Nos últimos meses, surgiram várias notícias sobre carros autônomos. Mas ainda há muitas questões a resolver antes que possam ser usados livremente nas ruas. Além dos problemas técnicos, que não são poucos, há desafios éticos. O que um carro sem motorista fará se, numa emergência, ele tiver de se confrontar com a decisão de quem matar? Você, o dono dele? Ou todas aquelas pessoas no ponto de ônibus que ele vai atropelar para salvar sua vida?
E daí vem a pergunta mais importante de todas: para quê? Você manda seu carro sem motorista para fazer algo na cidade, ele encontra um local para estacionar, entra direitinho na vaga, sem um arranhão, e… e… e então o quê? Ele não consegue entrar na padaria e comprar pão, consegue?
Para que um carro sem motorista possa ser útil, antes ele precisa ser um carro. E, se for um carro, que é um dispositivo de transporte pessoal, você pode tomar conta da tarefa de dirigi-lo. Porque dirigir não difícil. É só sentar ali e desviar de coisas.
Eu tive o gostinho de andar em um carro autônomo, quando passei a semana com um Mercedes S 63 AMG Coupé. Ele tinha o pacote completo. Podia andar por uma rodovia sem qualquer intervenção minha. Ele podia detectar um risco de acidente e travar os freios, para ativar os pré-tensionadores dos cintos de segurança. Também podia identificar pedestres e prever o que eles fariam em seguida, e então adotar ações evasivas para não atingi-los. Meu trabalho era apenas desembarcar ao fim da viagem, parecendo tão relaxado como naquelas propagandas de destinos turísticos.
Mas comigo isso nunca aconteceu, porque a eletrônica mais inteligente não é tão inteligente quanto a pessoa mais burra. Tomemos o humilde sensor de estacionamento. Em qualquer baliza no centro da cidade, ele começa a apitar e gemer quando está a 1 metro de um obstáculo. Isso não serve para nada. Quando estaciona o carro, você está sempre a 1 metro de alguma coisa. Você precisa de um lembrete é quando está a 3 mm.
Esse é o problema que atrapalha o Mercedes. É algo bem inteligente que ele possa “ler” a velocidade do carro à sua frente e manter uma distância constante. Mas como o motorista da frente vai saber que você quer ultrapassá-lo, se a eletrônica o segura a 5 km da traseira dele? Depois teve uma mudança de direção de última hora que eu precisei fazer para me livrar de um veículo que estava muito perto do meu. Era certo que eu podia acelerar e entrar na frente dele, mas o Mercedes não concordou e assumiu o controle do volante e dos freios.
Eu culpo os advogados do mundo por tudo isso. A Mercedes sabe que pode aumentar as tolerâncias para níveis razoáveis, mas, se fizer isso e houver um acidente, qualquer advogado poderia conseguir um monte de dinheiro em uma ação judicial. “Os senhores esperam que acreditemos que este carro poderia passar por um espaço com apenas 3 mm de folga?”
Bem, no fim das contas, depois de apenas dois dias eu desliguei todos os recursos de assistência à direção e passei a usar o Mercedes simplesmente como um carro.
Ele tem uma aparência magnífica. Meu carro de teste tinha chamativas pinças de freio vermelhas e cristais Swarovski opcionais nas luzes diurnas e nos piscas. Mas, fora isso, era uma combinação ameaçadora de protuberâncias de força e do tipo de visual de zinco escovado que você encontra naquelas lojas de utensílios caríssimos de cozinha gourmet.
Dentro, havia couro acolchoado e a sensação de estar na primeira classe de uma empresa aérea do Oriente Médio. É o tipo de carro que você fala “hummm” ao se ajeitar no banco e fechar a porta. Até o cinto de segurança é entregue a você por um mordomo. No entanto, depois de parar de fazer “hummm” e desligar toda a paranoia eletrônica, é hora de andar com o carro – e ele é exatamente o que você imaginaria. Alto luxo, com um toque de pimenta.
É claro que há botões para tornar o carro inteiro desconfortável – tem até um que faz com que ele incline para o lado errado em curvas –, mas, se deixá-los em paz, você tem um cupê rápido e confortável que ruge quando você pisa fundo e murmura quando você anda tranquilo. É legal. Exceto pela direção. Não há nada de errado com ela, naturalmente. Apenas você fica pensando às vezes se ela está tão conectada quanto poderia. Eu também tive um problema similar com o acelerador, ligeiramente hesitante.
Mas o principal problema é que por muito menos você pode comprar um BMW M6 Gran Coupé, que é ainda mais bonito e traz duas portas a mais. Ele não tem os brinquedinhos para condução sem motorista, mas você não vai querer usá-los mesmo. Não tem um comportamento de cruzeiro tão bom, mas em compensação é muito, muito mais divertido.
Se não é isso que você quer, tudo bem. Mas aí há o Bentley Continental GT. Ele tem o luxo e o couro acolchoado do S Coupé e, se você escolher o V8, terá um escapamento que também rosna. Além disso, é um Bentley, uma marca de prestígio muito maior que a Mercedes-Benz.
Todos os três são automóveis bonitos e rápidos, com espaço no banco de trás para pessoas pequenas em trajetos bem curtos. E todos desvalorizam como uma cômoda jogada do alto de um prédio.
Se você realmente gosta de dirigir – e se chegou até aqui em um artigo sobre carros, tenho de achar que gosta –, então o BMW é a escolha óbvia. Ele é magnífico, agressivo e balanceado, e tem tudo o que você deseja. No ano passado, na Austrália, em uma estrada de terra, com o Sol se pondo após um dia longo, quente e lindo, ele me proporcionou o que acho que foi a tocada mais deliciosa da minha vida.
O Bentley não está no mesmo patamar do BMW como carro voltado ao prazer de dirigir, mas o que você perde nas curvas, freadas e acelerações você ganha no momento “ahh, como é gostoso” ao fechar a porta. O que nos leva de volta ao Mercedes. Ele está preso entre uma rocha e um lugar macio. E não sei se é um lugar muito sensato para se estar.