A austríaca KTM Motorcycles AG acaba de assumir os negócios da marca laranja no Brasil, em joint venture com o Grupo Izzo – que reacerta o passo depois do rompimento com a Harley-Davidson. Os planos da marca incluem montagem em Manaus. Para estrear como novo cartão de visitas, a marca escalou a 990 Super Duke, uma naked com alta dose de adrenalina.
Logo de cara ela impressiona pela concentração: é uma “mil”, embora não sua identidade oficial assuma inteiramente a cilindrada de 999 cc distribuída em dois cilindros em V a 75 graus. E, para uma “mil”, é bem pequena, uma diva cheia de personalidade. Na verdade, ela é curta e compacta, mas alta à beça, quase como uma supertrail, com o – bom – banco a 85 cm do solo.
A ergonomia é boa, assim como a posição de pilotagem, relaxada, levemente inclinada à frente – instigante. Os pilotos altos se encaixam bem na moto. Como toda a geração Duke à qual pertence, a 990 é naked, desprovida de proteção aerodinâmica. A moto acelera como uma superbike e quando a velocidade sobe (e como sobe!), a combinação de guidão largo e banco alto requer força para não ficar para trás, suspenso no ar como numa história em quadrinhos.
Quando você se acostuma e começa a explorar os limites, começa a sedução. Você estica a primeira cuidadosamente, para não virar para trás nem detonar a embreagem, e mete uma segunda mais forte. Confiante, gira o punho mais um pouco. A roda dianteira levanta fácil e a moto continua a andar firme, ganhando velocidade com a roda traseira. Dá para fazer a gracinha até a terceira marcha sem esforço. O torque de 10,2 “quilos” a apenas 7000 rpm é brutal para o peso de 186 kg (seco). Gostoso demais. Deve ser para isso que foi bolada a largura do guidão, uma linda peça cônica de alumínio.
POUCA ROUPA Toda a moto é bem vestida, chique no laranja de rigor e no pretinho básico fosco, combinação clássica. Desfila grifes do bom e do melhor: suspensões White Power (marca que pertence à KTM) invertidas na dianteira e multirregulável com links atrás, rodas Marchesini assinadas, freios Brembo de última geração.
As linhas angulosas que parecem feitas por lâmina são marca registrada da KTM. A 990 Super combina sua pouca roupa talhada sob medida com detalhes que valorizam o visual. A moto parece ter algo em comum com as italianas Ducati, desde o uso esportivo do motor V2 ao quadro. A estrutura de treliça tubular é uma peça à parte: transmite robustez, rigidez estrutural nas curvas, dá pinta de produto caro e sofisticado. Sob essa arquitetura moderna grita o famoso motorzão LC8 V2 a 75 graus de oito válvulas com duplo comando, que rende 120 cv a 9000 rpm – criado para correr o Paris-Dakar e depois proibido na competição, pelas altas velocidades atingidas nos desertos, incompatíveis com o terreno, segundo os organizadores.
O tanque de combustível parece grande para as proporções da motocicleta porque é alto, mas combina com as abas laranjas que o ladeiam e direcionam o ar fresco para o radiador.
Na frente, o farol em forma de escudo leva – quase embutido – o minúsculo painel combinado de conta-giros analógico redondo e tela de cristal líquido retangular e oferece velocímetro, hodômetro com duas parciais, relógio, termômetro e as luzes-espia de praxe.
Do estreito banco para trás, quase nada. O assento termina em uma lanterna minúscula, que subtraiu a rabeta. Semiocultas por suas laterais bicolores (laranja e prata) aparecem as ponteiras de escape de aço com bocal chanfrado, uma beleza, um trabalho que parece saído da prancheta de um escultor cabeludo e grisalho. Não fosse a rabeta preta com porta-placa que prolonga o paralama traseiro, minimalista e quase inútil na chuva, a moto pareceria ainda mais curta. A peça avança até o fim da roda e alonga um pouco o visual.
DIVERSÃO As suspensões WP montam na dianteira bengalas invertidas de 48 mm de diâmetro totalmente reguláveis. Copiam muito bem o asfalto, conferindo segurança em qualquer situação. A traseira veio ajustada para uso esportivo, um pouco dura para as ruas, privilegiando a estabilidade e a aderência em curvas em detrimento do conforto. Dirigibilidade e agilidade são os pontos fortes da Super Duke. Ela é fácil de deitar nas curvas e mudar de trajetória. Seu pequeno ângulo de esterço não compromete a mobilidade no trânsito. O entre-eixos bem reduzido causa alguma oscilação nas curvas mais amplas, de alta velocidade, mas os pneus Pirelli Super Corsa III dão segurança extra em situações extremas.
O V2 tem a pegada característica da configuração, transbordando torque desde baixos giros e subindo rápido até a faixa ideal de aproveitamento do torque e da potência máximos, entre 7000 e 9000 rpm, respectivamente. É nesse intervalo que a mágica toda acontece.
Os números de desempenho aferidos na pista são quase iguais aos da irmã Supermoto T990. Da imobilidade aos 100 km/h levou 3,8 segundos, contra 3,71 da SMT. A Super Duke atingiu os 200 km/h em apenas 14,2 segundos, quase 1 segundo mais rápida que os 15,06 da supermotard. As retomadas também foram bem próximas e a Super Duke só levou a melhor na prova de 100 a 130 km/h em sexta marcha, por uma diferença de apenas 3 décimos de segundo – 3,7 contra 4,01 segundos, respectivamente. Os 10 kg a menos que ela carrega fizeram diferença na velocidade final na pista de testes. A Super Duke cravou 228,7 km/h, contra 218 da Supermoto T. Diferença insignificante, tendo em vista que ambas têm propostas diferentes e, apesar do motor, nenhuma delas é uma puro-sangue esportiva: essa proposta está a cargo de outra KTM, a RC8.
A Super Duke coloca-se no competitivo mercado das naked de alta cilindrada como uma das melhores e mais divertidas opções. Se não tem a desenvoltura e os altos giros dos motores tetracilíndricos, por outro consegue entregar o prazer da pegada de um V2, que empurra lá de baixo com torque abundante. A maneabilidade é ponto forte e a deixa como candidata a moto para o dia a dia. (Por que não, afinal? Não dizem que é necessário apimentar a rotina?)
Para levar garupa é preciso pensar duas vezes: a vida atrás do banco é difícil. Não há alça para segurar e a tentativa de achar uma pode custar uma queimadura nas mãos. O V2 tem a característica de dar trancos em baixa velocidade, fonte de solavancos para o garupa. O preço de 51900 reais é atraente para o nível e padrão de qualidade do projeto e dos componentes, quase todos de grifes disputadíssimas. Dessa laranja se tira suco de primeira, como se vê.
TOCADA O motor tem torque de sobra para atiçar os ânimos a qualquer momento e a ciclística permite ir bem próximo do limite sem esforço ou risco, o que garante muita diversão.
★★★★
DIA A DIA Divertida, a 990 pode facilmente ser o principal meio de locomoção diário. Só tem restrições quanto ao garupa.
★★★
ESTILO O visual impressiona a todos indistintamente. Por onde passa é a protagonista – e faz a galera torcer o pescoço.
★★★★
MOTOR E TRANSMISSÃO A sensação de pilotagem é instigante, culpa do raçudo propulsor V2. O câmbio tem engates suaves, porém um pouco barulhentos.
★★★★
SEGURANÇA A qualidade de quadro, suspensões e freios, somada aos bom pneus Pirelli, garante a segurança na tocada.
★★★★
MERCADO Apesar de não ser novidade, a Super Duke marca o ingresso oficial da KTM no país. As perspectivas de maior presença no mercado são alvissareiras.
★★★★