de carros. Com R$ 550 você compra seu carro e mais R$ 270, o controle. Se quiser se aventurar na categoria F-Koford, o custo sobe: o carro sai por R$ 1.100 pronto para a corrida.
Se você gosta de botar a mão na massa e preparar o bólido do seu jeito, se prepare. Você escolhe a carroceria (tem desde uma Brabham BT52 até uma caminhonete hot rod americana dos anos 1950), o motor, o chassi, a relação de coroa e pinhão, o diâmetro do pneu e muito mais.
Confesso que depois disso tudo, tomei duas decisões: voltar a acelerar meus carrinhos e apresentar o autorama às minhas filhas!
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