No início dos anos 60, chassis de Fusca saíam rodando da fábrica da Volkswagen, na Via Anchieta. Alimentados por latas de gasolina, que faziam as vezes de tanque, seguiam em direção à sede da Karmann Ghia, distante alguns quilômetros.
Lá era assentada a carroceria, num processo totalmente manual, em que cada KG ganhava de 10 a 14 quilos de estanho durante a montagem. Graças a esse peso extra, ele não tinha “emendas” aparentes. Depois de pronto, cabia à rede de concessionários da VW a comercialização e a assistência técnica. Aqui ele era uma excitante novidade. Mas lá fora já rodava havia tempo.
No dia 14 de julho de 1955 o Karmann Ghia foi apresentado à imprensa. Nasceu da união do fabricante de carrocerias alemão Wilhelm Karmann com o italiano Luigi Segre – designer do estúdio Ghia –, que recebeu uma participação em cada unidade vendida. A idéia era fabricar um carro com linhas esportivas para bolsos menos abonados. Logo no início da produção, 50% dos carros eram exportados para outros países europeus, além de Estados Unidos e Canadá.
O aspecto esportivo era realçado por suas proporções e pelo perfil aerodinâmico. Baixinho mas esbelto, ele tinha 1,33 metro de altura e 4,14 metros de comprimento, com peso de 820 quilos.
Esportivo de fato ele nunca pretendeu ser. Faltava-lhe aquilo que distingue os bravos, o coração. Não seria com o honesto, porém raquítico 1200, de 36 cavalos, refrigerado a ar que o KG ia conseguir impressionar alguém. No cronômetro, ele não ia além dos 118 km/h de máxima. E a aceleração era de fazer adormecer criança levada: mais de 30 segundos para ir de 0 a 100 km/h.
Foi assim até 1967, quando passou a dividir com a Kombi o motor 1500 e ganhou 16 cavalos. Longe de virar um foguete, pelo menos já não dava vexame: chegava aos 135 km/h e baixou mais de 4 segundos no 0 a 100 km/h. A linha cresceu com a chegada do conversível, no começo de 1968, do qual só foram produzidos 177 exemplares.
Com uma cabine projetada para dois, o Karmann Ghia foi homologado para levar cinco passageiros (!). Na realidade, o banco de trás podia, quando muito, acomodar duas crianças, na época em que a ignorância a respeito de segurança dispensava o uso de cadeirinhas. Mas o encosto esconde um artifício que deve ter ajudado casais na hora de viajar com bagagem: é possível rebatê-lo e acomodar volumes entre o banco e o compartimento do motor.
O KG amarelo-margarida (é o nome oficial da cor) com teto preto marca no hodômetro 31.000 quilômetros. O estepe ainda tem o selo original na banda de rodagem. Ao dar a partida, o som desperta o sentimento de algo familiar. É a batida saudável de um 1200, em estado de novo, uma suavidade que os 1300 e 1500 não têm – esses produzem um som mais áspero. Só os 1600 têm uma sonoridade igualmente harmônica.
No interior, os bancos são revestidos com tecido entremeado de fios metálicos. O painel tem os instrumentos básicos. Como diferenciais, a parte superior, que era revestida de courvin, e um relógio, o único “luxo”. Conta-giros? Ora!
Apesar da pouca potência, na cidade o motor 1200 dá conta do recado, graças a sua elasticidade. Também não pede trocas freqüentes de marcha, como seria de esperar. Relativamente silenciosa, a suspensão por barras de torção não apresenta ruídos e tem uma resistência que dispensa comentários.
O bom diâmetro de giro e o grande volante facilitam as manobras. O câmbio mostra a precisão dos antigos VW e em poucos minutos ganha-se intimidade com o carrinho, mesmo com a boa diferença de altura em relação aos outros carros.
Até 1972, último ano de sua fabricação, foram produzidos 23.400 carros na versão original cupê. Em 1970, ganhou o motor 1600 e um irmão, o modelo TC, equipado com dois carburadores. Suas linhas lembram – ainda que vagamente – o Porsche 911.