Em 1984 a Volkswagen lançou no Brasil o Gol GT 1.8, para assim poder bater de frente com o Ford Escort XR3.
Ingressava em uma nova geração de carros no Brasil, a de hot hatches: carros pequenos, bons de curva, rápidos e esportivos, que rapidamente conquistaram o coração do consumidor brasileiro.
Esses dois modelos, em específico, formaram gerações de entusiastas por carro no Brasil. Tanto é que hoje um Escort XR3 ou Gol GT, em bom estado, chegam a custar até R$ 80.000 no mercado de usados de coleção.
Mas hoje vamos nos ater a falar sobre o primeiro encontro de QUATRO RODAS com o Gol GT, em matéria do lendário Emílio Camanzi publicada na edição de março de 1984. Boa leitura!
Gol GT 1.8: igual aos esportivos Europeus
Agressivo, veloz, estável, nervoso, o esportivo da Volks vem equipado com o motor do Santana, disposto a derrubar a solitária hegemonia do Escort XR3
Reportagem: Emílio Camanzi
Finalmente se pode dizer: o Brasil já possui carros iguais aos europeus. Isso não aconteceu por acaso. Cada vez mais exigente, o consumidor não se deixar mais enganar por simples aparências.
E, acima de tudo,há um certo tipo de consumidor que gosta de sentir o carro, em lugar de tê-lo como mero meio de locomoção.
Assim que despertaram para essa importante fatia do mercado, as fábricas decidiram disputá-la, fiéis ao mandamento mercadológico de que, em época de crise, nada mais inteligente que investir no melhor.
Um saudável amostra dessa realidade já está rodando em nossas ruas. Trata-se do Gol GT 1.8, modelo que a Volkswagen se orgulha de comparar à linhagem européia.
Basicamente, define-se por responder com rapidez e eficiência a todas as solicitações: aceleração, curva, desempenho, segurança, freio, consumo até.
A rigor, a trilha foi aberta pelo Escort XR3, da Ford, cuja impetuosa performance obrigou mesmo a uma revisão no desenvolvimento do Gol GT. Que vem disposto a ocupar seu espaço no mercado automobilístico.
Oficialmente, nosso primeiro contato aconteceu em março passado, no autódromo de Interlagos, quando a fábrica realizou uma apresentação formal à imprensa.
Semanas antes, tínhamos experimentado os primeiros protótipos, inclusive um equipado com motor 1.6.Mesmo assim, o definitivo Gol GT 1.8 revelou-se surpreendente.
No autódromo, duas versões foram mostradas. Um de quatro marchas que, segundo a própria Volkswagen, “anda mais”. Outra de cinco marchas, que estará disponível apenas em julho próximo.
Porque não fizemos um teste comparativo, nada podemos endossar, até porque um câmbio de cinco marchas sempre funciona mais. Se suas relações forem bem escalonadas, o desempenho será obviamente superior.
De qualquer modo, o Gol GT com câmbio de quatro marchas demonstrou um fantástico desempenho para seu tamanho.
Na pista de Interlagos, comportou-se como um automóvel de competição, igual aos que disputam o Brasileiro de Marcas: estável, sensível, com rápidas retomadas.
No entanto, foi no ambiente real de rua e estrada que o Gol GT deu o seu grande recado.
Sua suspensão é mais rígida, os pneus têm perfil baixo e uma grossa barra estabilizadora previne inclinação em curvas. Mesmo assim, mostrou-se muito confortável, obediente e silencioso até em pisos ruins.
Na estrada, é preciso ficar atento ao velocímetro. Basta distrair-se um pouco que ele começa a comer asfalto com incrível apetite. A 140 km/h tem-se a nítida sensação de estar a 80 km/h.
Parece que os outros todos resolveram andar devagar. Além de tudo, com os vidros fechados, quase não se ouve o som esportivo do seu escapamento.
A concepção e o desempenho tornam o Gol GT um esportivo invejável. Por isso mesmo, a fábrica poderia atentar para detalhes que ajudam a compor uma melhor imagem do carro. O câmbio, por exemplo.
Nessa faixa de preço, o de cinco marchas é obrigação, nunca uma alternativa.
Da mesma forma, um painel exclusivo com instrumentos necessários a um modelo esportivo. Ao contrário, o Gol GT vem equipado com uma cópia do painel do Voyage, apenas com números e grafismo em vermelho.
Outro detalhe, agora a nível de ocupação de espaço, está no volante – emprestado do Passat TS – que encobre o conta-giros, cuja leitura é essencial nesse tipo de carro.
Por outro lado, o instrumento combinado para dirigir economicamente não tem função explicável. Torna-se óbvio que usuário do Gol GT 1.8 não pretende um desempenho econômico.
E seu lugar poderia muito bem ser ocupado por um instrumento para medir a pressão do óleo do motor. Ou por um voltímetro que revelasse as condições da bateria, mesmo porque ele conta com faróis de milha, além dos faróis de iodo.
Externamente, sente-se a falta de certo requinte. Bem verdade que o Gol GT mostra um perfil agressivo, que poderia ser acentuado se contasse, por exemplo, com quatro faróis retangulares na frente.
Um pouco de imaginação nas cores dos pára-choques, polainas, spoiler e tampa traseira não faria mal.
Pintados com o monótono cinza grafite, cada um recebe uma tonalidade própria que empobrece o conjunto (da mesma deficiência padecem os Voyage e Gol 84).
Se alguns desses detalhes ostentassem a cor preta – como sucede no Escort XR3 – essa agressiva presença do Gol GT ficaria mais acentuada.
Feitas as contas, o resultado reflete um ótimo trabalho da Volkswagen. Dirigido em estilo cruzeiro, revela-se um tranquilo veículo de família; desafiado, transforma-se num possante bólido. A espera compensou.
Tão logo o XR3 apareceu nas ruas, os engenheiros da Volks concluíram que o projeto Gol GT deveria ser revisto.
A ponderação foi aceita e a expectativa dos seus altos executivos não poderia ser maior. Um deles comentou, como que pressentindo um sabor de vingança.
“Há alguns anos, a Ford saiu com a história de que o Corcel era o papa-Fusca. Pois bem: hoje, com o Gol GT 1.8, nós temos o papa-Escort”.
Ficha Técnica – VW Gol GT 1.8
Motor: Dianteiro, quatro cilindros em linha, quatro tempos, refrigerado a água; diâmetro dos cilindro de 81,0 mm; curso dos pistões 86,4 mm, cilindrada, 1 781 cm3; taxa de compressão, 12,0:1; comando de válvulas no cabeçote, acionado por correia dentada; válvulas de admissão e escapamento no cabeçote; potência máxima, 99 CV (73 kW) ABNT a 5 400 rpm; torque máximo, 14,9 mkgf (146.1 Nm) ABNT a 3 200 rpm; alimentado por um carburador de corpo duplo e fluxo descendente; combustível: álcool.
Transmissão: Embreagem monodisco a seco de acionamento mecânico; câmbio de quatro marchas sincronizadas para a frente e ré; relações, 1ª) 3,46:1; 2ª) 1,79:1; 3ª) 1,13:1; 4ª) 0,83:1; ré) 3,167:1; diferencial) 4,11:1; tração dianteira.
Carroceria, chassi: Carroceria em chapas de aço estampadas, tipo sedã, três portas, cinco lugares, estrutura tipo monobloco.
Suspensão: Dianteira, independente, tipo McPherson, com braços triangulares inferiores, molas helicoidais, amortecedores hidráulicos telescópicos e barra estabilizadora; traseira, semi-independente com braços tubulares longitudinais interligados por barra em V, molas helicoidais e amortecedores hidráulicos telescópicos.
Freios: A disco nas rodas dianteiras e a tambor nas traseiras, com servofreio.
Direção: Mecânica, de pinhão e cremalheira.
Rodas, pneus: Rodas em liga de alumínio com tala de 6 polegadas e aro de 14 polegadas; pneus 185/60 HR 14.
Dimensões: Comprimento, 385 cm; largura, 160,1 cm; altura 137,5 cm; bitola dianteira, 136,4 cm; bitola traseira, 138,4 cm; distância entre-eixos, 235,8 cm; altura livre do solo, 14,5 cm.
Capacidade do tanque de combustível: 55 litros
Peso: 900 kg (dado do fabricante)
Preço do carro testado: em torno de Cr$ 11 milhões (março de 1984)
Valor corrigido: R$ 110.202,24 – IPCA (IBGE)
Não pode ir à banca comprar, mas não quer perder os conteúdos exclusivos da nova edição de Quatro Rodas? Clique aqui e tenha o acesso digital.